O Globo
O BC manteve a Selic, apesar da queda da
inflação. No governo, os números mostram a queda do déficit primário em relação
às antigas administrações
O Banco Central manteve os juros na estratosférica taxa de 15% e alertou que o cenário atual exige “cautela na condução da política monetária”. O Copom tem razão porque a estimativa de inflação está acima do teto da meta e a projeção é de que o índice ficará acima do centro da meta até 2028. O ministro Fernando Haddad disse que votaria para o corte dos juros e também tem razão porque a inflação e as projeções de mercado estão caindo. Há bancos grandes prevendo que o índice ficará dentro do intervalo de flutuação este ano, contudo, o mandato do BC é levar o IPCA para o centro, ou seja, 3%. Essa diferença de opinião entre Haddad e o Banco Central tem a vantagem de mostrar a independência da instituição e elevar a confiança do mercado na política monetária.
A grande questão em debate é a percepção dos
agentes econômicos de que a administração Lula tem conduzido uma política
fiscal expansionista. Os integrantes do governo negam. Afirmam que o déficit
está caindo se olharmos as estatísticas do resultado primário acumulado nos
últimos três governos. E apontam os seguintes dados: o déficit no governo Dilma
por essa conta – resultado primário acumulado e dividido pelo PIB nominal –
teria sido de 1,94%. O de Temer teria sido de 2,09%, o de Bolsonaro, de janeiro
de 2019 a dezembro de 2022, foi de 2,43%. O atual é de 1,16% e terminará o
mandato em 0,9%.
O Tesouro avalia que este é um ajuste
“brutal”, pois saiu de 2,5% do PIB e ficará abaixo de 1%. Argumenta também que
o déficit do governo Lula inclui precatórios não pagos pela gestão Bolsonaro e
que foram quitados na atual administração.
Um grande ponto de dúvida é o gasto não
incluído na contabilidade para efeito de verificação do cumprimento da meta.
Técnicos do governo explicam que nessa conta estão todas as despesas, mesmo
aquelas que não entram na conta da meta. Eles defendem esse extra teto com o
argumento de que é gasto não previsto, como o do socorro ao Rio Grande do
Sul no ano passado, ou o programa de ajuda às empresas atingidas pelo
tarifaço de Trump este ano. Na verdade, há outras despesas subindo no telhado.
Agora mesmo, o Congresso aprovou a autorização para que, durante seis anos, o
executivo gaste R$ 5 bilhões anuais com investimentos nas Forças Armadas fora
do teto. Serão no final R$ 30 bilhões. O
GLOBO fez uma conta recentemente mostrando que, ao todo, durante essa
administração, serão R$ 150 bilhões fora do teto.
Mesmo não contabilizado na meta, o gasto
entra na dívida pública. O grande problema é a dinâmica de crescimento da
dívida dizem os analistas, com razão. As contas do governo são de que o país
pode estabilizar a dívida em 84% do PIB em 2029, se passar a ter superávits. Os
economistas oficiais admitem que o melhor é estabilizar antes e num patamar
menor, mas há uma questão que, na visão deles, “mascara” o ajuste fiscal feito
em cada administração.
Houve queda forte dos juros no governo Temer.
Na pandemia, a Selic foi levada para o nível artificial de 2%. Artificial
porque a inflação estava subindo. É muito mais fácil reduzir ou estabilizar a
dívida com juros assim do que com a taxa de 15%. Mas a Selic não pode ser
reduzida com o objetivo de conter a dívida. O mandato do Banco Central é
perseguir a meta de inflação. Ocorre que, se os juros ficarem desnecessariamente
altos, o custo na dívida será impagável.
Alguns economistas costumam apresentar as
contas públicas como se o Brasil estivesse à beira do colapso fiscal. E o
governo argumenta que os números mostram uma queda do déficit primário, apesar
de a dívida permanecer alta demais e crescente.
O problema é que a despesa do Brasil é toda
engessada, indexada e vinculada. Não é fácil reduzir gastos. O governo Lula
retornou com a política de aumento real do salário mínimo antes de desvincular
as despesas previdenciárias do salário mínimo. Isso faz aposentado e
desempregado ter aumento real, quando o objetivo era manter o valor desses
benefícios, sem correção acima da inflação.
O maior de todos os problemas é a conta
exagerada e crescente de subsídios, isenções e deduções, as chamadas renúncias
fiscais. Cada lobby defende o seu incentivo, mesmo que seja ineficiente, e o
parlamento cria outros, mesmo os mais irracionais. O Congresso acaba de decidir
manter, até 2040, o subsídio ao carvão que deveria ter terminado em 2022. As
contas públicas não estão bem, mas tudo é mais complicado do que tem sido
descrito em certas análises.

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