A crise da Venezuela e, em menor escala, da Argentina serve de ajuda na defesa da democracia, regime tão criticado, devido ao êxito da China e à Grande Recessão
A destituição, na Ucrânia, por uma revolta popular, de um governo eleito colocou na pauta de publicações internacionais e colunistas as fragilidades, no mundo de hoje, do regime democrático. Aquela ideia surgida dos escombros do Muro de Berlim, pulverizado pela debacle do regime soviético, em 1989, de que o sistema de liberdades de mercados e cidadãos vencera definitivamente o confronto com modelos autoritários, à direita e à esquerda, tem sido de fato abalada.
O tema foi abordado, em profundidade, pela penúltima edição da revista inglesa “The Economist”.
São relacionados dois motivos para o abalo recente da aceitação da democracia como o melhor dos regimes: o sucesso da China, ao resgatar milhões da pobreza por meio de um modelo de capitalismo selvagem de estado sustentado por uma ditadura de partido único, e os efeitos deletérios sobre a imagem do capitalismo causados pela Grande Recessão, deflagrada em Wall Street em 2008, e o rastro que deixou em termos de desemprego e consequente empobrecimento.
É extenso o rol de fracassos, entre eles o desapontamento com a Primavera Árabe, em que déspotas têm sido quase sempre substituídos por outros, até mais sectários. O tema é instigante e crucial, sendo capaz de alimentar intensos debates.
É fato, porém, que nada do que aconteceu nos últimas décadas com a Humanidade é capaz de abalar a fé na democracia, o que não significa isentá-la da necessidade de aperfeiçoamentos. A “Economist”, por exemplo, há mais de 100 anos defensora de princípios democratas liberais, vê com interesse experiências de democracia direta que possam se valer das facilidades digitais de hoje em dia.
Martin Wolf, por sua vez, colunista do jornal, também inglês, “Financial Times”, para frisar o poder do modelo de liberdades, registra que quase cem países são hoje democracias “mais ou menos imperfeitas”, o dobro do número em 1990. Wolf lembra, ainda, que não basta haver eleição para configurar uma democracia, caracterizada por uma “rede complexa de direitos, obrigações e limitações”. Ou seja, “os pesos e contrapesos”. Isso é tão verdade que a Venezuela e seus seguidores construíram um modelo político autoritário por meio de eleições. É claro que sem Justiça e Legislativo independentes não se pode falar a sério em regime democrata.
A boa notícia é que, na América Latina, começa a se esgotar a diabólica fórmula chavista: de acabar a democracia pelo manejo de instrumentos formalmente democráticos (plebiscitos, eleições, etc). O chavismo desmorona pela já conhecida incapacidade de regimes populistas, sempre autoritários, gerenciarem com o mínimo de eficiência suas economias. Se o chavismo quebraria o dono de uma das maiores reservas de petróleo do planeta, não seria a Argentina dos Kirchner, inspirados em Chávez, que teria êxito. A crise dos dois países representa um alento para a democracia representativa, e não apenas no continente.
Nenhum comentário:
Postar um comentário