domingo, 25 de janeiro de 2015

Opinião do dia - Antonio Imbassahy

"A competência de Levy se restringe a admitir o fracasso de Dilma, subir impostos e juros e conviver com 39 ministérios e 23 mil cargos."
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Do deputado Antonio Imbassahy (PSDB-BA), líder da bancada, sobre fala de Joaquim Levy (Fazenda) de que tenta "restaurar a confiança" no país. Folha de S. Paulo / Painel , 25 de janeiro de 2015.

Medidas impopulares colocam PT em ebulição

• Planalto age para evitar que festa de 35 anos da sigla vire desabafo contra Dilma

Vera Rosa - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - Às vésperas de completar 35 anos, o PT está em ebulição em razão das medidas impopulares na economia, como aumento de impostos e mudanças no seguro-desemprego. As críticas se espalham e o governo tenta evitar que a insatisfação seja formalizada no próximo dia 6, quando haverá reunião do Diretório Nacional petista, em Belo Horizonte, e um ato para comemorar o aniversário do partido.

Dilma e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva são os convidados de honra da festa, que ocorrerá em momento difícil para o PT e sua principal corrente, a Construindo um Novo Brasil (CNB), afastada do "núcleo duro" do Planalto. Tudo está sendo preparado para abafar o tiroteio, que aparece na esteira de queixas sobre a condução do governo, o isolamento de Dilma e a perda de espaço do grupo de Lula no primeiro escalão.

Nos bastidores, porém, deputados, senadores e até dirigentes do PT manifestam incômodo com o fato de Dilma, em seu segundo mandato, só apresentar um "saco de maldades" para a população, sem qualquer agenda positiva, e reclamam do custo político das medidas.

"Quando o ministro da Fazenda diz que o atual modelo do seguro-desemprego é completamente ultrapassado, precisamos saber o que ele propõe para pôr no lugar, porque estamos falando de proteção ao trabalhador", afirmou o deputado Paulo Teixeira (PT-SP), numa referência à entrevista do ministro Joaquim Levy ao jornal inglês Financial Times. "Nós somos a favor de combater as fraudes, mas vamos retirar da proposta do governo tudo o que vier para prejudicar os trabalhadores e revogar direitos." A polêmica que atormenta o segundo mandato de Dilma, com cortes de gastos e juros na estratosfera, lembra a queda de braço do início do governo Lula, em 2003, entre monetaristas e desenvolvimentistas. Na época, Antônio Palocci era ministro da Fazenda, Levy comandava a Secretaria do Tesouro e o PT gritava, como hoje, contra a ortodoxia da política econômica.

"Mesmo que pessoas do PT encarem o que estamos fazendo como ajuste antissocial, nós precisamos ter responsabilidade", disse ao Estado o ministro das Comunicações, Ricardo Berzoini. "Temos um patrimônio de seguridade social que muitos países não têm e, para que tudo isso resista às mudanças na economia, é necessário, de tempos em tempos, fazer ajustes, porque o orçamento é finito. Nós não estamos no vácuo. Estamos no mundo." Berzoini destacou que a previdência pelo INSS, somada ao seguro-desemprego, consumiu, nos últimos doze meses, R$ 460 bilhões. "Para que as conquistas obtidas com a Constituição de 1988 sejam preservadas, governo e Congresso não podem ficar omissos diante de distorções", emendou Berzoini, que foi ministro da Previdência no governo Lula.

Na tentativa de amenizar o bombardeio na direção do Planalto, o senador Humberto Costa (PE) disse que o PT está aberto a discussões. "Criticar é normal. Não se pode confundir o partido com o governo", argumentou Costa, que é líder do PT no Senado. Na sua avaliação, medidas duras são necessárias para retomar o "núcleo" do projeto de crescimento com distribuição de renda. "Mas a nossa preocupação é com a proteção social", insistiu.

Em disputa. Na sexta-feira, o blog do ex-ministro da Casa Civil José Dirceu trazia mais críticas à política econômica. Condenado no processo do mensalão e novo alvo da Operação Lava Jato, da Polícia Federal - que investiga um esquema de corrupção na Petrobrás -, Dirceu tem recebido, desde novembro, uma romaria de petistas que se queixam do governo Dilma. As reuniões ocorrem em sua casa no Lago Sul, em Brasília, onde ele cumpre prisão domiciliar.

Ressentido com Dilma, Lula e a cúpula do PT, Dirceu tenta dar voz de comando a seu grupo no partido para criar um novo campo político, crítico ao governo. Nas conversas reservadas, o ex-ministro e ex-presidente do PT costuma dizer que os rumos da gestão Dilma estão em disputa.

Na linha de tiro, a política econômica também foi alvejada, nos últimos dias, pelo vice-presidente do PT, Alberto Cantalice, e pela Fundação Perseu Abramo, ligada ao partido. No twitter, Cantalice definiu como "erro" o veto de Dilma à correção da tabela do Imposto de Renda de pessoas físicas em 6,5%. No diagnóstico do Boletim de Conjuntura da Perseu Abramo, o ajuste fiscal adotado hoje pode aprofundar as "tendências recessivas" da economia.

Do palácio ao petrolão

• O empresário era tão íntimo de Lula que tinha passe livre no Planalto. Rico, ele até hoje resolve os mais diversos problemas do ex-presidente e de sua família. Poderoso, ele agora também é investigado no escândalo da Petrobras.

Rodrigo Rangel e Adriano Ceolin – Veja

Um dos grandes pecuaristas do país, José CarlosBumlai conta que visualizou em sonho sua aproximação com Luiz Inácio Lula da Silva, quando ele era apenas aspirante à Presidência. Com a ajuda de um amigo comum, Bumlai conheceu o petista e o sonho se realizou. O pecuarista tornou-se íntimo de Lula. O sonho embutia uma profecia que ele só confidenciou a poucos: a aproximação renderia excelentes resultados para ambos. Assim foi. Lula chegou ao Planalto, e Bumlai, bom de negócios, bem-sucedido e rico, tornou-se fiel seguidor do presidente, resolvedor de problemas de toda espécie e, claro, receptador de dividendos que uma ligação tão estreita com o poder sempre proporciona. No governo, só duas pessoas entravam no gabinete presidencial sem bater na porta. Bumlai era uma delas. A outra, Marisa Letícia, mulher de Lula.

O acesso livre foi formalizado em agosto de 2008. Certo dia, Bumlai chegou ao Planalto sem avisar. A equipe de segurança, seguindo o protocolo, barrou sua entrada. Foram-lhe exigidas cópia de sua carteira de identidade e informações mais precisas sobre o motivo da visita. O nome dele não constava da lista de pessoas que Lula receberia em audiência naquele dia. Bumlai foi impedido de entrar. Quando Lula soube do episódio, determinou ao Gabinete de Segurança Institucional que mandasse fazer um cartaz com foto, a ser mantido permanentemente na recepção, contendo um aviso incomum: "O sr. José Carlos Bumlai deverá ter prioridade de atendimento (...) em qualquer tempo e qualquer circunstância". Nenhum ministro, nenhum assessor, nenhum parente de Lula mereceu tal deferência.

Discreto e eficiente no cumprimento das tarefas que recebia, o pecuarista foi ocupando espaços. A derrocada dos mensaleiros fez dele interlocutor direto do presidente com diversos setores no mundo empresarial. Bumlai foi encarregado de missões complexas — a montagem do consórcio de empresas que construiriam a usina de Belo Monte, uma obra orçada em 25 bilhões de reais, foi trabalho dele. Cumpriu-as com destreza. Sua influência cresceu a ponto de ele ser mais procurado para intermediar interesses no governo que a maioria dos ministros. O pecuarista, que nunca teve nenhuma função oficial, montou um gabinete num quarto de hotel a 2 quilômetros do Planalto, onde recebia empresários e lobistas que se enfileiravam para vê-lo. Em paralelo, exercia outra tarefa igualmente sensível: virou tutor dos negócios dos filhos do então presidente, em especial de Fábio Luís, o Lulinha.

Desde 2005, sabia-se em Brasília que Bumlai também tinha delegação para tratar de interesses que envolvessem a Petrobras. Foi ele, por exemplo, um dos responsáveis por chancelar o nome do hoje notório Nestor Cerveró, um desconhecido funcionário da estatal, para o posto de diretor internacional da empresa. Em sua missão de conjugar interesses públicos e privados, Bumlai tinha seus parceiros diletos, aos quais dedicava atenção especial. Não demorou para que começassem a chegar ao governo queixas de empresários descontentes com "privilégios incompreensíveis" concedidos aos amigos do amigo do presidente.

Uma das reclamações mais frequentes envolvia justamente a Petrobras e uma empreiteira pouco conhecida até então, a UTC, que de repente passou a assinar contratos milionários com a estatal, ao mesmo tempo em que surgia como uma grande doadora de campanhas, principalmente as do PT. Gigantes da construção civil apontavam Bumlai como responsável pelos "privilégios" que a UTC estava recebendo da Petrobras. Hoje, a escalada dos negócios da UTC é uma peça importante da Operação Lava-Jato, que está desvendando o ultrajante esquema de corrupção montado no coração da estatal para abastecer as contas bancárias de políticos e partidos. A cada depoimento, a cada busca, a cada prova que se encontra, aos poucos as peças vão se encaixando. A última revelação pode ser a chave do quebra-cabeça. Bumlai, o amigo íntimo do ex-presidente que tinha entrada livre ao Palácio do Planalto, está envolvido até o pescoço no escândalo de corrupção montado na Petrobras durante o governo petista.

