Valor Econômico
Trabalho de bastidor continua para retomar
diálogo com a Casa Branca antes de sanção de 50%
Enquanto Donald Trump não der sinal claro aos
negociadores sobre o que fazer com o Brasil, o governo brasileiro continuará
trabalhando nos bastidores para retomar diálogo sobre as tarifas.
Essa é a mensagem que o Itamaraty vem dando,
com o ministro Mauro Vieira em Nova York pronto para ir a Washington para
tentar atenuar os estragos da imposição da chamada 'Tarifa Bolsonaro''.
O governo brasileiro aciona vários canais,
oficiais, com interlocutores com acesso à Casa Branca, empresariado, etc. Tudo
nos bastidores, sem revelar nomes e pistas que a esta altura só atrapalhariam,
notam observadores.
Tem havido muita conversa sobre um possível
telefonema entre os presidentes Donald Trump e Luiz Inácio Lula da Silva.
Mas primeiro falta uma reação da Casa Branca se efetivamente quer retomar a negociação, na visão brasileira. O trabalho de bastidor é para ter essa reação, que continua sem vir.
Lula e Trump já deram declarações de que
podem falar em algum momento. Mas, como nota uma importante fonte, esse tipo de
contato entre presidentes não se improvisa, requer costuras prévias, mais ainda
na atual crise e com esse interlocutor na Casa Branca que já destratou mais de
um chefe de Estado desde que assumiu, em janeiro.
O Palácio do Planalto trabalha com o cenário
de implementação por Donald Trump da ''Tarifa Bolsonaro'' de 50% sobre produtos
brasileiros a partir de 1 de agosto.
Como já escrevemos, o que continua não claro
no governo é se a sanção será imposta a todo o universo tarifário, ou se alguns
produtos brasileiros serão excluidos como resultado de gestões de certos
importadores americanos.
Tarifa de 50% sobre suco de laranja ou café
brasileiro só vai elevar o custo do café da manhã do americano, e causar mais
irritação no eleitorado mesmo trumpista.
Por esse cenário de sanção contra o Brasil,
que pode começar na sexta-feira, a tensão bilateral continuará alta pelo menos
até a eleição presidencial do ano que vem.
De seu lado, Pedro de Camargo Neto, um dos
principais especialistas brasileiros do agronegócio, escreve sobre a
reviravolta nos EUA e como isso chega à sanção contra o Brasil.
Ele destaca a cláusula de Nação Mais
Favorecida, princípio básico do comercio internacional implantado em 1947 pelo
GATT (Acordo Geral sobre Tarifas e Comercio), uma das muitas instituições
multilaterais impulsionadas no pós segunda guerra pelo grande vencedor, os EUA.
Por ela, os países signatários se comprometem a impor a mesma tarifa para
todos, não discriminando.
Além deste princípio, nota Pedro de Camargo
Neto, os países garantiram barreiras somente através de tarifas a não serem
ultrapassadas, consolidadas a níveis máximos. Evoluiu institucionalmente em
1995 para a OMC (Organização Mundial de Comércio), incorporando acordos sobre
serviços e propriedade intelectual, avançando em subsídios e comércio agrícola,
e fortalecendo um mecanismo de solução de controvérsias, sempre sob a liderança
e pressão dos norte-americanos.
Em dezembro de 2001, a acessão da China na
OMC foi aprovada em condições extremamente facilitadas, pois aceita como sendo
uma economia de mercado e país em desenvolvimento. Novamente sob a liderança
norte-americana. Com pouco mais dez anos de comércio da China na OMC, ficou
claro que seriam necessários ajustes. Dessa vez, porém, os EUA se mostraram
frustrados, optando para tentar equacionar suas diferenças com a China de
maneira bilateral.
Pedro de Camargo Neto observa que, agora, o
segundo mandato de Donald Trump trouxe o abandono de todo o arcabouço de regras
de comércio internacional. Reestruturações das estruturas produtivas construída
com essas regras serão necessárias. É o que chama de um novo mundo longe de um
pensamento econômico que perdurou quase um século.
A lógica, ou falta dela, do estilo negociador
de Trump ainda está para ser provada, nota ele. Sobrou ao Brasil a posição de
pais com a maior ameaça de tarifa, pois 50%. O argumento de equilíbrio
comercial utilizado por Trump é inválido, já o Brasil importa mais do que
exporta do EUA. A ameaça veio acrescida de manifestações sobre ações do Poder
Judiciário, descabidas em afronta a soberania da Nação. Acrescentaram pressões
sobre interferências nas plataformas digitais, tema em processo de evolução no
tipo de ação coletiva necessária para evitar excessos individuais.
‘’O caso brasileiro ficou fora do padrão
utilizado aos demais países, obrigando a iniciaram investigação comercial
construindo eventual arcabouço jurídico’’, acrescenta. Para ele, posicionar o
Brasil nesse novo momento geopolítico é o desafio que se apresenta. ‘É preciso
reconhecer a mudança construindo posicionamentos visando o desenvolvimento
nacional. Alianças e parceiros estratégicos precisam ser identificados’’.
Acordos vem sendo realizados país por país.
‘Estariam todos sucumbindo as ameaças da imprevisível liderança
norte-americana? Ou negociando seus interesses diante do novo quadro ainda
distante da compreensão de quem é o vencedor. A união interna precisa ser
valorizada na defesa e construção do nosso futuro. Não é o que acontece’,
conclui ele.
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