sexta-feira, 3 de outubro de 2025

O pacote do Imposto de Renda. Por Celso Ming

O Estado de S. Paulo

Vai ser difícil encontrar na história da Câmara dos Deputados um projeto de lei aprovado em plenário por unanimidade, como o desta vez, por 493 votos. É o projeto de lei que isenta de Imposto de Renda, rendas mensais de até R$ 5 mil, desonera parcialmente quem recebe até R$ 7.350 e sobretaxa a turma da ponta da pirâmide de renda, os mais ricos. Agora, é a vez do Senado.

Trata-se de um projeto de cunho eleitoral, tanto para o governo como para a oposição. É eleitoral para o governo na medida em que beneficia perto de 15 milhões de contribuintes, especialmente os da classe média, cujo apoio político começava a escorrer. Foi a principal promessa de campanha do então candidato Lula. E é eleitoral também para a oposição: o político que votasse contra o projeto enfrentaria efeitos eleitorais negativos.

Pelos cálculos do governo, essa isenção produzirá uma quebra de arrecadação de R$ 27 bilhões por ano que passará a ser reposta por taxação adicional de até 10% sobre a renda dos mais ricos, condição que alcança 141 mil contribuintes.

O governo comemora a aprovação inicial pela Câmara como vitória de um projeto de justiça tributária e de desconcentração de renda. Mas, atenção, está aí um santo que continua sendo de barro, altamente vulnerável, tendo em vista a alta capacidade das camadas mais ricas de utilizar recursos de administração tributária para escapar ou para minimizar os efeitos das garras do leão. O impacto sobre a distribuição de renda deve ser cosmético. Nesse sentido, essa lei não esconde sua natureza populista.

Levando-se em conta que o início da vigência prática dessa lei deve ser o início de 2026, sua principal consequência econômica será uma sobra de renda na conta bancária das população de classe média. Pela avaliação do governo, uma professora com salário mensal de R$ 4,9 mil terá uma raspa anual de tacho de R$ 4 mil. E um taxista que receba R$ 3.650 mensais, se livrará de uma mordida de R$ 1.060 por ano. São recursos que tendem a ser pulverizados no pequeno consumo.

Além de não garantir uma persistente distribuição de renda, a aprovação dessa lei aponta para importantes limitações. Não vem acompanhada de uma revisão da tabela progressiva do Imposto de Renda na fonte. E isso significa que em poucos anos, a inflação se encarregará de pulverizar as isenções.

Em segundo lugar, não se preocupa com criação de poupança, que é o primeiro passo para o avanço do investimento e do aumento futuro da atividade econômica e do emprego. A taxação de dividendos imposta sobre os mais ricos, por exemplo, poderia prever certo incentivo para a parcela que fosse revertida em investimento.

Por aí se vê que a intenção do governo e dos políticos ao garantir a aprovação desse projeto de lei não tem nada a ver com a correção das distorções estruturais do sistema. Seus objetivos são de curto prazo. É um arranjo com poucos anos de prazo de validade, montado com habilidade política para conquistar as boas graças do eleitor.

 

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