Bumlai, soube-se agora, ajudou a compor a teia de corrupção na estatal. As investigações da Polícia Federal o colocam como um dos responsáveis pelo acesso que o lobista Fernando Soares, o Fernando Baiano, desfrutava na Petrobras. Preso desde novembro, Baiano é mencionado como um dos principais operadores do esquema de propina na estatal. Era ele o responsável por distribuir a parte que cabia ao PMDB.,partido que, junto com o PT e o PP, formava a trinca governista que assaltava os cofres da empresa. Em um dos depoimentos à Justiça, o ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa revela o papel de relevo que Baiano exercia no esquema — a ponto de atuar dentro da própria Petrobras, viabilizando acordos e estabelecendo condições de negócios, mesmo sem nenhum vínculo funcional com a companhia.

Paulo Roberto contou que coube a Fernando Baiano, por exemplo, alinhavar internamente na Petrobras a polêmica compra da refinaria de Pasadena, no Estado americano do Texas. A aquisição, que, segundo o Tribunal de Contas da União, resultou em um prejuízo de 792 milhões de dólares, teria rendido uma propina de "20 a 30 milhões de dólares" ao PMDB, a Fernando Baiano e a Cerveró, segundo Paulo Roberto. No mesmo depoimento, o ex-diretor confessou que ele próprio recebeu 1,5 milhão de dólares apenas para que não criasse obstáculos ao negócio. Ao apontar as fontes da impressionante influência de Fernando Baiano na Petrobras, Paulo Roberto citou, com nome e sobrenome completo, o amigo de Lula: José Carlos Costa Marques Bumlai.

Não é a primeira vez que Bumlai aparece vinculado a tramóias relacionadas à Petrobras. Em depoimento prestado ao Ministério Público em 2012, Marcos Valério, operador do mensalão, relatou um caso revelador. Segundo ele, um empresário ameaçava dizer que Lula e os ex-ministros José Dirceu e Gilberto Carvalho estavam por trás do assassinato do prefeito de Santo André (SP) Celso Daniel, crime ocorrido em 2002.0 silêncio do chantagista, de acordo com Marcos Valério, foi comprado com 6 milhões de reais. Quem articulou toda a operação? Ele, Bumlai, que levantou o dinheiro necessário para calar a boca do empresário inconformado junto a uma empreiteira que prestava serviços à Petrobras — a fonte do dinheiro sujo era sempre o generoso cofre da estatal. Na semana passada, uma reportagem do Jornal Nacional, da Rede Globo, mostrou que três das empreiteiras mencionadas na Lava-Jato pagaram 4 milhões de reais por "consultorias" ao mensaleiro José Dirceu. Os contratos, segundo o dono de uma delas revelou a VEJA, foram assinados a pedido de João Vaccari, tesoureiro do PT.

Quando estava prestes a deixar o governo, foi a Bumlai que o ex-presidente confiou a tarefa de cuidar do projeto do Instituto Lula — e isso incluía desde a preparação das instalações físicas até a engenharia financeira para bancar as contas da entidade. Bumlai arregimentou mantenedoras de peso para o instituto, entre elas a Odebrecht, a OAS e a Andrade Gutierrez — todas investigadas na Lava-Jato. Há outras histórias, até paroquiais, que ilustram a proximidade entre Lula e Bumlai. O restaurante onde o ex-presidente fez as primeiras reuniões para a criação do PT em São Bernardo do Campo estava afundado em dívidas. Corria o risco de fechar as portas. Laerte Demarchi, o proprietário, pediu ajuda a Lula. Diz ele: "Lula me apresentou um amigo, que pagou a dívida pra mim. Em troca, dei a ele alguns terrenos". Quem era o amigo? Bumlai. Sempre ele. Procurado por VEJA para explicar suas ligações com Baiano, Cerveró e a Petrobras, o amigão de Lula se recusou a falar. Quem sabe ele anda sonhando com alguma outra possibilidade de aproximação que embuta uma profecia de mútuo sucesso financeiro.

Preso em casa, José Dirceu influencia rumos do PT

• "O que ele fala, a gente ouve", afirma deputado sobre ex-ministro, que agora é investigado pela operação lava-jato

Fernanda Krakovics – O Globo

BRASÍLIA - Em prisão domiciliar desde novembro de 2014, o ex-ministro José Dirceu tenta voltar à cena em articulações políticas com integrantes do PT, que costumam visitá-lo. Mas se até então agia nos bastidores sem ser incomodado, Dirceu voltou a virar notícia. Mais uma vez, teve seu nome envolvido em investigações da Polícia Federal. Condenado por corrupção no mensalão, ele agora passou a ter os negócios de sua empresa JD Consultoria devassados. A Justiça Federal do Paraná quebrou o sigilo da JD por conta dos pagamentos que recebeu de empreiteiras envolvidas na Lava-Jato, que apura desvios na Petrobras. Dirceu nega vinculação com a estatal.

Segundo petistas, Dirceu ainda desfruta da simpatia de correligionários e tem influência dentro do partido.

- Ele tem audiência dentro do PT. O que ele fala, a gente ouve - disse o deputado Paulo Ferreira (PT-RS), um dos que tem visitado o ex-ministro.

Nessas conversas, Dirceu tem mostrado preocupação com os rumos do partido e com a articulação política do governo Dilma. Integrante da corrente majoritária do PT, a Construindo um Novo Brasil, ele ficou contrariado, segundo pessoas próximas, com a reforma ministerial. A CNB perdeu espaço no governo.

Nesta semana, a equipe de seu blog divulgou nota negando que ele esteja exercendo atividade político-partidária: "Como tem direito qualquer cidadão, ele recebe visitas de amigos e companheiros de décadas de militância e luta. São visitas de solidariedade e apoio. Nelas discute sua situação de condenado injustamente; a situação política do país; e, evidentemente o PT, partido a que dedicou a vida, e o governo ao qual apoia".

No blog, crítica à política econômica e a Dilma

• Planos para deixar consultorias e abrir escritório de advocacia

Fernanda Krakovics – O Globo

BRASÍLIA - Se a articulação política é discreta, José Dirceu não tem escondido as críticas ao governo Dilma Rousseff. Expõe em seu blog o descontentamento com as mais recentes medidas adotadas pelo Executivo. Na última terça-feira, um dia depois de o Ministério da Fazenda anunciar um pacote de aumento de impostos, o blog de Dirceu veiculou críticas à política econômica. "Caminhamos assim - conscientemente, espero, por parte do governo - para uma recessão com todas as suas implicações sociais e políticas", dizia.

Nesta semana, a insatisfação do PT, antes restrita aos bastidores, veio à tona, com críticas públicas feitas pela Fundação Perseu Abramo, do partido, e por um dos vice-presidentes da sigla, Alberto Cantalice. A preocupação com a política econômica também esteve presente em reunião da CNB na última segunda-feira.

- Discutimos que as medidas não podem gravar setores que historicamente pagaram a conta das crises. A opinião média (na CNB) é que essas medidas (correção da tabela do IR e aumento da Selic) não enfrentam os setores rentistas - disse o deputado Paulo Ferreira.

Justiça: "trabalho honesto"
Condenado a 7 anos e 11 meses de prisão no processo do mensalão, Dirceu ficou 11 meses e 11 dias no Complexo Penitenciário da Papuda, no Distrito Federal, e no Centro de Progressão Penitenciária. Agora em regime domiciliar, tem que ficar em casa das 22h às 5h nos dias úteis e todo o tempo nos fins de semana e feriados.

Ele tem dito a amigos que sua preocupação maior é reorganizar sua vida pessoal. Por isso, já decidiu que irá morar definitivamente em Brasília, sobretudo a partir do ano que vem, quando terá cumprido sua pena do ponto de vista legal e poderá transitar livremente. Em São Paulo, ele deixará apenas a casa em Vinhedo - mais por causa dos filhos do que para uso pessoal.

Dirceu tem feito planos profissionais, segundo interlocutores. Já teria decidido não atuar mais na área de assessoria empresarial. A ideia é montar um escritório de advocacia. Ele é beneficiário de duas aposentadorias, uma da Câmara e outra da Assembleia Legislativa de São Paulo, e avalia que, com o trabalho de advogado, terá o suficiente para se manter e à família.

No final do ano, quando passou para o regime domiciliar, a Justiça deu prazo de 90 dias para que ele informasse vinculação a "trabalho honesto" ou justificasse suas atividades. Dirceu tem até o início de fevereiro para dar essa informação.

Sumida, Dilma estima que dificuldades irão até 2016

• Com agenda impopular, ela enfrenta turbulências na política e na economia

• Na primeira reunião ministerial do novo mandato, presidente defenderá ajuste fiscal e pedirá empenho extra

Valdo Cruz, Andréia Sadi – Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - Vivendo um verdadeiro inferno astral de começo de mandato, com medidas econômicas impopulares, apagão e disputas políticas, a presidente Dilma Rousseff tem optado pelo silêncio. A assessores, contudo, diz que o período de ajuste é necessário e deve durar dois anos.

