quinta-feira, 6 de novembro de 2025

Potência econômica e país desenvolvido, por Marcello Averbug

Correio Braziliense

Ao longo dos últimos anos ampliou-se a ambição de atingir o status de potência econômica em detrimento do anseio pelo desenvolvimento integrado

Após a Segunda Guerra Mundial, mudou a maneira de interpretar os antes chamados países economicamente atrasados. Até 1945, predominava a ideia de que alguns deles iriam progredir espontaneamente graças ao adequado aproveitamento, via mercado, de suas vocações naturais e vantagens comparativas.

Ao final da guerra, ganhou força a convicção de que a fuga da condição de atrasado ou pobre, sob o regime capitalista, exigia algo mais incisivo: a execução de intensas políticas governamentais. Esse seria o caminho que conduziria ao progresso e a profundas melhorias nos indicadores sociais. O processo que atendesse a tais requisitos foi denominado como desenvolvimento integrado.

Passou a ser discutida, então, a diferença entre crescimento, onde há aumento do PIB sem alterações relevantes no perfil da sociedade, e desenvolvimento, onde o incremento do PIB é acompanhado por mudanças estruturais que ramificam a prosperidade pelos diversos segmentos da sociedade e regiões do país.

Durante os anos 1960, o debate sobre desenvolvimento versus crescimento foi sepultado, abatido pelo consenso de que o que interessa mesmo é o desenvolvimento. Porém, os atuais comportamentos de parte dos chamados países emergentes e do resto do mundo revelam a possibilidade de surgimento de um novo estilo de debate. Isto é, ao longo dos últimos anos ampliou-se a ambição de atingir o status de potência econômica em detrimento do anseio pelo desenvolvimento integrado.

Sob esse prisma, o mais importante seria brilhar no cenário internacional através do tamanho absoluto da economia, menosprezando-se o panorama verificado no visual da qualidade de vida das diversas classes sociais.

Esse enfoque induz à seguinte pergunta: qual é a vantagem em figurar entre as maiores economias do mundo? Como resposta, pode-se afirmar que ser potência econômica não garante a existência de satisfatória equidade social, mediante a qual o nível de bem-estar da população não apresente discrepâncias radicais.

Os Estados Unidos são o melhor exemplo de nação que atingiu, concomitantemente, a condição de desenvolvido e de potência econômica. Porém, isso não significa que destino semelhante esteja reservado aos países hoje batalhando pela sua prosperidade.

Por exemplo: na Índia, por mais que a economia aumente de porte, são remotas as chances de haver substancial redução em seus enraizados desequilíbrios sociais e regionais e de rompimento de estratificações de várias naturezas. A China já é uma potência econômica, mas encontra-se longe de ser classificada como desenvolvida.

Em face da abundância territorial, populacional e de recursos naturais, as possibilidades do Brasil caminhar em direção ao desenvolvimento integrado são substanciais, inclusive pelo fato de ser uma nação não engessada por tabus medievais, com elevado índice de urbanização e detentora de mobilidade social superior à da maioria dos emergentes. Porém, nosso país corre o risco de satisfazer-se com a honra de subir ao pódio das economias de maior porte, a despeito de abrigar contrastes acentuados no padrão de vida de seus habitantes.

Contrastando com o que foi exposto anteriormente neste artigo e a título de provocação, vale a pena considerar também mais uma alternativa conceitual, pela qual a definição pós-guerra de desenvolvimento integrado seria interpretada como utópica.

Em outras palavras: aceitar que cada nação tenha o direito de seguir os próprios parâmetros para definir seu grau de satisfação com a realidade nacional, independentemente dos indicadores de desenvolvimento consagrados internacionalmente. Mesmo porque em alguns países a imposição desses indicadores pode até ser interpretada como agressão às suas tradições. Sob a ótica dessa alternativa teríamos que admitir o ostracismo de parte dos atuais símbolos de desenvolvimento e, assim, conviver com a heterogeneidade entre os perfis sociais, econômicos, políticos e culturais das nações tidas como bem-sucedidas.

Seria oportuno haver uma reflexão da comunidade mundial sobre qual das alternativas descritas merece ser classificada como desejável.

 

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