Folha de S. Paulo
Quase metade do valor das
vendas para os EUA ficou isenta de tarifa extra
O governo do Brasil não
tinha armas para enfrentar o ataque de Donald Trump. O
conflito está aberto e vai longe. O governo americano vai tentar satisfazer
interesses de empresas, como big techs, tem lista grande e antiga de queixas
comerciais e regulatórias contra o Brasil e, enfim, quer
vassalagem de outros países, para nem mencionar o apoio aos Bolsonaro e
seus golpes.
No entanto, como a primeira
surtida americana ficou relativamente barata e como Lula não
baixou a crista, o governo pode cantar vitória parcial e provisória.
Metade do valor das exportações do Brasil para os EUA parece ter ficado isenta de imposto extra, cálculo inicial —em vez de tarifa de 50% a média seria próxima de 30%. A lista de isenções parece atender a interesses específicos de empresas americanas, como tem ocorrido em concessões de Trump na guerra com outros países.
Na propaganda política, Lula
pode se vangloriar de êxito maior. Como diz o clichê popular sarcástico,
espera-se que tal "fracasso não suba à cabeça". Isso é, que o êxito
momentâneo não prejudique a prudência e o planejamento de estratégias de curto
a longo prazo.
Na verdade, espera-se que o
governo se prepare para problemas sérios adiante.
O governo não estava
preparado. Não tinha informações precisas, de "inteligência", a
respeito da conspiração de Eduardo
Bolsonaro (se tinha, as ignorou). Não tinha interlocutor no mundo de
Trump. Não se preparou para o risco de levar pancadas em um mundo em que todos
apanham, vide
a rendição da União Europeia, e em que a desordem política e econômica
aumenta de modo acelerado faz uma década.
O governo parecia não pensar
que seus atos ou conversa mole ideológica na política internacional pudessem
ter consequências daninhas; tal política não demonstra quais vantagens
tangíveis, práticas, pretende obter. O Brasil brincava no palanque.
Mas, por ora, a
lista de sanções parou em Alexandre de Moraes e, em termos comerciais,
foi surpreendentemente menos daninha do que se imaginava.
Nos seus decretos, Trump de
fato colocou o Brasil no grupo de países que ameaçam direitos humanos, eleições
livres, empresas e política externa dos EUA. Seus secretários de Estado e
Tesouro fizeram mais ameaças. Trump confirmou que o Brasil é alvo preferencial
de sua guerra econômica, não importando que seus motivos sejam também ou
principalmente políticos, da proteção a golpistas às tentativas de podar a
política externa brasileira, na base do porrete.
Isso posto, a sanção
comercial pareceu quase um assopro depois de tanta ameaça de tiro, pancada e
bomba.
A lista de bens que ficaram
isentos do imposto extra de 40 pontos percentuais parece abarcar metade do
valor das exportações para os Estados
Unidos. São um alívio relativo para setores que destinam a maior parte de
suas vendas para o mercado americano, como partes da indústria. Aeronaves,
celulose, combustíveis e petróleo, suco de laranja, siderurgia e metalurgia,
máquinas e equipamentos escaparam. Armas,
café, frutas, certos plásticos, cerâmicas, parte das madeiras, não.
O Brasil negocia agora
benefícios para big techs e data centers gringos. O
Itamaraty parece ter um canal com Marco Rubio. Ok, mas é circunstancial. A
política externa terá de mudar; o país terá de pensar que está sujeito a ação
de uma gangue política e seus partidos, liderada pelos Bolsonaro, uma ameaça à
democracia, a soberania e à paz doméstica.
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