É o tempo que Dilma considera como inevitável para arrumar a economia e enfrentar as turbulências políticas.

Ela tem dito estar convicta do caminho adotado, e tende a desconsiderar as críticas de que está isolada em suas decisões ou praticando estelionato eleitoral ao adotar medidas associadas à oposição.

Para a presidente, o principal ponto de preocupação do momento é outro: o efeito econômico da crise decorrente da Operação Lava Jato, que afeta diversas grandes empreiteiras com contratos agora sob suspeita com a Petrobras.

Auxiliares presidenciais dizem que o governo já estava preparado para receber críticas pelos ajustes necessários na política econômica, mas teme agora uma onda de demissões e quebra de empresas ligadas ao escândalo.

Esse cenário não estava previsto e pode piorar a situação econômica do Brasil, que já não é boa e ainda pode contar com o efeito da crise hídrica em São Paulo --principal mercado consumidor do país.

Há receio de que as demissões na indústria naval, que já bateram em 12 mil cortes de vagas nos últimos dois meses, dobrem até o fim do ano.

Reunião
Dilma pretende tratar desses temas em sua primeira reunião ministerial do segundo mandato, marcada para terça (27), quando deve dizer aos ministros que o ajuste fiscal é necessário e que eles têm de estar preparados para passar um período difícil.

Ela defenderá todas as medidas adotadas até aqui por sua equipe econômica e dirá que o ajuste fiscal aumenta o desafio de cada ministro buscar medidas para ajudar o país a sair desta fase de crise.

A reunião da presidente com sua equipe ocorrerá num momento em que ela é bombardeada tanto por aliados como pela oposição.

A petista tem sido criticada pelo silêncio que vem mantendo desde o ano passado, durante período em que baixou medidas como redução de benefícios trabalhistas e previdenciários, aumento de impostos e corte de gastos. Decisões que contrariaram seu discurso de campanha, mas foram aplaudidas pelo mercado financeiro.

Dilma também não fez nenhum comentário sobre o apagão ocorrido na segunda (19), que atingiu 11 Estados e o Distrito Federal, sendo que durante a campanha garantiu que o setor elétrico brasileiro é robusto e seguro.

Fogo amigo
Líderes petistas e centrais sindicais, por sinal, deixaram de lado o silêncio adotado no final do ano passado e passaram a criticar publicamente a presidente pelas medidas econômicas. O PT se queixa da perda de espaço no governo e da falta de interlocução com a presidente. Nos bastidores, grão-petistas dizem que não elegeram Dilma para "esse projeto que está aí"".

Ministros lembram que, na véspera do segundo turno, Dilma já havia dado a senha da condução do segundo mandato. A um grupo seleto de assessores, a presidente disse que, se conseguisse mais quatro anos na Presidência, estaria "livre" para governar do seu jeito, sem compromisso com reeleição.

No próximo dia 6, o PT prepara uma grande festa em Belo Horizonte para comemorar o 35º aniversário do partido. O evento deve servir de palco para afagos ao ex-presidente Lula, principal nome para a sucessão de Dilma, em 2018.

Entre aliados, Dilma não está se afastando apenas do PT. Em outra frente, a eleição para presidência da Câmara, ela enfrentará o PMDB.

O deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) é favorito e desafeto do Planalto. Para não ficar refém do PMDB, o Planalto tem incentivado a formação de uma base aliada "alternativa"", liderada pelos ministros Cid Gomes (Educação), do Pros, e Gilberto Kassab (Cidades), do PSD.

A movimentação irritou o PMDB, que também reclama da falta de acesso ao núcleo palaciano. Tanto PT como PMDB afirmam que Dilma se fechou em copas após a eleição, dando ouvido apenas ao ministro Aloizio Mercadante (Casa Civil) e isolando outros interlocutores, como o próprio ex-presidente Lula e o vice-presidente, Michel Temer.

Após eleição, grupo de Marina se dissolve

• Parte do isolamento da ex-senadora deve-se à decisão de apoiar Aécio no segundo turno da disputa presidencial

• Grupo de militantes que rompeu com a Rede Sustentabilidade tenta organizar a criação de outro partido, o Avante

Bernardo Mello Franco – Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - Três meses após a eleição presidencial, a ex-senadora Marina Silva, que chegou a liderar as pesquisas de intenção de voto, submergiu e viu o núcleo político de sua candidatura se esfacelar.

Os dois coordenadores da campanha de Marina, Walter Feldman e Luiza Erundina, afastaram-se da candidata e do esforço de criação de seu futuro partido, a Rede Sustentabilidade.

A equipe que organiza a fundação da Rede também sofreu baixas. Um grupo de militantes rompeu com Marina e agora tenta criar outro partido, o Avante, inspirado no Podemos espanhol.

A ex-presidenciável não é vista em público há mais de um mês. Sua última aparição foi no lançamento de um conjunto de propostas do Instituto Democracia e Sustentabilidade, em 12 de dezembro.

Parte do isolamento de Marina deve-se à decisão de apoiar o tucano Aécio Neves no segundo turno da eleição presidencial, caminho que dividiu os marineiros. Para Erundina, a opção foi "equivocada" e "incoerente".

"Marina criticava a polarização entre PT e PSDB, mas decidiu aderir a um dos polos. Foi uma contradição com o discurso que ela fez na campanha", afirma a deputada, que se aproximou dos dissidentes da Rede engajados na organização do Avante.

Erundina também critica o sumiço de Marina, que não compareceu nem às posses de aliados, como a do governador do Distrito Federal, Rodrigo Rollemberg (PSB).

Para a deputada e ex-prefeita de São Paulo, quem recebeu 22 milhões de votos em outubro não deveria se omitir no momento em que o governo anuncia medidas impopulares, como o aumento de impostos e o corte de benefícios sociais.

"A Marina está muito silenciosa, muito calada. A conjuntura é grave, mas não ouço ela se manifestar", critica. "Ela criou a expectativa de que enfrentaria as questões nacionais, mas lamentavelmente a sociedade está sem resposta", completa.

Feldman, que foi o principal escudeiro de Marina em 2014, afastou-se dela após o segundo turno.

Ele se desfiliou do PSB e diz ter abandonado a política para virar cartola de futebol. Em abril, assumirá o cargo de secretário-geral da CBF (Confederação Brasileira de Futebol), a convite do presidente eleito Marco Polo Del Nero.

O ex-deputado não quis opinar sobre o futuro de Marina. Questionado sobre o sumiço da ex-aliada, desconversou: "Não tenho falado com ela. A Marina tem uma lógica temporal muito própria".

A ex-senadora, que não dá entrevistas desde a primeira metade de dezembro, não quis falar com a Folha. Segundo sua assessoria, ela passou os últimos 45 dias em férias, junto à família.

Marina deve reaparecer em público nesta segunda-feira (26), no Rio de Janeiro, em ato pela criação da Rede.

O TSE (Tribunal Superior Eleitoral) negou a primeira tentativa de registro do partido, em outubro de 2013.

A ex-presidenciável havia apresentado o pedido sem atingir as cerca de 500 mil assinaturas exigidas em lei.

A decisão levou Marina a se filiar ao PSB, então comandado pelo governador de Pernambuco Eduardo Campos.

'Levy é uma ilha em um mar de mediocridade', diz Armínio Fraga

Entrevista. Armínio Fraga

• Para Armínio Fraga, ministro pouco pode fazer sozinho e ‘vai até um certo ponto’

Eliane Cantanhêde – O Estado de S. Paulo

Num estilo mais direto e crítico do que de costume, o ex-vilão da campanha presidencial, Armínio Fraga, disse ao Estado que o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, “largou bem, mas é uma ilha de competência em um mar de mediocridade, com honrosas exceções”. Segundo Armínio, que foi presidente do Banco Central no governo FHC e seria o homem da economia num eventual governo de Aécio Neves, “o governo é carregado de incompetência, de ideologia e de corrupção”.

Depois de virar o vilão da história durante a campanha, como o sr. se sente agora?
Estou me desintoxicando da campanha. Eu não sou vilão e me irritava o baixo nível do debate e aquela verdadeira produção de mentiras e de cenas, tudo muito teatral. Eu dizia uma coisa, eles deturpavam ou tiravam do contexto. Dizia outra, eles deturpavam de novo. Então, foi tudo muito frustrante. E eu não sou desse mundo.

Que mundo?
De campanha, de debate político, de confronto parlamentar. Sou uma pessoa engajada, que pensa o Brasil, que pensa política pública, mas não faço política diretamente.

O que o sr. conclui com a experiência?
Estamos vivendo uma enorme crise de valores e isso é gravíssimo. Nós temos exemplo para todo lado, é mensalão, é petrolão, mentiras na campanha, como se tudo isso fosse muito natural. Não é.

E a economia?
Há um ciclo, desde que o presidente Lula mudou de linha na área econômica no segundo mandato, com características populistas que incluem esse tipo de discurso distorcido e muito difícil de se contradizer. Muita gente acredita que um regime populista não se derrota; ele mesmo quebra, se destrói. Então, o que o Aécio tentou na campanha, e nós todos junto com ele, foi derrotar um regime populista que tem tentáculos enormes que atingem um número imenso de pessoas.

