segunda-feira, 22 de setembro de 2025

Disputa política em torno do Orçamento não se resume às emendas parlamentares. Por Lara Mesquita

Folha de S. Paulo

Protagonismo do Legislativo cresce com o achatamento dos recursos de alocação livre e dos investimentos

Ministério do Planejamento prevê que 92,4% das despesas primárias são despesas obrigatórias

No final de agosto, o governo federal apresentou a Proposta de Lei Orçamentária Anual (PLOA) para 2026. A peça prevê arrecadação superior a R$ 6,5 trilhões, dos quais R$ 4,3 trilhões destinados ao orçamento fiscal, que exclui as despesas com seguridade social e investimentos de empresas estatais.

Concentrando-nos nas despesas, a proposta do Ministério do Planejamento prevê que 92,4% das despesas primárias, aquelas que incluem os serviços ofertados à população e os investimentos públicos, são despesas obrigatórias.

Esse é um dos principais debates sobre a questão orçamentária e fiscal no país hoje: cada grupo de interesse quer garantir a vinculação de um percentual do Orçamento da União para sua agenda, e assim se proteger de cortes e contingenciamentos, ou de interesses políticos com prioridades divergentes. Além do pagamento da dívida e dos salários dos servidores, o governo tem obrigação no pagamento de aposentadorias e benefícios, repasses constitucionais a estados e municípios. Também entram nesse grupo os 15% da Receita Corrente Líquida (RCL) é destinados à saúde, definido pela Emenda Constitucional 86 de 2015; e os 18% da Receita Líquida de Impostos são destinados à Educação, percentual que vai chegar à 23% no orçamento de 2027, definido pela Emenda Constitucional 108 de 2020, a emenda do novo Fundeb.

A disputa política em torno de recursos públicos é um dos principais temas de todos os governos democráticos –em autocracias a disputa é limitada pela conveniência do chefe do governo e pelo uso da repressão.

Nesse cenário, não surpreende que o Congresso tenha seguido o mesmo caminho que outros grupos de pressão, vinculando as emendas parlamentares ao orçamento à RCL. Obrigatoriamente 2% da RCL deve ser destinada às emendas individuais e 1% da RCL às emendas de bancadas. Em anos eleitorais, parte dos recursos das emendas de bancadas são revertidos para o Fundo Especial de Financiamento de Campanhas (FEFC).

Com o achatamento dos recursos de alocação livre e dos investimentos, imposto pelas vinculações orçamentárias e regras de responsabilidade fiscal, cresce o protagonismo do Legislativo no Orçamento. Cabe lembrar que o investimento de hoje pode resultar em crescimento das despesas de custeio amanhã. Por exemplo, um novo hospital precisará de médicos, enfermeiros, e gerará despesas com água e luz, para ficarmos no mínimo.

Cada novo projeto aprovado que aumenta as despesas do Executivo, como a manutenção dos subsídios para setores da economia, ou a criação de novos auxílios, tem por consequência a diminuição da discricionariedade sobre o orçamento e a ampliação da importância das emendas parlamentares. Principalmente quando a opção é por não incrementar a receita, como na tentativa de derrubar o decreto que alterava as alíquotas do IOF.

Assim, as emendas acabam sendo a forma mais fácil de acessar recursos não carimbados. Não há que se demonizar a participação do Poder Legislativo no Orçamento, é parte do jogo político. Mas é premente o estabelecimento de regras claras, fiscalização e transparência no uso dos recursos. A atuação do TCU e do STF nesse sentido são fundamentais.

 

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