terça-feira, 21 de janeiro de 2025

Trump sinaliza moderação com a China no primeiro dia - Humberto Saccomandi

Valor Econômico

A posição mais branda com Pequim parece ser uma vitória do empresário Elon Musk e deve provocar um alívio nos mercados

O presidente dos EUA, Donald Trump, falou por horas na segunda-feira (20). Discursou na posse, depois se dirigiu por duas vezes a apoiadores e, por fim, respondeu a perguntas de jornalistas enquanto assinava decretos à noite. E assinou dezenas de decretos. Curiosamente, o mais importante para a economia foi o que ele não disse e não fez.

Trump ignorou os principais desafios globais e econômicos dos EUA e, principalmente, não hostilizou a China em nenhum momento ontem. Essa talvez tenha sido a indicação mais importante dada pelo novo presidente. A posição mais branda com Pequim parece ser uma vitória do empresário Elon Musk e deve provocar um alívio nos mercados.

A contrário do que havia prometido, Trump não anunciou tarifas contra produtos chineses importados no primeiro dia de governo. Em vez disso, disse que ordenou um estudo sobre práticas comerciais injustas e para saber se Pequim cumpriu as promessas comerciais feitas no seu primeiro mandato. Como se costuma dizer, quem não sabe o que fazer ou ainda não decidiu o que fazer em relação a um assunto cria um grupo de estudos. Questionado diretamente na entrevista sobre as tarifas contra a China, ele desconversou.

Trump pegou leve com a China ao longo do dia. Citou o país em seu discurso de posse apenas para falar que os chineses controlam o Canal do Panamá, o que, aliás, é incorreto. A ameaça de retomar o canal já fez o governo panamenho abrir uma auditoria sobre um operador chinês do canal, mas isso não fará ninguém perder o sono em Pequim.

Além disso, Trump repetiu várias vezes ao longo do dia que conversou recentemente com o presidente chinês Xi Jinping. Pequim enviou o vice-presidente Han Zheng para a posse, um aliado muito próximo de Xi, em um sinal de deferência.

Por fim, à noite Trump assinou o decreto que suspende temporariamente a proibição ao aplicativo chinês Tik-Tok nos EUA, o que dá tempo para que seja encontrada uma solução que evite a interrupção do serviço. O presidente não explicou porque mudou de posição em relação ao aplicativo, considerado um risco à segurança de dados de usuários americanos. Mas isso foi amplamente visto como um gesto de boa-vontade com Pequim.

Tudo isso ocorreu dias depois de o jornal “The Wall Street Journal” afirmar que Trump pretende visitar a China nos primeiros cem dias de governo.

Essa aparente moderação do tom com Pequim parece indicar que Elon Musk venceu a disputa interna na Casa Branca contra setores mais anti-China. O empresário, controlador da Tesla, tem negócios importantes na país asiático e mantém uma boa relação com o governo chinês.

Não foi apenas a China que Trump ignorou na segunda-feira (20). Ele não anunciou nenhuma sobretaxa comercial, apesar de manter as ameaças. Uma guerra comercial poderá ser prejudicial à economia americana.

O presidente praticamente não falou de temas espinhosos da economia, além de uma breve menção a reduzir a inflação recorde, o que é enganoso, já que o Índice de Preços ao Consumidor (IPC) americano fechou dezembro com alta anualizada de 2,9%, já muito perto da meta de 2% do Fed.

Houve um silêncio eloquente sobre o corte de impostos para empresas, sobre cortes de gasto público (que enfrentarão resistência no Congresso), sobre a redução do déficit do governo (que deve fechar 2024 em 6,4% do PIB, um recorde em tempos normais) e da dívida pública (que neste ano vai superar US$ 30 trilhões).

Trump também evitou falar de desafios globais importantes. Não citou a guerra na Ucrânia no discurso de posse e, quando questionado, tergiversou, mas não atacou nem Putin nem a Rússia. O presidente se vangloriou pelo acordo de cessar-fogo em Gaza, mas não tratou dos problemas de fundo do Oriente Médio, como a situação palestina e o Irã.

 

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