Baixo crescimento, inflação alta, juros altos, nada disso foi capaz de derrotar Dilma. Por quê?
No que se refere ao ciclo econômico, as coisas às vezes demoram a acontecer. As implicações de uma desaceleração drástica do crescimento, como ocorreu no primeiro mandato dela, ainda não se fizeram sentir. Estão a caminho. E quem vai sentir mais são os mais pobres. São sempre eles, sempre, sempre, sempre.

Pode-se dizer que a grande falha da era petista é a perda de competitividade?
Não gosto dessa palavra, competitividade. Ela tira o foco da palavra mais importante, que é produtividade. Como você chega a ser competitivo? Produzindo. Então, falta uma educação de qualidade, empresas acopladas aos melhores padrões globais, trazer para cá o que presta. O Brasil não precisa focar apenas em inovar. Em algumas áreas pode apenas imitar. E nem isso nós estamos conseguindo.

O Levy não está indo bem?
O Levy largou bem, mas é uma ilha de competência num mar de mediocridade no governo Dilma, com honrosas exceções, como os ministros Izabella Teixeira (Meio Ambiente), Kátia Abreu (Agricultura) e Alexandre Tombini (Banco Central). Sozinho, o Levy vai até um ponto. Pode evitar ou postergar um rebaixamento do crédito do País e até acalmar um pouco as expectativas, mas o lado qualitativo que nós imaginávamos vai continuar muito prejudicado. O Brasil tem uma renda per capita que é menos de 20% da americana. Então, há um espaço enorme para crescer. O Brasil deveria crescer e pode crescer, e rápido, mas tem de arrumar as coisas de uma maneira muito ampla.

Fundamental agora é arrumar as contas?
É bom arrumar as contas, mas não é só arrumar as contas. O Levy já anunciou medidas para tapar metade do buraco que ele definiu como meta para o primeiro ano. Não quero entrar em detalhes, mas umas são melhores, outras são muito polêmicas, como essas das pensões. São questões tão fora da curva global que nem deveria haver discussão, mas eram proibidas, vetadas, nessa campanha completamente maluca que nós tivemos.

As medidas anunciadas até agora não são suficientes?
Ele está focando mais do lado da receita do que do gasto. Em parte porque integra um governo que tem essa cabeça, que deixou essa herança aí. Num governo carregado de ideologia, de corrupção e de incompetência, não há nada para cortar? É lógico que tem muita gordura para cortar e, se houvesse um corte de 10% em todas as instâncias, a população nem ia notar. Eu até reordenaria: incompetência em primeiro lugar e depois ideologia e corrupção. Por mais gigantesca que seja a corrupção, acho que os outros dois têm até peso maior, aliás, bem maior.

É mesmo? Por quê?
O impacto econômico que se tem quando o país cresce zero, em vez de quatro, é inimaginável, incalculável, gigantesco. Muito maior do que esses 3% que, aparentemente, são cobrados aí de tudo.

O que mais é preciso fazer?
Tem de mexer em tudo, tem de abrir e dizer: “Tudo está valendo”. Isso é que faz falta. Como o Levy vai trabalhar, se tudo o que está aí foi feito pelo próprio governo e com a própria presidente à qual ele se reporta? Então, ele trabalha numa saia-justa danada.

Se o Aécio Neves tivesse sido eleito, ele estaria fazendo tudo isso que a Dilma liberou o Levy para fazer?
Não sei bem o que é “tudo isso”. Sinceramente, acho pouco.

O Aécio aumentaria as tarifas? Foi isso que disparou as manifestações de junho de 2013.
Num sistema no qual haja princípios, um certo realismo tarifário é essencial. É legítimo discutir para onde a conta vai, se vai para o consumidor, se vai para o contribuinte, mas para algum lugar ela vai. Do bolso de alguém sai. São decisões difíceis, mas é preciso o mercado funcionar para não haver racionamento.

E as dificuldade políticas para fazer exatamente as mesmas coisas ou mais? CUT, MST e UNE calam com a Dilma, mas não calariam com vocês. Seria um caos?
Talvez. Mas, de outro lado, nós teríamos um jato de ânimo, de energia na economia que colocaria as pessoas em dúvida quanto a ir para a rua fazer manifestação. Tem tanta coisa errada que um grupo de pessoas trabalhando com um bom objetivo, com visão clara do que precisa ser feito, chegando cedo e saindo tarde todo dia poderia fazer muito, muito mesmo.

Os críticos petistas das medidas de Dilma e do Levy dizem que a política econômica que eles estão fazendo é do PSDB, que pune trabalhadores, consumidores, contribuintes e poupa os ricos. Concorda?
O nosso modelo é muito, mas muito mesmo, mais progressista do que esse que está aí. Lugar de empresário é na fábrica, não é em Brasília. Isso é altamente regressivo. Um sistema muito ruim, no qual empresas doam centenas de milhões de reais para as campanhas. Como pode isso? Não é possível que dentro do PT e entre simpatizantes do PT não haja um monte de gente que não veja isso, que não enxergue a loucura que é tudo isso.

As pessoas vão ter de acordar.
O silêncio dessa base petista não é sobretudo estranho nos bancos oficiais e na Petrobrás? Acho que eles viveram o efeito do sapo na panela. Sabe como é? O sapo está lá na panela, no início a água é geladinha, depois vai esquentando devagar, ele não percebe, até que ferve e ele morre.

A água está fervendo?
Já ferveu. Muita gente da Petrobrás, do Banco do Brasil, da Caixa nos procurou para falar das frustrações deles. As origens do PSDB são de centro, de centro-esquerda. O Estado tem um papel importante para combater a pobreza, para promover a igualdade de oportunidades. Isso não é conservador. Conservador é ficar dando dinheiro para empresário.

E o risco sistêmico do escândalo da Petrobrás e das empreiteiras, sobretudo no setor financeiro?
Tira o financeiro, porque o risco é sobre toda a economia brasileira. O trabalho da PC, do MP e da Justiça é saudável, mas que isso gera uma certa paralisia durante um tempo, isso gera. É o preço a pagar. Certamente vale a pena.

Recessão este ano?
É, recessão. Na verdade, já tem recessão. O País cresceu menos de 1% no ano passado, deveria estar crescendo 4%. Vai dizer que não é recessão? Na China, quando cai de 8% para 7%, é recessão.

E os empregos?
É isso. Infelizmente, o desemprego vai aumentar. Primeiro, vem a insegurança, depois vem a falta de criação de postos de trabalho, e enfim vem demissão mesmo. Tudo dentro do quadro de recessão.

O sr. trabalhou anos fora. Qual o efeito de tudo isso sobre a imagem externa do Brasil?
É péssimo. Aquela euforia exagerada de 2010 passou totalmente. A percepção, então, é ruim e vem piorando. É e a percepção de um país que vem perdendo relevância. É triste.

E a política externa?
Sinceramente, perdeu a graça.

Levy, o homem forte das medidas duras do governo

• Ministro deve se tornar um anteparo para Dilma Rousseff quando os efeitos do aperto nas contas públicas começarem a ser sentidos

João Villaverde, Lu Aiko Otta - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - A primeira reunião ministerial do segundo mandato de Dilma Rousseff, na terça-feira, deve consolidar uma ideia que ganha força no Palácio do Planalto: o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, é o “homem forte” do governo. Mas o que pode parecer um status elevado, no fundo é um movimento para fazer dele a encarnação do ajuste fiscal impopular. O ministro será um anteparo importante para a presidente quando os efeitos do aperto nas contas públicas começarem a ser sentidos no dia a dia do País.

No entorno de Levy, há um certo desconforto com isso, de forma que se instalou um jogo de empurra com o Planalto. Na Fazenda, a visão é que o ministro, de fato, tem força, mas isso “deriva da presidente, que o apoia totalmente”, segundo relata uma fonte qualificada da pasta. “Ele foi ao Planalto, pediu audiência com a presidente, somente para perguntar a ela o que deveria dizer em Davos, no Fórum Econômico Mundial.”

A fonte acrescentou que o ministro também foi homem forte no governo de Sérgio Cabral, no Rio, mas nunca apareceu como tal porque “trabalha apenas com carta branca do comandante”. Nos bastidores do Planalto e da Fazenda, ouve-se que o ministro mantém uma linha direta com Dilma, por telefone e e-mail. Eles se falam com frequência. Mas com o ministro-chefe da Casa Civil, Aloizio Mercadante, ainda está na “fase de estudos”, segundo uma fonte.

Tendo saído com pouco capital político de uma eleição muito disputada, Dilma precisou de alguém forte para encarnar essa mudança, e optou por Levy. Hoje, ele é visto como peça importante da governabilidade e seu maior trunfo é o custo político de sua eventual saída. Porém, precisa da proteção da presidente para continuar a ajustar a economia. A reunião ministerial servirá para alinhar posições.

Levy conhece as implicações da missão recebida e mostra disposição para cumprir seu papel. Uma mostra clara foi dada em Davos, na semana passada. Ele disse que haveria um primeiro trimestre de recessão, que depois retificou para a expressão “contração”. E que o crescimento deste ano tende a ser “flat”, ou seja, próximo de zero. De toda forma, a mensagem que ele transmitiu é que tempos duros aguardam os brasileiros.

