Correio Braziliense
Para blindar seus mandatos
financeiramente, deputados e senadores da Comissão Mista de Orçamento aprovaram
aumento de R$ 1 bilhão para R$ 4,9 bilhões para o Fundo Eleitoral
A proposta de quase quintuplicar o Fundo
Eleitoral, aprovada pela Comissão de Orçamento da Câmara, avança em direção à
consolidação de uma “partidocracia” nefasta ao país. A Comissão Mista de
Orçamento do Congresso (CMO) aprovou ontem, de forma simbólica, um aumento de
390% (R$ 3,9 bilhões) da reserva prevista na peça orçamentária para o Fundo
Especial de Financiamento de Campanha (FEFC) para 2026. O “Fundão” abastece
campanhas eleitorais em todo o país com dinheiro público.
O princípio da “paridade de armas” na disputa eleitoral simplesmente não existe mais, não é respeitado. Afora o “Fundão” anabolizado, que em tese poderia ser distribuído democraticamente pelos partidos entre candidatos com mandato e sem mandato, existe também a montanha de dinheiro de emendas parlamentares, que chegam em média a R$ 50 milhões para cada parlamentar.
É por essa razão que o Congresso está de
costas para a sociedade e só cuida de seus próprios interesses. O lobby
concentrado que aprisiona as políticas públicas e aprova privilégios econômicos
perdeu os limites. O episódio da PEC da Blindagem, que foi aprovada pela Câmara
e derrubada pelo Senado, é um sintoma patológico de que o parlamento foi tomado
de assalto por patrimonialistas, fisiológicos, corporativistas e desvariados,
tornou-se paraíso dos lobistas. A política como bem comum, no sentido weberiano
do termo, está sufocada.
O Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA)
enviado pelo governo ao Congresso previa R$ 1 bilhão para o “Fundão” em 2026.
Esses valores seriam advindos de emendas de bancadas estaduais. Em acordo
firmado pelos parlamentares, optou-se por igualar os valores ao que foi
reservado para as eleições municipais de 2024, época em que o Executivo também
previu um valor menor (R$ 940 milhões), que foi revisto pelo Congresso.
Dos R$ 3,9 bilhões a mais, R$ 2,9 bilhões
sairão de emendas de bancada estadual de execução obrigatória; o restante (R$ 1
bilhão) sairá de cortes em despesas discricionárias. O relator do Orçamento de
2026, o deputado Isnaldo Bulhões (MDB-AL), promoveu as mudanças. Foi o próprio
deputado quem apresentou e relatou a instrução aprovada nesta terça. Para hoje,
também, estava prevista a votação da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) para
o próximo ano. A expectativa é que a matéria seja votada na CMO na próxima
terça-feira (7) e vá ao plenário no mesmo dia.
Nonsense
O episódio se repete como farsa, mas pode
virar uma tragédia, por causa do impacto orçamentário. Em 2024, o Executivo
também havia proposto um fundo menor (R$ 940 milhões), revisado pelo Congresso,
que eleva a expectativa de arrecadação para justificar os gastos. O resultado
é um orçamento fictício, porque o Parlamento legisla em causa própria,
ampliando recursos destinados a partidos e campanhas em detrimento de políticas
públicas essenciais. O texto deveria orientar prioridades do Estado, mas se
tornou objeto de barganha para liberar espaço fiscal a interesses imediatos
Max Weber alertava, em sua conferência “A
política como vocação”, para o risco da política se tornar prisioneira de
elites parlamentares que sobrevivem pela apropriação de recursos, cargos e
privilégios, indiferentes às demandas da sociedade. No caso atual, as políticas
públicas foram capturadas por grandes interesses privados e o orçamento de
investimentos pela fragmentação sem qual projeto estratégico para a União por meio
das emendas parlamentares impositivas, em especial as de relator, o chamado
“orçamento secreto”, declarado inconstitucional pelo Supremo.
Dezenas de parlamentares estão sendo
investigados por desvios de recursos de emendas parlamentares para caixa dois
eleitoral e/ou formação de patrimônio mesmo. A decisão judicial do Supremo de
desmontar esse mecanismo foi baldeada por emendas de bancada obrigatórias. O
resultado é a perpetuação da chantagem institucional. O Executivo depende do
Congresso para liberar recursos; o Congresso, por sua vez, se alimenta do
próprio orçamento para reproduzir seu poder.
A captura da política pelas cúpulas dos
partidos, voltada para si mesmo e não para a sociedade, leva à formação de
partidocracia e qualquer tentativa de reforma política com objetivo de melhorar
a qualidade da representação parlamentar corre o mesmo risco de ser capturada
pelos interesses daqueles que deveriam reformá-la.
Ao mesmo tempo, o nonsense é grande. O
cenário econômico não oferece alívio para esse tipo de prática. Sem um projeto
nacional claro, se sucedem os voos de galinha, por causa do déficit fiscal e do
remédio amargo dos juros altos para conter a inflação. Nesse contexto, a
ampliação do fundo eleitoral em quase cinco vezes é um sintoma patológico de um
Parlamento que insiste em legislar contra os interesses da sociedade, como
aconteceu com a PEC da Blindagem, aprovada pela Câmara e derrubada no Senado
pela pressão popular.
Desde 2013, a distância entre a vida real dos cidadãos e o Congresso se tornou um abismo. As ruas se encheram de manifestantes contra partidos e contra a corrupção, mas o parlamento respondeu blindando-se ainda mais, inclusive aqueles que ascenderam ao mandato pela via da ação antissistema no embalo do tsunami de 2018.
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