• Ex-presidente teve uma conversa reservada com vice; para ele, se partido aliado abandonar presidente, impeachment será deflagrado
Vera Rosa e Adriano Ceolin - O Estado de S. Paulo
BRASÍLIA - O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva teve uma conversa reservada com o vice-presidente Michel Temer há oito dias, em São Paulo, e manifestou extrema preocupação com a possível saída do PMDB do governo diante do agravamento da crise política e econômica. Lula pediu ajuda a Temer por avaliar que, se o PMDB abandonar Dilma, o processo de impeachment será deflagrado.
A conversa, mantida sob sigilo, ocorreu 48 horas depois de Temer dizer a empresários, que Dilma corria o risco de não concluir o mandato se permanecesse com popularidade tão baixa.
No mesmo dia em que o vice admitiu, na capital paulista, ser muito difícil um governante resistir três anos e meio no poder sem apoio, Lula jantou com Dilma, em Brasília. Aconselhou a afilhada a se reaproximar de Temer, que comanda o PMDB, e do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ).
Cabe a Cunha, desafeto do governo, decidir se um pedido de impeachment terá ou não prosseguimento. O script em discussão por deputados oposicionistas, como os do PSDB, DEM e PPS, e por dissidentes da base aliada, entre os quais os do PMDB, prevê que Cunha, num jogo de cena, rejeite o pedido, mas um recurso ao plenário da Câmara deflagre o processo.
Lula disse a Temer que Dilma parece não estar percebendo a gravidade da crise. Na sua avaliação, a presidente tem muita dificuldade de ouvir, de tomar decisões e de corrigir rumos. O vice reclamou da desconfiança de Dilma e do ministro da Casa Civil, Aloizio Mercadante. Foi além: admitiu que, se o congresso do PMDB, marcado para novembro, fosse hoje, a maioria do partido decidiria pelo rompimento com o governo.
No jantar oferecido por Temer a governadores do PMDB e ministros do partido, na terça-feira, os convidados desfiaram um rosário de queixas contra o Planalto. Um dos participantes afirmou que o partido “jogou uma boia de salvação para Dilma”, com a Agenda Brasil proposta pelo presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), “mas o governo foi lá e furou a boia”.
A crise piorou depois que o Brasil perdeu o selo de bom pagador, o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, ameaçou deixar a equipe e um movimento pró-impeachment ganhou corpo na Câmara, na esteira de um pedido de afastamento de Dilma apresentado pelo jurista Hélio Bicudo, um dos fundadores do PT. Para completar o inferno astral petista, a Polícia Federal pediu ao Supremo Tribunal Federal que Lula seja ouvido no inquérito aberto para investigar o envolvimento de políticos no esquema de corrupção na Petrobrás.
Na sexta-feira, em meio a rumores sobre sua saída da Casa Civil, Mercadante conduziu uma reunião no Palácio do Planalto para traçar uma estratégia de repactuação da base aliada. A ideia é que, a partir de agora, haja conversas individuais com deputados e senadores, e não apenas com os líderes.
O Planalto não sabe com quantos votos pode contar no Congresso nem mesmo na votação do projeto de lei do Orçamento de 2016, que escancarou um rombo de R$ 30,5 bilhões. Na semana passada, ao desabafar com Temer, Lula afirmou que, sem o apoio do PMDB, Dilma não conseguirá aprovar “absolutamente nada” no Congresso, muito menos a criação de impostos. O ex-presidente acha que Dilma erra ao não afrouxar o ajuste fiscal.
“O problema é que a economia se contaminou pela crise política e, se o Planalto não agir rapidamente, tudo pode piorar”, admitiu o líder do governo no Senado, Delcídio Amaral (PT-MS).
“O equilíbrio no Orçamento deixou de ser uma questão de programa de partidos. Os cortes precisam ser feitos e, se isso não for suficiente, precisamos buscar fontes de receita. Reduzir ministérios é um gesto para poder convencer a sociedade sobre o aumento de tributos”, emendou o deputado Ricardo Barros (PP-PR), relator do Orçamento de 2016. / Colaboraram Gustavo Porto, Andreza Matais e Adriana Fernandes
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