“Passaremos por um período recessivo, e é isso que ele tinha em mente quando tocou no tema”, avaliou o economista Sergio Valle, da MB Associados. A consultoria estima que, neste ano, a economia encolherá 1%, “para começo de conversa”.

Racionamento. Além dos efeitos do aperto nas contas públicas e do aumento nos juros, o cálculo considera a hipótese de racionamento de energia e os efeitos da operação Lava Jato, da Polícia Federal, sobre os investimentos da Petrobrás e das empreiteiras envolvidas. A combinação de fatores que jogam contra o crescimento forma, na avaliação de Valle, uma “tempestade mais que perfeita”. Essas previsões fecharam uma semana de medidas impopulares.

Logo na segunda-feira Levy anunciou que os empréstimos às pessoas físicas ficarão mais caros, com a alta do IOF. No mesmo pacote, veio o aumento dos combustíveis, com a volta da Cide. O governo também encareceu as importações e a distribuição de cosméticos. E avisou que as empresas de uma pessoa só, criadas para driblar a tributação, estão na mira da Receita.

Dilma também vetou, na terça-feira, o reajuste de 6,5% na tabela do IR da Pessoa Física, aprovado pelo Congresso, com a promessa de uma correção menor, de 4,5%. E, na quarta-feira, o Banco Central elevou os juros em 0,5 ponto porcentual, para 12,25% ao ano.

Tantas medidas amargas, porém, já causam inquietação no entorno de Dilma. A linha adotada por Levy, com apoio dela, é muito parecida com a do candidato da oposição nas últimas eleições, Aécio Neves (PSDB), e o oposto ao defendido pela própria Dilma nos palanques.J

Merval Pereira- A política preocupa

- O Globo

A questão política, mais que a econômica, é a preocupação do novo ministro da Fazenda Joaquim Levy. Na economia, ele sabe o que tem que fazer para recuperar a credibilidade do país junto aos investidores, e disso sua passagem por Davos, no Fórum Econômico Mundial, é exemplo claro.

Já classificado como um típico "Homem de Davos", Levy não poderia estar mais à vontade entre os que pensam como ele. Parecia feliz como pinto no lixo, na definição popular do grande Jamelão sobre como o então presidente americano Bill Clinton se sentiu quando visitou a Mangueira.

Davos é um lugar perfeito para técnicos como ele, que falam a língua ortodoxa dos investidores e praticam tudo o que dizem. Já trabalhou no Fundo Monetário Internacional (FMI), e nada mais natural que tenha recebido elogios da presidente Christine Lagarde.

Levy é um típico "servidor público", dizem os que trabalharam com ele, e a única experiência no mundo privado foi o tempo que passou trabalhando no Bradesco, de onde saiu para assumir a Fazenda depois que o presidente do banco, Luiz Carlos Trabuco, recusou o convite. Já atuara em governo petista, como Secretário do Tesouro na gestão de Antonio Palocci na Fazenda, e era um dos alvos preferidos do PT já naquela altura, no início do primeiro governo Lula.

A diferença é que a política econômica ortodoxa era conduzida por um petista de alta estirpe, e o presidente era Lula, que controlava politicamente o PT e os movimentos sociais. Desta vez, Joaquim Levy é o responsável principal pela condução da economia, decidido a levá-la a caminhos ortodoxos bastante conhecidos. Mas exatamente por esse comportamento previsível sua escolha deveria ter sido negociada, pelo menos na base aliada, para evitar esse tiroteio de que ele tem sido vítima.

Como isso não aconteceu, e nem a presidente Dilma se dignou a tirar uma foto junto com a equipe econômica para explicitar seu aval, Levy vai lidando com as críticas políticas da maneira que sabe, ou seja, desajeitamente. A cada declaração ou entrevista, tem que soltar uma nota explicando melhor o que quis dizer (como no caso da recessão na economia) ou esclarecendo o que o Financial Times distorceu de suas declarações sobre os programas sociais, tema em que ele faz questão de ser cuidadoso pois sabe a importância que tem no projeto petista.

Levy está incomodado com as críticas, particularmente com os ataques do PSDB. Afinal, esses são da sua grei, até poucos dias antes da eleição Levy fazia parte do grupo de assessoria econômica do candidato tucano Aécio Neves e muito provavelmente estaria na equipe de um ministério da Fazenda comandado por Armínio Fraga.

Por isso Joaquim Levy parece decepcionado com a atuação dos tucanos que, ao contrário de quando Lula assumiu em 2003, não parecem dispostos a apoiar as medidas restritivas que o governo tem anunciado. Levy diz que este não ? momento para populismos, pois a situação ? grave.

Quanto aos tiros que vem recebendo da própria base aliada, Levy evita comentários, mas sempre que pode diz que não há alternativa. No ar, a advertência implícita é de que qualquer descuido pode levar o Brasil a ser rebaixado pelas agências de risco. Abril parece ser um mês decisivo para os destinos do país. Os técnicos consideram que, com o fim do período de chuvas, se terá uma ideia clara da situação dos reservatórios e da necessidade ou não de um racionamento, cada dia mais provável.

Mas é em abril também que o novo Congresso estará votando as medidas de contenção lançadas pelo governo como medidas provisórias, depois de ter elegido os novos presidentes da Câmara e do Senado. Na economia e na política, serão dias conturbados.

Joaquim Levy se escora no entendimento que a própria presidente tem de que é preciso mudar o rumo da economia. E lembra que a palavra mudança orientou os debates da campanha presidencial. O que o povo nas ruas pediu, naquele junho histórico de 2013, foi um governo mais eficiente e não um governo maior, assegura Joaquim Levy.

A seu lado, num almoço para investidores promovido pelo banco Itaú, estava o ministro da Fazenda da Colômbia Mauricio Cardenas, com um histórico de crescimento da economia nos últimos anos, e disposto a abrir o mercado para investimentos em infraestrutura no país. Sem mudanças, adverte Joaquim Levy, o país não estará preparado para voltar a ser um dos importantes players no mundo atual, onde vários emergentes disputam os investimentos internacionais.

Dora Kramer - A lição de Valério

- O Estado de S. Paulo

Vamos começar guardando as proporções de praxe. Inclusive porque as atuais, do esquema de corrupção montado na Petrobrás, se mostram muito mais profundas e graves se comparadas ao sistema de alimentação financeira de partidos aliados ao governo do PT mediante desvio de recursos públicos.

Mas há fatos, nomes e atos surgindo no cenário que tornam inevitável a sensação de que estamos próximos de assistir a uma reprise ampliada do que foi o escândalo do mensalão.

Sentimento, aliás, compartilhado por ex-ministro do Supremo Tribunal Federal que participou daquele julgamento e, se na época já desconfiava que o caso seria um marco no procedimento da Justiça em relação a figuras de destaque na vida pública, hoje está absolutamente convicto disso. "Sem o mensalão não haveria petrolão", diz.

Em miúdos: o desfecho do julgamento, as condenações foram essenciais para que se rompesse a cultura de que gente importante fica sempre impune e que, portanto, o pacto de silêncio entre corruptos e corruptores é a melhor saída.

O STF mostrou que as coisas podem ser diferentes. Foi um paradigma e não apenas um ponto fora da curva. É o que ficou demonstrado com a decisão do ex-diretor da Petrobrás Paulo Roberto Costa de fazer acordo de delação premiada, seguido do doleiro Alberto Youssef, de outros participantes do esquema e mais recentemente exposto na linha de defesa do empresário Gérson de Mello Almada, da empreiteira Engevix, cuja tese é endossada pelo advogado de Youssef.

E qual é o argumento? Que os contratos superfaturados da Petrobrás foram usados pelo governo federal para sustentar campanhas eleitorais e comprar apoio de parlamentares no Congresso. Acusação fortíssima, mas que precisa ser provada, evidentemente.

O inédito é que uma afirmação dessa gravidade seja feita. Até antes da ocorrência do mensalão, o silêncio era a lei. O prudente calava. Marcos Valério, operador do esquema, calou. Foi condenado a 40 anos de prisão, a maior pena de todos. Ele e a ex-banqueira Kátia Rabelo continuam presos enquanto todos os políticos condenados estão em casa. Restam em regime semiaberto apenas os ex-deputados João Paulo Cunha e Roberto Jefferson.

Conta o ex-ministro do Supremo que durante o julgamento em conversas reservadas os integrantes do tribunal estranhavam o fato de Valério não ter escolhido fazer delação premiada. Concluíram que ele confiava na "palavra de alguém" de que não haveria rigor no desfecho do processo.

Quando o publicitário deu-se conta do engano, por volta do mês de setembro de 2012, quis fazer um acordo, mas era tarde. O colegiado chegou a discutir a questão. Naquela altura, porém, o processo estava estruturado e as penas definidas. Na dúvida se Marcos Valério teria mesmo algo a acrescentar ou se pretendia apenas tumultuar o processo, a STF decidiu recusar. Se quisesse prestar depoimento que o fizesse ao Ministério Público em outro procedimento.

Se o publicitário tivesse feito a delação ou se dispusesse a colaborar na hora certa, a história poderia ser outra.

Haveria, talvez, mais envolvidos a serem investigados, conforme ele chegou a prometer. Valério provavelmente não teria a pena mais grave de todas, mas perdeu o "timing", não se beneficiou e isso serviu de exemplo para os que hoje, precavidos, preferem falar enquanto é tempo.

