quarta-feira, 1 de outubro de 2025

Aumento de 390% no Fundo Eleitoral para 2026 é tapa na cara da sociedade. Por Luiz Carlos Azedo

Correio Braziliense

Para blindar seus mandatos financeiramente, deputados e senadores da Comissão Mista de Orçamento aprovaram aumento de R$ 1 bilhão para R$ 4,9 bilhões para o Fundo Eleitoral

A proposta de quase quintuplicar o Fundo Eleitoral, aprovada pela Comissão de Orçamento da Câmara, avança em direção à consolidação de uma “partidocracia” nefasta ao país. A Comissão Mista de Orçamento do Congresso (CMO) aprovou ontem, de forma simbólica, um aumento de 390% (R$ 3,9 bilhões) da reserva prevista na peça orçamentária para o Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC) para 2026. O “Fundão” abastece campanhas eleitorais em todo o país com dinheiro público.

O princípio da “paridade de armas” na disputa eleitoral simplesmente não existe mais, não é respeitado. Afora o “Fundão” anabolizado, que em tese poderia ser distribuído democraticamente pelos partidos entre candidatos com mandato e sem mandato, existe também a montanha de dinheiro de emendas parlamentares, que chegam em média a R$ 50 milhões para cada parlamentar.

É por essa razão que o Congresso está de costas para a sociedade e só cuida de seus próprios interesses. O lobby concentrado que aprisiona as políticas públicas e aprova privilégios econômicos perdeu os limites. O episódio da PEC da Blindagem, que foi aprovada pela Câmara e derrubada pelo Senado, é um sintoma patológico de que o parlamento foi tomado de assalto por patrimonialistas, fisiológicos, corporativistas e desvariados, tornou-se paraíso dos lobistas. A política como bem comum, no sentido weberiano do termo, está sufocada.

O Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA) enviado pelo governo ao Congresso previa R$ 1 bilhão para o “Fundão” em 2026. Esses valores seriam advindos de emendas de bancadas estaduais. Em acordo firmado pelos parlamentares, optou-se por igualar os valores ao que foi reservado para as eleições municipais de 2024, época em que o Executivo também previu um valor menor (R$ 940 milhões), que foi revisto pelo Congresso.

Dos R$ 3,9 bilhões a mais, R$ 2,9 bilhões sairão de emendas de bancada estadual de execução obrigatória; o restante (R$ 1 bilhão) sairá de cortes em despesas discricionárias. O relator do Orçamento de 2026, o deputado Isnaldo Bulhões (MDB-AL), promoveu as mudanças. Foi o próprio deputado quem apresentou e relatou a instrução aprovada nesta terça. Para hoje, também, estava prevista a votação da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) para o próximo ano. A expectativa é que a matéria seja votada na CMO na próxima terça-feira (7) e vá ao plenário no mesmo dia.

Nonsense

O episódio se repete como farsa, mas pode virar uma tragédia, por causa do impacto orçamentário. Em 2024, o Executivo também havia proposto um fundo menor (R$ 940 milhões), revisado pelo Congresso, que eleva a expectativa de arrecadação para justificar os gastos. O resultado é um orçamento fictício, porque o Parlamento legisla em causa própria, ampliando recursos destinados a partidos e campanhas em detrimento de políticas públicas essenciais. O texto deveria orientar prioridades do Estado, mas se tornou objeto de barganha para liberar espaço fiscal a interesses imediatos

Max Weber alertava, em sua conferência “A política como vocação”, para o risco da política se tornar prisioneira de elites parlamentares que sobrevivem pela apropriação de recursos, cargos e privilégios, indiferentes às demandas da sociedade. No caso atual, as políticas públicas foram capturadas por grandes interesses privados e o orçamento de investimentos pela fragmentação sem qual projeto estratégico para a União por meio das emendas parlamentares impositivas, em especial as de relator, o chamado “orçamento secreto”, declarado inconstitucional pelo Supremo.

Dezenas de parlamentares estão sendo investigados por desvios de recursos de emendas parlamentares para caixa dois eleitoral e/ou formação de patrimônio mesmo. A decisão judicial do Supremo de desmontar esse mecanismo foi baldeada por emendas de bancada obrigatórias. O resultado é a perpetuação da chantagem institucional. O Executivo depende do Congresso para liberar recursos; o Congresso, por sua vez, se alimenta do próprio orçamento para reproduzir seu poder.

A captura da política pelas cúpulas dos partidos, voltada para si mesmo e não para a sociedade, leva à formação de partidocracia e qualquer tentativa de reforma política com objetivo de melhorar a qualidade da representação parlamentar corre o mesmo risco de ser capturada pelos interesses daqueles que deveriam reformá-la.

Ao mesmo tempo, o nonsense é grande. O cenário econômico não oferece alívio para esse tipo de prática. Sem um projeto nacional claro, se sucedem os voos de galinha, por causa do déficit fiscal e do remédio amargo dos juros altos para conter a inflação. Nesse contexto, a ampliação do fundo eleitoral em quase cinco vezes é um sintoma patológico de um Parlamento que insiste em legislar contra os interesses da sociedade, como aconteceu com a PEC da Blindagem, aprovada pela Câmara e derrubada no Senado pela pressão popular.

Desde 2013, a distância entre a vida real dos cidadãos e o Congresso se tornou um abismo. As ruas se encheram de manifestantes contra partidos e contra a corrupção, mas o parlamento respondeu blindando-se ainda mais, inclusive aqueles que ascenderam ao mandato pela via da ação antissistema no embalo do tsunami de 2018.

Nenhum comentário: