A declaração do ministro da Fazenda, Paulo Guedes, ontem, em comissão do Congresso, de que o Brasil está no "fundo do poço" é "déjà vu". Desde que a reforma da previdência naufragou no governo de Michel Temer, após o episódio do soturno encontro do presidente com Joesley Batista, da JBS, consultorias e economistas tentam medir exatamente a profundidade do buraco em que a economia brasileira se metera. O fundo do poço já fora superado e, pelo visto, voltamos a ele.
Apesar da corrente para a frente de otimismo, quando houve o impeachment de Dilma Rousseff, e outra, mais forte, quando Jair Bolsonaro foi eleito, nenhuma das previsões de crescimento se confirmou. Para sair do "fundo do poço" o atual governo conta apenas com os efeitos positivos sobre as expectativas de aprovação de reformas.
A equipe econômica fez a coisa certa e contingenciou R$ 30 bilhões do orçamento na primeira revisão das receitas - nada dramático em relação ao que foi feito nos governos anteriores. Agora, com a nova queda das projeções de crescimento, logo da arrecadação, mais R$ 5 bilhões a R$ 10 bilhões poderão ser poupados preventivamente. Com o teto de gastos, o horizonte de despesas encolheu, sem contar que as receitas não estão subindo. Há R$ 86 bilhões orçados para gastos discricionários (que na verdade não o são), montante que, segundo estudos da FGV, está abaixo do mínimo necessário para que a máquina burocrática da União continue funcionando sem grandes sobressaltos.
A economia caminha para a estagnação e o PIB do primeiro trimestre pode ser negativo, pelo recuo insistente da indústria, que pode ser contrabalançado pelo desempenho dos serviços (63% do PIB) no período. Nos 12 meses encerrados em março, o setor avançou 1,1%, ainda que mostrando os contrastes da situação econômica. Os serviços prestados à família subiram 4,4% e os de tecnologia de informação, 9,2%. Mas com a retração das atividades industriais, os serviços correspondentes recuaram, como os de transporte, armazenagem e correios (-1,6% no acumulado até março, em volume).
As consequências políticas e econômicas de um crescimento quase vegetativo de 1% ao ano no último triênio, após uma recessão atroz, podem ser drásticas. Para além do desespero de 13,4 milhões de desempregados, há a piora dos investimentos públicos nos serviços básicos, já precários, e a paralisia dos salários dos trabalhadores do setor privado. Apesar do dramático alerta do ministro Paulo Guedes no Congresso, a solução para sair da crise insinuada pelo governo não contempla alívio de curto prazo ou emergencial. Guedes disse que a economia não teria motivos para reagir, pois o Congresso não aprovou as reformas. E se demorar a fazê-lo?
A economia sofreu o choque da penúria de recursos públicos e não consegue andar com as próprias pernas. Para a equipe econômica, não há muito o que fazer a não ser esperar o choque de expectativas decorrente da aprovação da reforma da previdência, embora os ganhos fiscais sejam modestos nos primeiros anos após sua aprovação.
Há sinais de que algum estímulo está a caminho, em resposta a pressões políticas que a falta de despesas públicas começa a provocar e ao desgaste do governo com a estagnação econômica. A concessão de serviços públicos, o incentivo mais óbvio, não avança com rapidez. Desde o governo Temer que se formatam e reformatam as regulações e elas ainda fazem muita falta.
Se, como é tradição, o governo não agir para impedir que a estagnação se transforme em recessão, o Congresso o fará, não necessariamente com boas soluções. O presidente da Câmara, Rodrigo Maia, disse anteontem que o teto de gastos poderá levar ao "colapso social" e que o Congresso terá de encontrar alguma forma de aumentar gastos.
Após três anos de austeridade fiscal e igual período de discussões sobre a reforma previdenciária, um sinal verde para que as despesas públicas voltem a crescer sem balizas é tudo o que o país não precisa. Por outro lado, só a torturante espera da aprovação das reformas, não será suficiente para vencer a estagnação e obter taxas de crescimento razoáveis. Enquanto as reformas não vêm, o governo deveria fazer um esforço concentrado para discernir quais despesas públicas teriam o melhor efeito multiplicador sobre a atividade e realizá-las. Usar receitas não recorrentes (cessão onerosa e privatizações) para investimentos e reduzir a taxa de juros é um dos caminhos.
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