O que não significa necessariamente que estejam falando a verdade. Há, no entanto, uma mudança de comportamento: antes protegiam os políticos acreditando que teriam deles proteção. Agora jogam os políticos no fogo, procurando se colocar como as peças mais frágeis de uma engrenagem movida pelo poder central.

A conferir se a Justiça acreditará na existência de querubins nesse mundo de negócios escusos.

Ferreira Gullar - O sonho e a realidade

• Professores, na maioria de esquerda, fazem a cabeça dos alunos, induzindo-os à leitura de livros marxistas

- Folha de S. Paulo / Ilustrada

Não faz muito tempo, assisti na televisão a um debate de que participavam alguns analistas políticos e cujo tema era o rumo ideológico que o Brasil seguirá neste ano de 2015, que mal começa.

Como sempre, aprendi muito com suas considerações analíticas, que não deixaram dúvida quanto às dificuldades que o país enfrentará daqui em diante, tanto no plano político como no econômico.

A verdade é que, conforme observaram, a própria constituição dos ministérios no novo governo da presidente Dilma deixa evidente a encrenca em que se encontra, ora nomeando ministro que representa o contrário de sua visão de economia, ora escolhendo outro, para o Esporte, que nada entende do assunto e o confessa.

Há quem tema que este segundo mandato de Dilma Rousseff seja um desastre. Espero que não chegue a tanto, pois quem paga o pato somos todos nós.

A outra parte daquele debate envolveu a questão ideológica, implicando a revelação do que ocorre nas escolas de ensino médio e nas universidades: a atuação de professores, na maioria de esquerda, fazem a cabeça dos alunos, induzindo-os à leitura de livros marxistas, apontados por eles como a única visão correta da realidade contemporânea.

Alguns alunos chegariam a afirmar que as aulas são, com frequência, trabalho de formação ideológica anticapitalista e antidemocrática.

São informações plausíveis, uma vez que em meus contatos com o meio universitário pude verificar, com surpresa, o quanto o marxismo que saiu de moda continua respirando em parte do ambiente acadêmico.

Disse, certa vez, a uma estudante universitária que não tinha cabimento insistir na crença marxista, quando a União Soviética e todos os países da Europa Oriental, sem exceção, trocaram o comunismo pelo capitalismo. Ao que ela me respondeu: "Mas nenhum desses países era verdadeiramente comunista. O comunismo ainda está por vir". Mal acreditei no que ouvia.

Qual a razão de semelhante resposta? Simplesmente, a necessidade de crer numa utopia que prometia mudar a sociedade, torná-la mais justa e solidária. Com o fim do socialismo real, só resta aos que nele acreditavam desistir dessa utopia ou apegar-se a ela, custe o que custar, ainda que contra a realidade dos fatos.

Mas esses são os que realmente sonham com uma sociedade fraterna e justa, e mal podem viver sem acreditar nela. Há, porém, outro tipo de revolucionário que, em face da inviabilidade da utopia, tomou outro rumo, que nada tem de idealista. Trata-se do populista, dito de esquerda ou, como o chamo, o neopopulista. É aí que está o perigo, e não nos marxistas idealistas, que sonham de fato com uma sociedade justa, embora inviável nos termos em que a concebem.

Não é isso o que pensam os neopopulistas, que de idealistas não têm nada, como se vê na Venezuela do chavismo, no Equador de Correa, na Argentina de Cristina Kirchner e, até certo ponto, no petismo que se mantém no poder no Brasil há 12 anos e vai para mais quatro.

Os marxistas, os comunistas de fato, nunca tiveram possibilidade de chegar ao poder no Brasil. Logo, a pregação dos professores, induzindo os estudantes ao marxismo, é perda de tempo, uma vez que, mesmo quando o comunismo era a segunda potência política e militar do mundo, não chegou ao poder no Brasil. Não seria agora que iria consegui-lo. O que esses professores dizem aos seus alunos, a realidade se encarregará de desmentir.

Já os neopopulistas, que nada têm de idealistas, ao mesmo tempo que posam de anticapitalistas, usam o dinheiro público para financiar programas assistencialistas que beneficiam as camadas mais pobres da população. Essas e outras medidas semelhantes garantem-lhes os votos de uma ampla parte do eleitorado e, graças a isso, mantêm-se no poder.

Mas, como dizia um professor meu na escola do partido, em Moscou, em economia não há milagre e, por isso, de onde se tira e não se bota, vai faltar dinheiro.

Por isso, Dilma foi obrigada a entregar o ministério da Fazenda a um economista que pensa o contrário dela. Ele vai tentar repor, nos cofres do Estado, o dinheiro que ela gastou a fundo perdido.
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Ferreira Gullar, ensaísta, critico de arte e poeta

Eliane Cantanhêde - Semana de cão

- O Estado de S. Paulo

Não foi só um dia de cão, foi uma semana inteira de cão, com o apagão de água e de energia conferindo requintes de crueldade aos aumentos de tarifas, de impostos e de juros e ao veto à correção do Imposto de Renda. Mas a presidente Dilma Rousseff também teve seu quinhão. Mulher solitária, ela está cada vez mais só.

Como em geral acontece, as piores ameaças não vêm de longe nem de adversários ostensivos, vêm de perto e de aliados insatisfeitos. No caso de Dilma, vêm principalmente do PT. Dilma está só e Marta Suplicy, ao contrário, não está mais falando sozinha. O coro petista, apesar de desafinado, está aumentando.

Marta classificou a política econômica do primeiro mandato de "um fracasso". Já o vice presidente do PT, Alberto Cantalice, não gosta da política do segundo mandato e disse em redes sociais que foi "um erro" o veto de Dilma à correção da tabela do IR. E, não bastasse Lula articulando contra, agora José Dirceu disputa a liderança do mar de lamentações e cria um novo bunker de conspiração - este só dos cumpanheiros.

É o PT contra o PT e o cerco se fechando sobre Dilma, enclausurada com um grupo restrito e de penetração limitada no partido - e no Congresso.

Se houvesse dúvida sobre a solidão de Dilma, bastaria olhar suas escolhas aleatórias e sem lastro para a Casa Civil, tanto na sua própria substituição ainda no governo Lula quanto já no seu primeiro mandato.

Erenice Guerra inebriou-se com o poder repentino e, surpreendente, meteu-se com tráfico de influência, saiu do Planalto pela porta dos fundos e só volta pela rampa para festividades. Gleisi Hoffmann anulou-se diante da chefe onisciente e autoritária. Inteligente e promissora, jogou fora a grande chance da sua vida, que caiu do nada na sua carreira política.

Nem Erenice nem Gleisi jamais teriam ido tão longe, voado tão alto e ocupado o segundo cargo operacional mais importante do Executivo - nem neste nem em nenhum outro governo - caso não fosse Dilma uma solitária, sem equipe e de poucos amigos.

Já o problema de Aloizio Mercadante é outro: se está lá para ouvir, agregar e vencer a solidão de Dilma, trata-se do homem errado, no lugar errado, na hora errada. A depender dele, aí mesmo é que Lula, Dirceu e Marta vão para o pau. Além da insatisfação com Dilma, o que há de mais ostensivamente comum entre os três é a ojeriza ao chefe da Casa Civil.

Se nem eles conseguem se entender e entender Dilma, que dirá a grande maioria que não abre a boca para gritar contra, mas abre o bolso para pagar a conta? Engole calada, não ouve os muxoxos da oposição e torce o nariz para as manobras tortuosas do PMDB e o jogo rasteiro de aliados menos cotados. Fica zonza, literalmente no escuro e contando as gotas de água no chuveiro na hora do banho - quando há banho.

Sendo assim, quem vai tomando forma de oposição perigosa e ameaçadora a Dilma é...o próprio PT. Uns discordavam da economia antes, outros rejeitam a guinada agora. Mas todos bem arrumados e pressentindo que a vaca, além de tossir, está indo para o brejo.

Há uma confluência explosiva de mensalão, escândalo da Petrobrás, empreiteiras no banco dos réus, crédito mais caro, juros oficiais acima dos 12% e aumento da conta de luz ao lado de apagão e risco de racionamento de energia. Tudo isso com um PMDB em pé de guerra e o PT abrindo frentes de batalha contra o Planalto.

Só falta um fator para acender o pavio: as ruas, ainda entregues a apenas um punhado de garotos rebeldes. Mas isso depende diretamente de Lula.

Está ruim? Mas o que está ruim sempre pode piorar.

Elio Gaspari - A privataria petista na Petrobras africana

• Mistério: por que a Petrobras venderia um ativo por US$ 1,52 bilhão e, seis meses depois, criaria uma nova empresa, endividada em US$ 1,5 bilhão?

- O Globo

Imagine-se a doutora Dilma Rousseff dizendo o seguinte durante a campanha eleitoral:“Nossos adversários quebraram o país três vezes e venderam para um banco metade da participação da Petrobras em ricos campos de petróleo da África”.

Em julho de 2013, a Petrobras vendeu ao banco BTG Pactual metade de suas operações em campos de petróleo de sete países africanos. O coração do negócio estava em dois campos da Nigéria (Akpo e Agbami) dos quais a empresa tira uma produção de 55 mil barris/dia, 60% de todo o petróleo que o Brasil importa, ou 25% do que refina.

