Ao decidir isolar o líder do partido na Câmara, o governo sinaliza claramente que opera com a perspectiva de administrar a crise com o PMDB a partir do Senado. Personalizar a crise em Eduardo Cunha equivale a marginalizar a bancada da Câmara, da qual o deputado é porta-voz respaldado.
É uma estratégia que pode servir para a relação congressual cotidiana, mas que não tem a mesma eficiência no contexto de uma eleição nacional em que as alianças entre os dois principais partidos da base de sustentação do governo estão na raiz da crise.
A decisão de resistir à pressão do PMDB por mais espaço ministerial e equilíbrio na formação de alianças, anunciada pelo presidente do PT, Rui Falcão, indica que o governo não tem expectativa de solução conciliatória e vai correr o risco de apostar na divisão do parceiro.
O diagnóstico de circunstância inconciliável é respaldado pela causa do conflito, centrado no projeto hegemônico do PT cujo êxito depende de superar em capilaridade a larga vantagem do rival na ocupação do mapa político, com presença em quase 100% do território nacional.
Os ministérios e estatais a eles vinculadas são instrumentos fomentadores desse poder político, razão pela qual simbolizam a disputa.
Não havendo sinal de paz no horizonte, o Planalto aposta nos dividendos eleitorais que a resistência à pressão do PMDB por cargos produz.
O PT não dissimula mais a intenção de enfrentar essa superioridade do PMDB. Já a idealizara logo após a eleição de Dilma, celebrada então pelo ex-ministro José Dirceu como o início do "verdadeiro governo do PT".
Dirceu não concedia a Dilma a liderança que permitiu a Lula administrar o ímpeto hegemônico do partido, vaticinando a submissão de seu governo ao PT. Sua profecia se confirma no último ano de mandato da presidente, quando seus índices de aprovação caíram à metade em relação aos dois primeiros.
Lula chegou a afirmar em seu governo, em entrevista ao Estado, que não se deveria dar maior importância às propostas sectárias do PT, porque diziam respeito ao partido e não ao governo. E se deu em garantia de que a fronteira entre ambos não seria violada.
Quando colocado diante da fragilidade de tal garantia depois que deixasse o cargo, jocosamente respondeu que estaria no futuro governo em espírito. Hoje, pleno na articulação política de Dilma, está, de fato, presente - mais encarnado do que nunca.
E, como sugere a fotografia com a cúpula da campanha dentro do palácio da Alvorada, engajado no projeto do partido. O que o PMDB, espelho mais fiel de que a política não é para amadores, sobretudo no Brasil, já percebeu.
Fonte: O Estado de S. Paulo
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