O Globo
No caso Master não houve só desequilíbrio
entre ativos e passivo. Houve crime, isso torna mais graves as pressões
políticas e jurídicas
No Banco Master houve fraude. O Banco Central comunicou a Noticia do Fato ao Ministério Público, que a entregou à Polícia Federal para investigar, como tem que ser. Há outras comunicações de crimes, que devem levar a novas investigações. Fraude é diferente de um desequilíbrio entre ativo e passivo, ou de uma sucessão de operações arriscadas. A pressão política ou jurídica para tentar reverter a liquidação só terá sucesso se o país decidir rasgar todo o manual de fiscalização e supervisão bancária, e a Justiça passar a anistiar crime financeiro. O ministro Dias Toffoli quando marca a acareação da próxima terça-feira iguala o regulador e um regulado que está sob investigação. O ministro Jhonatan de Jesus, do TCU, ao afirmar que a liquidação foi precipitada e exigir explicação comete também um absurdo, e fora de sua competência.
O Master tentou vender a um banco público, o
BRB, uma carteira de ativos inexistentes. Ela havia sido montada de forma
fraudulenta com a ajuda da Tirreno, uma empresa criada em novembro de 2024 por
um ex-funcionário e ex-sócio do Master. Os ativos foram inventados para
esconder o enorme rombo. Para se ter uma ideia, o banco tinha um patrimônio
líquido, segundo balanço de 2024, de pouco mais de R$ 4 bilhões, e essa fraude
é de R$ 12 bilhões. É aritmético. O banco estava quebrado, o balanço estava
virado, portanto tinha que ser liquidado.
Foi difícil ver exatamente o que estava
acontecendo no banco. Em novembro de 2024, a Fitch elevou a nota do Banco
Master. Elevou. A Fitch é definida como uma das Big Four, uma das quatro
maiores classificadoras de risco. O banco já estava enfrentando uma crise de
credibilidade e com dificuldade de captar. O Master se cercou de pareceres
jurídicos atestando que estava tudo certo no banco.
Para realizar seu trabalho, o BC teve que se
municiar de paciência e técnica de supervisão, fazendo uma verdadeira varredura
nos ativos do banco. Para entender detalhes desse trabalho é bom conferir as
notas taquigráficas do depoimento do presidente da instituição, Gabriel
Galípolo, na Comissão de Assuntos Econômicos do Senado em 25 de novembro. A
auditoria avançou mostrando cada vez mais irregularidades. Diante dos primeiros
indícios de crime, entre março e abril deste ano, o BC comunicou a Noticia do
Fato ao Ministério Publico. O MP achou consistente a denúncia feita pelo Banco
Central e entregou à Polícia Federal para investigar. A investigação confirmou
as suspeitas e, por isso, a Justiça iniciou o processo que levou à prisão de
Daniel Vorcaro e outros sócios.
Durante meses, o BC pediu explicações ao
Banco Master sobre as inconsistências no balanço. O Master sempre dava explicações
insuficientes. A cada novo passo da fiscalização, o BC encontrava novos
indícios de crimes. E todos foram comunicados ao MP.
Tudo começa com a notícia, em março, de que o
BRB iria comprar 58% do capital total do Master. Isso ocorre quando o Master estava
há meses em uma grave crise de credibilidade, e ficou sem liquidez. O banco
chegou a recorrer várias vezes a linhas do FGC de empréstimos emergenciais. O
que chamou mais a atenção do Banco Central é que normalmente instituição que
está com problemas de liquidez para de crescer. Vários conseguiram sair de
problemas momentâneos desta forma. Banco sem liquidez, não concede novos
empréstimos. No Master era diferente, ele continuava aumentando o total dos
supostos créditos. Isso era claramente suspeito. E por aí começou a
investigação.
O ministro Dias Toffoli aceitou o pedido da
defesa de Vorcaro e trouxe o caso para si. O argumento é que nas investigações
foi citado um deputado. O problema é que a transação imobiliária com o deputado
não foi concluída e nada tem a ver com o caso investigado. Ainda assim, Toffoli
manteve o caso em seu gabinete, decretou sigilo, e marcou para o dia 30 a
acareação entre o dono do banco Master, Daniel Vorcaro, o ex-presidente do BRB,
Paulo Henrique Costa, e o diretor de Fiscalização do Banco Central, Ailton de
Aquino. O TCU, por sua vez, deu três dias para o BC explicar a liquidação.
Quem viu as liquidações que ocorreram na
crise bancária dos anos 1990 sabe que as pressões políticas e o ataque jurídico
aos dirigentes do BC sempre acontecem. Desta vez, a pressão chegou mais forte e
mais desinibida. O país decidirá nesse caso se terá um sistema financeiro
confiável ou se vai ser legitimado o vale-tudo.

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