quinta-feira, 31 de julho de 2025

Trump bate, mantém ameaça política grave e assopra, mas Lula faz pontos - Vinicius Torres Freire

Folha de S. Paulo

Quase metade do valor das vendas para os EUA ficou isenta de tarifa extra

O governo do Brasil não tinha armas para enfrentar o ataque de Donald TrumpO conflito está aberto e vai longe. O governo americano vai tentar satisfazer interesses de empresas, como big techs, tem lista grande e antiga de queixas comerciais e regulatórias contra o Brasil e, enfim, quer vassalagem de outros países, para nem mencionar o apoio aos Bolsonaro e seus golpes.

No entanto, como a primeira surtida americana ficou relativamente barata e como Lula não baixou a crista, o governo pode cantar vitória parcial e provisória.

Metade do valor das exportações do Brasil para os EUA parece ter ficado isenta de imposto extra, cálculo inicial —em vez de tarifa de 50% a média seria próxima de 30%. A lista de isenções parece atender a interesses específicos de empresas americanas, como tem ocorrido em concessões de Trump na guerra com outros países.

Na propaganda política, Lula pode se vangloriar de êxito maior. Como diz o clichê popular sarcástico, espera-se que tal "fracasso não suba à cabeça". Isso é, que o êxito momentâneo não prejudique a prudência e o planejamento de estratégias de curto a longo prazo.

Na verdade, espera-se que o governo se prepare para problemas sérios adiante.

O governo não estava preparado. Não tinha informações precisas, de "inteligência", a respeito da conspiração de Eduardo Bolsonaro (se tinha, as ignorou). Não tinha interlocutor no mundo de Trump. Não se preparou para o risco de levar pancadas em um mundo em que todos apanham, vide a rendição da União Europeia, e em que a desordem política e econômica aumenta de modo acelerado faz uma década.

O governo parecia não pensar que seus atos ou conversa mole ideológica na política internacional pudessem ter consequências daninhas; tal política não demonstra quais vantagens tangíveis, práticas, pretende obter. O Brasil brincava no palanque.

Mas, por ora, a lista de sanções parou em Alexandre de Moraes e, em termos comerciais, foi surpreendentemente menos daninha do que se imaginava.

Nos seus decretos, Trump de fato colocou o Brasil no grupo de países que ameaçam direitos humanos, eleições livres, empresas e política externa dos EUA. Seus secretários de Estado e Tesouro fizeram mais ameaças. Trump confirmou que o Brasil é alvo preferencial de sua guerra econômica, não importando que seus motivos sejam também ou principalmente políticos, da proteção a golpistas às tentativas de podar a política externa brasileira, na base do porrete.

Isso posto, a sanção comercial pareceu quase um assopro depois de tanta ameaça de tiro, pancada e bomba.

A lista de bens que ficaram isentos do imposto extra de 40 pontos percentuais parece abarcar metade do valor das exportações para os Estados Unidos. São um alívio relativo para setores que destinam a maior parte de suas vendas para o mercado americano, como partes da indústria. Aeronaves, celulose, combustíveis e petróleo, suco de laranja, siderurgia e metalurgia, máquinas e equipamentos escaparam. Armas, café, frutas, certos plásticos, cerâmicas, parte das madeiras, não.

O Brasil negocia agora benefícios para big techs e data centers gringos. O Itamaraty parece ter um canal com Marco Rubio. Ok, mas é circunstancial. A política externa terá de mudar; o país terá de pensar que está sujeito a ação de uma gangue política e seus partidos, liderada pelos Bolsonaro, uma ameaça à democracia, a soberania e à paz doméstica.

 

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