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As ruas ardem
E assim, 2019 anos depois do nascimento do Senhor, o Rabi de Nazaré, transcorridos apenas 135 dias desde a posse do ex-capitão Jair Messias Bolsonaro na presidência da República Federativa do Brasil, o eixo da política sofreu forte mudança nesta terra onde se plantando corre-se o risco de colher o inesperado.
Se a Era PT no governo se divide entre antes e depois de junho de 2013 quando multidões sem comando ocuparam as ruas para protestar indistintamente contra tudo e contra todos, dê-se por estabelecido que a Era do Mito será no futuro estudada pelos historiadores levando-se em conta o antes e o depois da data de ontem.
A ninguém foi dado o dom de antecipar que as manifestações contra os cortes de verbas para a Educação atrairiam cerca de 1 milhão de pessoas predominantemente jovens às ruas de todas as capitais e grandes cidades do país – nem mesmo à Agência Brasileira de Informações (ABIN), uma espécie de Serviço Secreto do governo.
Estimava-se que elas seriam se tanto de médio porte, concentradas nas capitais, e destinadas a reclamarem por mais dinheiro para a Educação. Pois bem: multidões desfilaram em mais de 200 cidades de todos os Estados. E até em municípios pequenos como Felipe Guerra, no Rio Grande do Norte, com menos de 6 mil habitantes.
A Educação serviu de espoleta para levar às ruas estudantes, professores e pais de alunos não só das universidades públicas como das particulares. Sem falar de estudantes secundaristas preocupados com o que poderá acontecer nos próximos anos. Para o governo, melhor seria que tivesse sido só a Educação o motivo de tudo.
Mas não. Lembra-se de um cartaz de junho de 2013 que dizia “não é somente por 20 centavos”? Referia-se ao aumento no preço das passagens de ônibus no Rio e em São Paulo. Não foi só pelo corte de 30% do dinheiro que banca despesas de custeio das universidades com luz e água, segurança e limpeza que as ruas se encheram de gente.
Foi também por causa da reforma da Previdência, da política de armamento da população, do acesso facilitado ao porte de armas e da falta de reação da economia a todos os estímulos que recebe para que cresça. Políticos e militantes de esquerda tentaram pegar carona nas manifestações. O governo preferiu hostilizar os manifestantes.
Se a presidente Dilma Rousseff, em junho de 2013, saudou, perplexa, o que viu e acenou com providências jamais tomadas para amenizar a insatisfação geral, o presidente Jair Bolsonaro, dos Estados Unidos onde se encontrava atrás de um prêmio, fez justo o contrário. Chamou os manifestantes de imbecis e de “idiotas úteis”.
Aqui, o ministro Onyx Lorenzoni, da Casa Civil, comparou o corte na Educação ao corte do churrasco e da cervejinha do fim de semana pelo chefe de família que perdeu o emprego. E o Delegado Waldir, líder do PSL na Câmara, disse que os manifestantes representavam uma minoria de “baderneiros” e de fumadores de maconha”.
O capitão acendeu a fogueira que pode incinerar o seu governo.
Dia de balbúrdia no governo
Tsunami particular
A crise viajou, mas nem por isso o governo livrou-se dos seus efeitos. Acuado pelas críticas dos bolsonaristas em geral, dos garotos Carlos e Eduardo e do autoproclamado filósofo Olavo de Carvalho, o general Hamilton Mourão, no exercício da presidência da República, primeiro disse que as manifestações de ontem eram naturais numa democracia, depois acrescentou que elas foram aproveitadas por adversários do capitão.
Por mais que tenham se esforçado, os defensores do governo perderam para a oposição o debate sobre o corte de recursos para a Educação travado na Câmara dos Deputados durante a sabatina do ministro Abraham Weintraub. Os líderes dos partidos do Centrão sumiram do Congresso para não serem constrangidos a defender o governo. E o ministro acabou indo embora dali menor do que havia entrado.
As agruras do titular da crise não foram menores. O prefeito de Dallas, no Texas, recusou-se a recebê-lo. O ex-presidente George Bush Junior o recebeu depois de dizer por meio do seu porta-voz que fora surpreendido pela visita, e que nada fizera para que ela acontecesse. Para completar, a VEJA revelou que o senador Flávio Bolsonaro é suspeito de ter lavado dinheiro mediante a compra e venda de dezenas de imóveis no Rio.
Se comparados com os rolos conhecidos do seu ex-assessor Fabrício Queiroz, os de Flávio configuram um tsunami que atingiu a praia do clã dos Bolsonaros.
A volta da crise está marcada para logo mais à noite.
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