terça-feira, 21 de janeiro de 2025

Pare o mundo que Trump quer passar – Luiz Carlos Azedo

Correio Braziliense

Lula já tinha muitos problemas antes de Trump tomar posse, que agora ganharão outra dimensão. Ontem, na reunião ministerial, cobrou mais entregas de sua equipe

"Nada vai entrar no nosso caminho, porque nós somos americanos", disse o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, ao encerrar seu primeiro discurso após a posse. Trump não fez por menos: anunciou "uma era de ouro", reiterou seus planos expansionistas e assinou uma enxurrada de decretos para desconstruir a gestão do democrata Joe Biden, que o antecedeu, e levar adiante sua política protecionista e anti-imigração.

Sua primeira ordem executiva foi declarar emergência na fronteira entre EUA e México, o que significa a autorização do envio de militares à região. Trump não está brincando quando fala em retomar o controle do Canal do Panamá, mandar astronautas fincar a bandeira norte-americana em Marte e combater a diversidade sexual, para que os Estados Unidos voltem a ser um país "com dois gêneros: o feminino e o masculino".

Na questão ambiental, Trump anunciou que os EUA sairão do Acordo de Paris sobre o Clima, o que vai representará um boicote à COP 30, que se realizará em novembro, em Belém do Pará. Nesse campo, pretende dificultar a produção de energia eólica e intensificar a exploração do petróleo em seu território. Sua posse ofuscou e pautou os debates do Fórum Econômico Mundial, em Davos, iniciado nesta quarta-feira.

Trump fez um discurso assumidamente reacionário, para "tirar a América da escuridão", após duras referências ao governo Biden, sem citá-lo, com um tom messiânico: "Fui salvo por Deus para tornar a América ótima novamente". Prometeu expulsar "todos que entrarem de forma ilegal", mudar o nome do Golfo do México para Golfo da América e declarar cartéis mexicanos como organizações terroristas. Negacionista, anunciou que reintegrará funcionários demitidos por não tomarem vacina contra covid. Disse também que anistiará condenados pela invasão do Capitólio, em 2021.

Contraditoriamente, prometeu ser um "unificador e pacificador" em relação aos conflitos em outros continentes. Citou como exemplo o acordo de cessar-fogo entre Israel e Hamas, no qual teve realmente um papel decisivo. Entretanto, sua política protecionista pode representar uma grande ameaça à institucionalidade da economia mundial, que é fruto de um longo processo de negociações e acordos multilaterais. Essa política de Trump está em sintonia com os magnatas norte-americanos da tecnologia, entre os quais Elon Musk, dono da Tesla e do Twitter, que assumiu a tarefa de enxugar e modernizar o Estado norte-americano.

A política de Trump torna absoluta a liberdade de expressão, com a desregulamentação das mídias sociais, a pretexto de restaurar "a justiça justa, igualitária e imparcial sob o Estado constitucional de direito". Na verdade, é um "liberou geral" para a xenofobia, a homofobia, o machismo e o racismo. O novo presidente dos Estados Unidos é um supremacista branco e defende um tipo de patriotismo que atribui aos norte-americanos a liderança mundial como destino.

Barbas de molho

Na posse de Trump, porém, esse papel foi traduzido pela presença das principais lideranças de extrema-direita da política mundial: Javier Milei, da Argentina; Giorgia Meloni, da Itália; e Viktor Orbán, da Hungria. Ultraconservadores europeus, como Tino Chrupalla, do Alternativa para a Alemanha (AfD); o espanhol Santiago Abascal, do VOX; e o ultraliberal britânico anti-União Europeia Nigel Farage também estavam em Washington. O ex-presidente Jair Bolsonaro, impedido de viajar por uma decisão do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), se fez representar pela esposa, Michelle, e pelo deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP), seu filho.

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva não foi convidado para a posse. Na reunião ministerial desta segunda-feira, pôs as barbas de molho e disse que "não quer briga" com o novo presidente norte-americano. "O Trump foi eleito para governar os EUA e eu, como presidente do Brasil, torço para que ele faça uma gestão profícua, para que o povo americano melhore e para que os americanos continuem a ser o parceiro histórico que é do Brasil", declarou. A embaixadora do Brasil em Washington, Maria Luiza Viotti, representou o governo brasileiro.

A volta de Trump à Casa Branca deixou eufórica a oposição no Brasil. O presidente do PP, senador Ciro Nogueira (PI), avalia que sua posse coincide com uma mudança na correlação de forças por aqui, que deixa o governo mais enfraquecido. O governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (PR), postou um vídeo em suas redes sociais usando um boné com o slogan de Trump, Make América great again. Quem mais comemora é o ex-presidente Bolsonaro, que redobrou suas esperanças de concorrer à Presidência em 2026, mesmo estando inelegível.

A posse Trump inicia um novo ciclo para aquela economia mundial, cujas consequências ainda são imponderáveis. Instituições como a OMC (Organização Mundial do Comércio), o FMI (Fundo Monetário Internacional) e os organismos multilaterais, que são fundamentais para os países emergentes como o Brasil, tendem a ser tutelados ou ignorados por Trump.

Lula já tinha muitos problemas antes de Trump tomar posse, que agora ganharão outra dimensão. Nesta segunda-feira, na reunião ministerial, quando cobrou mais entregas de sua equipe, disse que as eleições de 2026 já começaram. Seu maior problema não é a conexão entre Trump e a oposição, são a inflação e a política fiscal, que se retroalimentam e geram desconfiança do mercado e na população, como ficou evidente na crise do Pix.

 

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