Para se ter uma ideia do que isso significa, é uma produção equivalente a 10% do que sairia do pré-sal brasileiro um ano depois, ou quatro vezes o que Eike Batista conseguiu extrair. No século passado, a Petrobras decidiu internacionalizar-se para controlar reservas fora do país. Nada mais certo.

A empresa trabalhou em sigilo e, em outubro de 2012, contratou o Standard Chartered Bank para assessorá-la. Um mês depois, numa negociação direta com a Petrobras, o BTG Pactual mostrou-se interessado no negócio, propondo a formação de uma nova subsidiária.

A Petrobras listou 14 petroleiras que poderiam se interessar, nenhum banco. Além do Pactual, só uma empresa chegou à reta final. Quanto valiam os campos? Aí é que a porca torcia o rabo. Uma nuvem preta pairava sobre os marcos regulatórios da Nigéria (onde estão Akpo e Agbami).

O consultor financeiro da Petrobras estimou que, com a entrada em vigor de uma lei nova e ruim, valeriam US$ 3,4 bilhões, ou US$ 4,5 bilhões sem ela. O banco BSC estimou essas mesmas cifras. Sem considerar o eventual impacto da lei ruim, segundo uma publicação da consultoria Wood Mackenzie, valeriam até US$ 4 bilhões, e para outra, da IHS, só o campo de Akpo valeria pelo menos US$ 3,6 bilhões.

Endireitando-se o rabo da porca: com o barril de petróleo a US$ 100, o ano de 2014 acabou-se e até hoje a lei ruim não entrou em vigor. Em maio de 2013, o Pactual ofereceu US$ 1,52 bilhão, superando a proposta rival.

Esse valor derivava de sua avaliação de US$ 3,04 bilhões para todo o pacote africano. Como a lei poderia mudar para pior, fazia algum sentido. O banco propunha que, ao nascer, a subsidiária tomasse um empréstimo de US$ 1,5 bilhão.

Mistério: por que a Petrobras venderia um ativo por US$ 1,52 bilhão e, seis meses depois, criaria uma nova empresa, endividada em US$ 1,5 bilhão? A sugestão foi rebarbada, mas admitiu-se negociar outro endividamento, mais adiante.

Seis meses depois de fechar negócio com o BTG Pactual, a Petrobras discutia a tomada de um empréstimo de US$ 700 milhões para a subsidiária africana junto aos bancos Standard Chartered (o mesmo que assessorou a venda) e Paribas.

O setor financeiro da empresa achou as condições salgadas, com uma taxa de juros acima do que a empresa paga no mercado internacional. Em janeiro de 2014, estimava-se que a subsidiária distribuísse US$ 1 bilhão em dividendos no 1º semestre daquele ano.

Portanto, um ano depois de ter entrado no negócio, o BTG Pactual poderia receber US$ 500 milhões. Na vida real, no primeiro trimestre distribuíram-se US$ 300 milhões, deixando-se US$ 500 milhões no caixa e US$ 200 milhões aplicados (o empréstimo, aprovado, não entra nessa conta).

Aquilo que, no século passado, foi uma ideia de ampliar os interesses da empresa em terras estrangeiras resultou numa privatização de metade da sua operação africana. Acertou-se também que ela continuaria sob o logotipo da Petrobras, apesar de a estatal só ter metade do negócio.

A presidência da empresa e a diretoria comercial seriam ocupadas rotativamente pelo BTG e pela Petrobras, a cada dois anos. O diretor financeiro da subsidiária seria nomeado pelo banco, e o diretor operacional sairia da estatal.

Se a Petrobras tivesse liquidado alguns micos ou operações menores, tudo bem, mas ela vendeu metade de sua participação em terras d’África, especificamente a de dois campos nigerianos estrategicamente valiosos. Fez isso com relativa pressa, pois o negócio deveria ser concluído em 2013.
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Elio Gaspari é jornalista

João Bosco Rabello - Apagão esclarecedor

- O Estado de S. Paulo

Na história humana a verdade é associada à luz, mas no governo Dilma, considerando o que ocultou na campanha da reeleição, se fez enxergar na escuridão.

Os sucessivos apagões que mergulham o País na escuridão clareiam a gestão populista que levou à crise energética, e produzem um racionamento em forma de campanha tardia pela racionalização do consumo.

Há mais de um século, o juiz Louis Brandeis, da Suprema Corte americana, cunhava a máxima de que o melhor desinfetante é o sol, ao cobrar transparência ao sistema financeiro que para ele anistiava os capitalistas causadores de crises e penalizava a classe média. A causa aqui se inverte, mas a receita a aplicar é a mesma, pois a população começa a pagar a conta de uma gestão que brigou com as regras capitalistas, perdeu a batalha e agora emprega um discurso de autoanistia, terceirizando a culpa para o contexto internacional.

É o resultado de erros que vão desde um governo permanentemente em campanha, em que racionalização do consumo é palavrão, à teimosia em um modelo econômico exatamente estimulador do consumo.

Hoje emerge a realidade de inadimplência alta, crédito mais caro, custo da luz dobrado para compensar a redução eleitoreira, restrições de direitos trabalhistas e financiamento estudantil, gasolina e impostos mais altos - uma crise energética sem saída em curto prazo devido ao atraso no cronograma de obras das hidrelétricas e de linhas de transmissão.

Os especialistas advertiram seguidamente, pelo menos desde 2012, para a necessidade de promover uma reeducação de consumo. Mas o governo, sempre em campanha, reduziu a conta estimulando o consumo, estourou os cofres das distribuidoras e agora faz o corte seletivo que não gera consumo consciente.

"O corte já era esperado com a queda do nível dos reservatórios e consumo maior que a oferta. Tinha de ser feita uma política de racionalização, com campanha de eficiência energética e de esclarecimento", pontua a consultora para o setor, Elena Landau.

A contabilidade criativa derrete como cera ao calor da erupção das contas públicas, cujo deterioramento foi sempre negado. O modelo que a presidente Dilma adotou em substituição ao que considerava "rudimentar", exige agora antibiótico de largo espectro para revertê-lo.

O atraso nas obras e as dificuldades econômicas não apontam saída em curto prazo, o que agrava a situação de um governo acuado e pobre em recursos técnicos, humanos e materiais - ao qual, portanto, falta também luz para gerir a crise.

Luiz Carlos Azedo - Balaio de caranguejos

• Ex-diretores da Petrobras e executivos de empreiteiras estão fazendo uma espécie de “chamada de co-réu”. No jargão dos advogados, isso significa atrair para o processo a atual diretoria da empresa e até mesmo a presidente Dilma Rousseff

- Correio Braziliense

A estratégia do Palácio do Planalto para blindar a presidente Dilma Rouseff e mantê-la longe da Operação Lava Jato é evitar que uma nova CPI seja aberta para investigar o caso no Congresso. Dependendo do desfecho da eleição da Mesa da Câmara, a situação poderia sair do controle, ainda mais diante do “despelote” que se instalou entre os diversos envolvidos, principalmente depois que a diretoria Petrobras passou a responsabilizar as empreiteiras pelo ocorrido.

A essa altura do campeonato, a nova narrativa governista parece aquela historia do ovo e da galinha: uma discussão sobre quem nasceu primeiro. Ao apontar o dedo para as grandes empreiteiras, as mesmas que antes o governo tentava salvar, responsabilizando-as pelo aliciamento de funcionários da estatal e a distribuição de propina aos políticos para que apadrinhassem a nomeação dos diretores da estatal, a Petrobras gerou uma reação em cadeia.

Os ex-diretores da Petrobras Paulo Roberto da Costa e Nestor Cerveró, o doleiro Alberto Yousseff, os executivos das empreiteiras que estão presos e até o ex-presidente Petrobras José Sérgio Gabrielli estão fazendo uma espécie de “chamada de co-réu”. No jargão dos advogados, isso significa atrair para o processo a atual diretoria da empresa e até mesmo a presidente Dilma Rousseff, que presidia o conselho de administração da estatal no governo Lula.

Parecem caranguejos no balaio: quando um tenta escapar, os outros se encarregam de puxá-lo pra baixo. O executivo Augusto Mendonça Neto, da Setal, acusou o ex-diretor de Serviços da Petrobras Renato Duque de pedir dinheiro para o PT. Disse que doou R$ 4 milhões entre 2008 e 2011 à legenda como pagamento de propina para a realização de obras na Refinaria do Paraná (Repar). Petista de carteirinha, Duque é o único dos suspeitos presos por determinação do juiz Sérgio Moro que conseguiu um habeas corpus no Supremo Tribunal Federal (STF) até agora.

O advogado do doleiro Alberto Youisseff, apontado como o responsável pela principal denúncia contra os políticos, também foi para o ataque. Antonio Figueiredo Basto diz que os agentes públicos e políticos foram os grandes beneficiários do esquema de corrupção: "A participação dos políticos e dos agentes públicos foi fundamental no esquema. Não dá para desviar o foco para empreiteiras e operadores. O esquema foi comandado por agentes políticos para a manutenção de grupos e partidos no poder. O esquema alterou os resultados das eleições de 2006, 2010 e possivelmente de 2014. Houve desequilíbrio no pleito", disse.

