“Tratemos agora do outro
aspecto da questão, isto é, vejamos o que ocorre quando um cidadão torna-se
príncipe de sua pátria, não por meio de crime ou de outra intolerável
violência, mas com a ajuda dos seus compatriotas. O principado assim
constituído podemo-lo chamar civil, e para alguém chegar a governá-lo não
precisa de ter ou exclusivamente virtude [virtù] ou exclusivamente fortuna,
mas, antes, uma astúcia afortunada. Pois bem, a ajuda nesse caso é prestada
pelo povo ou pelos próceres locais. É que em qualquer cidade se encontram estas
duas forças contrárias, uma das quais provém de não desejar o povo ser dominado
nem oprimido pelos grandes, e a outra de quererem os grandes dominar e oprimir
o povo. Destas tendências opostas surge nas cidades, ou o principado ou a
liberdade ou a anarquia.
O principado origina-se da
vontade do povo ou da dos grandes, conforme a oportunidade se apresente a uma
ou a outra dessas duas categorias de indivíduos: os grandes, certos de não
poderem resistir ao povo, começam a dar força a um de seus pares, fazem-no
príncipe, para à sombra dele terem ensejo de dar largas aos seus apetites; o
povo, por sua vez, vendo que não pode fazer frente aos grandes, procede pela
mesma forma em relação a um deles para que esse o proteja com a sua autoridade”
*Nicolau Maquiavel
(1469-1527) filósofo, historiador, poeta, diplomata e músico de origem
florentina do Renascimento. É reconhecido como fundador do pensamento e da
ciência política. O Principe (1515), Capitulo lX, p. 45. Editora Martins
Afonso, 2014.
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