Por Carolina Freitas, Hugo Passarelli, Cristian Klein e Gabriel Vasconcelos / Valor Econômico
SÃO PAULO, RIO, BRASÍLIA E DALLAS (EUA) - Os protestos contra o contingenciamento de gastos das universidades federais, em 198 cidades de todos os Estados, trouxeram ontem de volta ao cenário político grandes manifestações de rua que não aconteciam desde o "Ele não", durante a campanha eleitoral do ano passado. O presidente Jair Bolsonaro, em viagem aos Estados Unidos, reagiu com críticas aos manifestantes.
Em Dallas, Bolsonaro chamou os estudantes que protestam de "idiotas úteis", que seriam manipulados por minoria "bestalhona" que comanda as universidades. "A maioria ali é militante", disse o presidente. Ele afirmou que não gostaria de fazer o contingenciamento e culpou governos anteriores. "A gente pegou o Brasil destruído economicamente (...) e, se não tiver esse contingenciamento, simplesmente entro contra a lei de responsabilidade fiscal."
Os protestos de ontem reuniram professores, funcionários e estudantes de entidades públicas e privadas. A Avenida Paulista, em São Paulo, e a Presidente Vargas, no Rio, concentraram o maior número de pessoas, com cerca de 150 mil cada uma, segundo a organização dos atos. A Polícia Militar não divulgou estimativa de público.
Cidades menores, especialmente nas regiões Nordeste e Sul, também registraram protestos. São localidades onde foram construídas universidades federais, nos governos Lula e Dilma, como parte do projeto de regionalização do ensino superior.
Enquanto os protestos ocorriam nas ruas, o ministro da Educação, Abraham Weintraub, durante mais de quatro horas, era sabatinado no plenário da Câmara dos Deputados, em Brasília. Ele usou repetidamente o termo "contingenciamento" para explicar o corte de verbas para as universidades. E também responsabilizou governos anteriores pela situação atual. Observou que a Lei de Responsabilidade Fiscal obriga o governo a fazer o contingenciamento, e que o orçamento foi feito pelos governos de Dilma Rousseff e seu vice, Michel Temer. "Nós não votamos neles", afirmou.
A postura do ministro Weintraub provocou irritação e críticas. Deputados federais se revezaram para sustentar que a polêmica começou quando o próprio ministro anunciou os cortes, inspirado por suposta "balbúrdia" que estaria acontecendo em três universidades federais.
Manifestações contra cortes na educação espalham-se por 198 cidades
Protestos de professores, funcionários e estudantes da área da educação - de entidades públicas e privadas - tomaram ontem ao longo do dia as ruas de 198 cidades brasileiras. A Avenida Paulista, em São Paulo, e a Presidente Vargas, no Rio, concentraram o maior número de pessoas, cerca de 150 mil cada, segundo a organização dos atos. As Polícias Militares não informaram estimativa de público. Para além das capitais, cidades pequenas, especialmente no Nordeste e do Sul do país, registraram protestos. São localidades que receberam campus de universidades federais em projeto de regionalização do ensino superior, durante os anos de governo do PT. Brasileiros em Madri e Paris aderiram à manifestação.
Na primeira grande manifestação nacional contra o governo Bolsonaro, as ruas poderão surtir um impacto político que vai para além do sucesso ou não de impedir os cortes na área de educação, que potencializaram o protesto. Para os organizadores do ato no Rio, a mobilização é um "esquenta" para a greve geral de trabalhadores, como indica uma das faixas que se destacam em frente à Candelária: "14 de junho - Greve geral contra o fim da aposentadoria e todos os ataques de Bolsonaro".
Planejada para se opor à reforma da Previdência, a mobilização de sindicatos de trabalhadores da educação foi reforçada na última semana pelo anúncio de um corte de 30% do orçamento do Ministério da Educação, pelo governo Jair Bolsonaro. Nas ruas, o que se viu foi uma massa de estudantes, especialmente universitários e de instituições federais. Em São Paulo, eram numerosos os representantes da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), de onde vem o ministro da Educação, Abraham Weintraub. Havia faixas da Universidade Federal do ABC (UFABC), da Universidade de São Paulo (USP) e da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).
No Rio, manifestantes circulavam com adesivos "Lula Livre", em um ressurgimento do clima de campanha que dividiu o país no ano passado. "Não vai ter corte, vai ter luta", mostrava outro adesivo. Um grupo cantava: "A nossa luta é todo dia, educação não é mercadoria".
O Sindicato dos Trabalhadores do Serviço Público Federal no Estado do Rio (Sintrasef) levou à rua dez cruzes para simbolizar a morte, no governo Bolsonaro, do salário, emprego, respeito, dos concursos, da educação, dignidade, saúde, aposentadoria, justiça e habitação.
No cruzamento das avenidas Rio Branco e Presidente Vargas, no centro do Rio, havia quase uma centena de bandeiras de centrais sindicais como a Central Única dos Trabalhadores (CUT) e Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB), partidos como PT, PCdoB e PSTU e do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). Representantes das entidades estavam presentes também na capital paulista, ao lado de sindicatos locais de professores e funcionários da educação, Apeoesp e Sinpeem, e do PCO.
Pacíficos na maior parte do tempo, os atos no Rio registraram confrontos entre policiais militares e manifestantes na dispersão, à noite. O conflito começou quando um grupo jogou rojões na direção dos policiais. Um ônibus foi incendiado. "Tem muitos black blocs", avisava um agente de trânsito em uma moto aos policiais militares que acompanhavam a manifestação.
Em Brasília, cerca de 12 mil pessoas, segundo a PM, caminharam pela Esplanada dos Ministérios rumo ao Congresso Nacional. Chegaram lá pouco antes do início da audiência com o ministro Abraham Weintraub, convocado por parlamentares a depor no plenário sobre os cortes na Educação. Participaram do ato em frente ao Parlamento os deputados federais José Guimarães (PT-CE), Benedita da Silva (PT-RJ), Érika Kokay (PT-DF) e o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP).
Nas redes sociais o clima acompanhou a temperatura das ruas. Desde cedo, líderes sindicais, estudantis e políticos usaram a internet para endossar e convocar para os protestos. A hashtag #TsunamiDaEducacao chegou a ser o segundo assunto mais citado no Twitter no mundo. Nos trending topics do Brasil, o tema "educação" ocupou durante a tarde as três primeiras posições da rede social. À noite, a militância bolsonarista conseguiu colocar em primeiro lugar no país a #BrasilComWeintraub.
As pontas de lança na defesa do governo na internet foram o Movimento Brasil Livre (MBL) e deputados federais da base. A estratégia foi tentar reduzir os protestos a atos em defesa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). "A educação é a causa ou só um pretexto?", questionava uma postagem publicada no Facebook pelo MBL, ao lado de fotos de manifestantes com cartazes e faixas com os dizeres "Lula Livre".(Colaboraram Cristiane Agostine, de São Paulo, Marcelo Ribeiro, de Brasília, e Rafael Rosas, do Rio)
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