Antônio Sérgio de Moraes Pitombo, advogado do empresário Gérson de Mello Almada, vice presidente da Engevix Engenharia, partiu para o ataque frontal ao PT: “seu pragmatismo nas relações políticas chegou, no entanto, a tal dimensão que o apoio no Congresso Nacional passou a depender da distribuição de recursos a parlamentares. O custo alto das campanhas eleitorais levou, também, à arrecadação desenfreada de dinheiro para as tesourarias dos partidos políticos”. Também sustenta que o grande operador do esquema era Paulo Roberto Costa.

Segundo ele, a Petrobrás foi escolhida para financiar a base do governo no Congresso e os partidos aliados do governo. “Quem detinha contratos vigentes com a Petrobrás sofreu achaque. Ainda que se admita, a título de argumentação, que teriam praticado crimes similares, é ínsito aos acontecimentos entender que a exigência de Paulo Roberto Costa – e demais brokers do projeto político de manutenção dos partidos na base do governo – colocou os empresários, todos, na mesma situação, não por vontade, não por intenção, mas por contingência dos fatos.”

Sem pressa
Para desespero dos envolvidos, o presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Ricardo Lewandowski, não tem pressa em relação ao caso. Na sexta-feira, rejeitou um pedido de liberdade de Fernando Antonio Falcão Soares, conhecido como Fernando Baiano e apontado pela Polícia Federal como lobista que supostamente operava em favor do PMDB no esquema de corrupção na Petrobras. Está preso desde 18 de novembro, Baiano é admitiu ser intermédiário de negócios com a Petrobras, mas negou envolvimento com a legenda. Lewandowski alegou que o caso não tem urgência para motivar decisão do presidente. Vale para os demais executivos que estão presos.

Vinicius Torres Freire - Apagão e seca de verdades

• De repente, como se um ralo diluviano tivesse tragado ontem toda a água, governos passam a acordar para a crise

- Folha de S. Paulo

Governos mentem de modo sem vergonha, bidu. Parecem mentir ainda mais quando suas vergonhas ficam nuas, embora de costume não tenham vergonha, tal como mentiram no caso da escassez de água e luz, que parecia uma intriga da oposição até outro dia. O que houve subitamente com a água que não faltaria? Sumiu pelo mesmo ralo por onde havia escoado o resto da vergonha na cara dos governantes?

Três meses depois da eleição, passa-se a usar a palavra-tabu "racionamento": para água, luz, gasto público etc. Quem toma a iniciativa de dizer que a água ou o dinheiro subiram no telhado são as figuras recém-nomeadas para arrumar a bagunça deixada pelos governos Dilma 1 e Alckmin "n-1". Os responsáveis maiores pela lambança fingem-se de mortos.

O governo de São Paulo, por exemplo, começou a avisar empresário industrial na semana passada que vai ser preciso dar um jeito de fazer cortes, além de anunciar que #nãovaiteralface, pois descobriu agora, apenas agora, que várias hortas são irrigadas de modo perdulário. Se tal coisa acontece com abobrinhas e tomates, imagine o que se passa com a captação industrial de água de rio. Bom dia, governo Alckmin.

Na sexta-feira, o governo fede- ral disse que vai preparar medidas de socorro aos Estados e incenti- var o uso racional da água, tudo de modo a evitar racionamentos. É escárnio, é besteira e é até um tiro no próprio pé da propaganda enganosa pedestre.

Escárnio. Onde estava o governo até agora? De férias nas cataratas do Niágara? Não viu que durante 2014 o nível das represas caía a índices apavorantes, dos lagos das hidrelétricas às represas de Geraldo "Não Vai Faltar Água" Alckmin? Aliás, represas que esvaziavam também por causa da negligência dos governos federal e paulista.

Besteira. Como assim, "evitar o racionamento"? Ainda que o Imponderável de Almeida e os Deuses da Chuva por sorte nos socorram, a atitude correta (desde o verão de 2014, aliás) é se preparar para o pior de modo a evitar o inominável, que ainda dá para evitar se não vier outro ano de seca. É preciso racionar água ou "racionalizar", seja lá qual for o método para fazer a coisa direito ou o eufemismo para dourar a pílula.

Tiro no pé. Se o governo promete "socorrer os Estados", é porque de socorro carecem. Se carecem de socorro, é porque há risco de falta d'água e, assim, risco de falta de luz, negado até quase ontem pelo Planalto. Bom dia, governo Dilma. Acorde. Onde está João Santana, o marqueteiro, o melhor ministro de Dilma 1? Sem Santana, o governo se afoga até no seco.

Nesse clima de "barata avoa", soube-se na sexta-feira que, pelo modelo de gerência de custos e produção do sistema elétrico, voltamos a entrar no primeiro nível de escassez crítica, no qual é melhor economizar (até 5%) do que produzir energia (um indicativo teórico de "racionalização"). Os reservatórios do Sudeste continuam a baixar, assim como a previsão de entrada de águas nas usinas da região, no pior janeiro em 80 anos.

Foi mais de ano de mentiras, categoria na qual se incluem omissões, desconversas, dissimulações e outras mumunhas. Enrolaram tal e qual o governo FHC, em 2000, véspera do apagão.

Miriam Leitão - Além do céu

- O Globo

No verão tórrido de 2015 olhamos para o céu à espera de gotas de água salvadoras. Mesmo se chover bastante, não será o suficiente porque o país foi longe demais na direção errada. Os governos deveriam fazer agora um gabinete de gestão de crise para enfrentar a escassez de energia e água no país. Foi assim no apagão de 2001. A Califórnia enfrenta a seca tomando medidas duras.

Uma terrível seca atingiu também a Califórnia. As autoridades não ficaram esperando a chuva. O governo do estado e as prefeituras dos municípios mais afetados se uniram para racionar o que era escasso e administrar a crise. As autoridades de recursos hídricos afirmam que, quando ocorre fenômeno dessa gravidade, a situação demora a se regularizar. Mesmo se as chuvas — e a neve — forem abundantes, levará tempo até a normalização dos reservatórios de produção de energia e de abastecimento de água. Por isso, o racionamento está sendo rigoroso. Para se entender a dimensão: a oferta de água passou a ser de 10% e agora, que choveu um pouco mais, passou para 15% do consumo. Os californianos têm que viver com isso, apenas, porque as autoridades querem restabelecer o nível seguro dos reservatórios.

As crises provocadas por extremos climáticos vão se repetir com mais frequência e intensidade no futuro, segundo os cientistas. Por isso, o Brasil tem que aprender a lidar com elas da maneira correta, criando uma metodologia de gerenciamento de crises. A primeira atitude é não esperar que a solução caia do céu. A segunda é ter um grupo de pessoas de alto nível dedicado à administração da emergência.

Foi assim no governo Fernando Henrique. Ele errou na falta de planejamento que levou ao apagão de 2001, mas a gestão daquela crise ensinou muito e treinou muita gente. Com o ministro-chefe da Casa Civil da época Pedro Parente deslocado para gerenciar o problema, estavam pessoas como Mário Veiga, um dos maiores especialistas em energia, e Jerson Kelman, que depois fundou a Agência Nacional de Águas e acaba de assumir a presidência da Sabesp.

Aquele grupo nunca negou a dimensão da crise, tomou medidas para a redução do consumo, fez campanhas, mobilizou a população e criou soluções como a instalação das termelétricas como garantia do sistema hidrelétrico. Depois disso, muito poderia ter sido feito, e não foi, para substituir a emergencial opção pelas térmicas fósseis por uma matriz diversificada e limpa.

O mundo da energia mudou muito desde então. As energias eólica e a solar cresceram fortemente em países como Alemanha, Espanha, Estados Unidos e China, tornaram-se mais baratas e derrubaram o mito de que seriam apenas um detalhe na matriz. As duas fontes podem produzir juntas, instalando-se no mesmo espaço, as torres e os painéis fotovoltaicos. No Estado da União, discurso anual que faz no Congresso, o presidente americano Barack Obama disse que eles são “o número um em energia eólica no mundo” e acrescentou: “a cada três semanas nós colocamos na rede mais energia solar do que em todo o ano de 2008”.

Foram desenvolvidas em vários países soluções, como a geração distribuída: pequenos centros geradores são instalados em casas, prédios e empresas e se conectam à rede. Ofertam energia, em alguns momentos, e compram, em outros. Desta forma, painéis de energia solar são disseminados, e o consumidor paga menos pela energia. O que ele fornece é descontado do que tem a pagar na conta de luz. Uma das vantagens, hoje, da Califórnia, no setor de geração de eletricidade.

Desenvolveram-se tecnologias e métodos de economia de energia. O conceito vai além de apagar as luzes desnecessárias ou ter eletrodomésticos que consomem menos. O desperdício de água e de energia é reduzido com projetos de eficiência energética e de proteção da rede contra vazamentos.

O Brasil apostou nas grandes obras na Amazônia, que geram controvérsia, atrasam e permitem aditivos e sobrepreços. A energia eólica se impôs por insistência do setor, e a solar não tem tido incentivo do mesmo governo que mantém, até hoje, subsídio de R$ 1 bilhão por ano ao carvão. Se o governo tivesse investido nas novas fontes renováveis, na geração distribuída, na eficiência energética, estaríamos menos aflitos neste verão. Teríamos poupado água nos reservatórios e aguardaríamos mais calmos os desígnios do céu.