Valor Econômico
Presidente americano intensifica pressão
contra a cúpula do clima; para enfrentá-lo, a política ambiental terá que
aprender, com Mamdani, a ouvir as pessoas antes de tentar convencê-las
Donald Trump não será o único ausente da
COP30, que terá sua largada nesta quinta com a cúpula dos líderes em Belém, mas
caminha para ser aquele do qual mais se falará pelas costas. Não exatamente
pelo anfitrião, que acabou de conseguir seu celular, mas pelos demais. Além de
não enviar representantes, o governo americano estaria a pressionar delegados
de outros países a também abandonar o acordo de Paris, que fixou as metas de
mitigação do aquecimento global.
Nesta quarta, a economista francesa Laurence Tubiana, enviada especial da União Europeia para a COP30 e mentora do acordo de Paris, confirmou a Victoria Netto, do Valor, a postura agressiva do governo americano sobre negociadores para que abandonem a ideia do financiamento climático.
Na semana passada, Trump conseguiu uma adesão
importante à sua pregação, Bill Gates, fundador da Microsoft e militante da
causa ambiental, na qual investiu tempo, bilhões de dólares e até um livro
(“Como evitar um desastre climático”, Cia das Letras, 2021). Em outros anos,
Gates participou da COP. Neste ano, preferiu mandar uma carta dizendo que os
fundos climáticos não estavam sendo bem geridos, que as metas não eram uma boa
métrica de bem-estar. Propôs redirecionar os recursos para vacinas e redução da
pobreza.
De pronto, Trump celebrou em sua rede social:
“Acabamos de ganhar a guerra na farsa da mudança climática. Bill Gates
finalmente admitiu que ele estava completamente errado nesta matéria. Foi
corajoso de sua parte e por isso estamos agradecidos. MAGA!”.
O bilionário americano se reaproximou de
Trump depois de uma longa e mútua hostilidade e é um dos mais vocais
representantes da indústria de tecnologia de ponta que, altamente intensiva em
energia, é, também, uma das mais visadas pela proposta de uma taxa global para
o financiamento climático. Com este movimento, demonstra a intenção do setor de
fazer o negacionismo climático sobreviver ao trumpismo para que nenhuma conta
lhe venha a ser apresentada.
A meta de U$ 1,3 trilhão para o financiamento
climático dos países em desenvolvimento, lançado pela COP30, é o sonho de uma
noite de verão na Baía do Guarajá. Espera contar com contribuições de grandes
empresas. Na condição de porta-voz, Gates deixou claro que devem bater em outra
freguesia.
É bem verdade que o clima do planeta não
depende apenas dos EUA. Tome-se a Noruega como exemplo do que se passa na
Europa, continente vanguarda do ambientalismo mundial. Maior doadora do Fundo
Amazônia, a Noruega tem mais de 90% de sua frota composta de carros elétricos.
Por outro lado, é um dos maiores exportadores mundiais de petróleo que entra na
conta da emissão de carbono do país que o consome e não da daquele que o
produz.
China e Índia, com as duas maiores populações
do planeta, são as maiores consumidoras de carvão. Seus chefes de Estado não
estão em Belém, mas enviaram robustas delegações. Nenhuma delas é capaz de
negar que toda a redução do uso do carvão no resto do mundo, especialmente nos
EUA e na União Europeia, é compensado por seu aumento naqueles países. E,
finalmente, o Brasil, que tem na transição energética seu melhor figurino internacional,
também recepciona os participantes com muitas contas a prestar, inclusive na
Foz do Amazonas.
Por mais pecadores que a cúpula abrigue,
porém, é natural que a cobrança maior recaia sobre Trump e seu poder de
influência sobre bilionários americanos. Nesta terça, seu país ofereceu um
exemplo de como lidar com ambos: Zohran Mamdani, 34 anos, deputado estadual
pelo Queens, eleito prefeito de Nova York.
O tom desafiante do discurso de posse - “Sou
jovem, apesar de meus melhores esforços para ficar mais velho, muçulmano,
democrata socialista e, pior que tudo, me recuso a me desculpar por tudo isso”
- contrasta com um sorriso que rasga o rosto.
Se Nova York não representa os EUA ou a
capacidade de regeneração dos democratas, dirá o resto do mundo, mas a campanha
de Mamdani mostrou como a política pode retomar a capacidade de reengajar se
tiver foco. O dele mirou em três propostas práticas, congelamento de aluguéis,
tarifa zero e universalização de creche.
Fez promessas de difícil execução, como de um
imposto adicional sobre rendas superiores a US$ 1 milhão. À medida que a
eleição se aproximava, a elite econômica da cidade que pariu Trump o procurou.
Abriu-se para conversas, sem abrir mão, por exemplo, de chamar a guerra em Gaza
de genocida, o que acabou por afastar, pelo menos, um deles, Michael Bloomberg,
hoje na COP30. Ao longo do dia, empresários ouvidos pelo FT o elogiaram na
expectativa das indicações que fará para as agências municipais.
O viés etário foi mais determinante que o de
renda. Ganhou com 50,5% dos votos, mas teve a adesão de 81% das mulheres e 65%
dos homens abaixo de 30 anos. Colocou na equipe de transição, só de mulheres,
Lina Khan, 36 anos. Chefe da agência antitruste de Joe Biden, foi cortada de
cara pelos embates com “big techs”.
Mamdani não fez campanha na internet, mas na
rua. Não falou de desigualdade, mas da capacidade de fechar as contas. A lição
não vem da agenda ambiental, tímida até. Vem da capacidade de ouvir as pessoas
antes de convencê-las, como contou seu estrategista, Andrew Epstein - na mão
contrária da política tradicional, a começar pela ambiental.

Nenhum comentário:
Postar um comentário