Foi-se embora do Supremo Tribunal Federal o ministro Carlos Ayres Britto.
Ocupou a presidência da Casa por apenas sete meses e presidiu o maior
julgamento de sua História, engrandecendo a Corte e o país. Sua maestria esteve
na habilidade com que costurou em silêncio vaidades, conflitos e manobras. Em
2003, quando Lula nomeou-o para a Corte, para os leigos sua biografia
resumia-se a um viés regionalista e pitoresco: era sergipano e poeta. Depois,
soube-se que era também vegetariano. Antes de assumir a presidência do
tribunal, ele fixou outra característica: seus votos indicavam um jurista
convicto de que a Constituição tem um espírito. Num país onde a Carta é emendada
como se fosse uma lista de compras, acreditar que há nela um indicador da alma
da sociedade foi a maior das suas contribuições. Com esse entendimento, matou a
Lei de Imprensa da ditadura com tamanho vigor que até hoje o Judiciário não
digeriu direito seu voto.
Presidindo o julgamento do mensalão, deu um exemplo aos costumes nacionais
mostrando que na política brasileira há espaço para a suavidade. Nunca elevou a
voz, jamais acrescentou arestas a debates crispados. Num tribunal que passara pela
presidência alegórica de Gilmar Mendes e pela irritadiça de Cezar Peluso, ele
descalçava as meias sem tirar os sapatos. Britto aposentou-se dias depois da
morte do mestre-sala Delegado, da Mangueira, outro campeão da suavidade. Na
política, ecoou a serenidade de Tancredo Neves e Fernando Henrique Cardoso,
dois mágicos, capazes de fazer com que as crises entrassem grandes e
barulhentas em seus gabinetes e saíssem menores, em surdina.
De bem com a própria vida, Carlos Ayres Britto melhorou a dos outros.
Papai Noel. O doutor Vinicius Couto, presidente da Associação dos Servidores do Superior
Tribunal de Justiça, avisa:
"Informamos aos associados e demais servidores que foi deferido no
Conselho de Administração, nesta manhã, e por unanimidade, requerimento da
ASSTJ solicitando que o feriado natalino e de final de ano fosse instituído
para o período de 20 de dezembro a 6 de janeiro, conforme preceitua o inciso I
do art. 62 da lei 5.010 de 20 de maio de 1996".
O STJ intitula-se "Tribunal da Cidadania", mas só seus
cidadãos-servidores usufruem esse presente.
Isso dá cadeia. Uma parte do empresariado brasileiro está assustada com as sentenças do STF
que mandaram para a cadeia diretores de bancos e de agências de publicidade.
Entendem que a jurisprudência aplicada no caso das teias do mensalão cria um
clima de insegurança para seus executivos.
Os doutores poderiam passar os olhos num manual oferecido na semana passada
pelo governo americano às empresas que operam no exterior. Chama-se "A resource guide to the U.S. foreign
corrupt practices act". Ele ensina as empresas a tomarem cuidado
com contratos de consultoria, com pagamentos feitos em contas existentes em
terceiros países e com mimos em geral. Mostra o risco que um empresário corre
quando prefere não saber o que há por baixo do negócio.
O manual avisa que cada propina pode custar à empresa uma multa de até US$ 2
milhões. Diretores e funcionários arriscam canas de até 20 anos.
Feriadão. Para quem foi apanhado desprevenido no feriadão e gostaria de perder tempo
com um grande livro. Está na rede "The last Lion" ("O último
Leão - O defensor do reino", por US$ 19,99). É a biografia de Winston
Churchill, do historiador americano William Manchester. Vai de 1940, quando o
Leão assumiu o governo da Inglaterra, até 1965, quando morreu.
Manchester foi-se em 2004 e escreveu só uma parte do livro. A obra foi
terminada, a seu pedido, pelo jornalista Paul Reid, que se baseou no seu
roteiro e nas notas que deixou. No papel, é um cartapácio de 1.232 páginas, mas
ninguém precisa se assustar. O primeiro capítulo, "O Leão caçado",
com umas 120 páginas, é um magnífico retrato de Churchill, com sua obstinação,
seus hábitos, charutos e bebidas. Entornava champanhe, conhaque e uísque, mas
não chegava ao porre. Egocêntrico, não dava ordens verbais, tudo por escrito,
para que ninguém pudesse falar em seu nome. Detalhista, mandou que se cuidasse
dos bichos do zoológico, porque as bombas alemãs podiam soltá-los. Era cruel
("eu não desejo mal a Stanley Baldwin" - que ocupou o cargo de primeiro-ministro
-, "mas teria sido melhor se ele não tivesse existido") e antiquado,
dizia "Pérsia", jamais Irã, e, quando passaram a chamar a capital da
Turquia de Ancara, insistia em dizer Angorá, pois não mudaria a designação dos
gatos. Detestou "Cidadão Kane" e, depois que Frank Sinatra pegou em
sua mão para festejá-lo, perguntou: "Quem é esse sujeito?"
Depois desse esplêndido retrato, sobra o gigante na Segunda Guerra, mas isso
pode ficar para outro dia.
Os tablets do comissário Mercadante. O governo da Índia anunciou que distribuirá milhões de tabuletas Aakash para
estudantes ao preço de US$ 21 por unidade. Trata-se de uma venda subsidiada,
pois no mercado as peças custam até US$ 80.
Grande notícia para quem achava que não se conseguiria produzir computadores
por menos de US$ 100. É verdade que essas tabuletas não podem ser chamadas de
computadores, mas dão para o gasto dos projetos pedagógicos a que pretendem
atender.
No Brasil, está em curso a seguinte gracinha: em fevereiro passado, o
comissário Aloizio Mercadante anunciou que a Viúva compraria até 600 mil
tablets para serem entregues a professores do ensino médio. O que eles fariam
com os equipamentos, não se sabe, pois não havia projeto pedagógico para
acompanhá-los. Nove meses depois, a Boa Senhora já comprometeu R$ 115 milhões
para a compra de 380 mil tabuletas.
Eremildo, o idiota, fez a conta: cada uma sairá por R$ 302, ou US$ 150. Essa
compra resulta de um pregão vencido por fornecedores que ofereceram quatro
modelos, indo de R$ 277 a R$ 462. Tomando-se o preço do mercado indiano (US$
80) e o mais baixo do pregão nacional (US$ 138), o cretino operou o Milagre de
Simonsen. Brilhante economista e ministro da Fazenda de 1974 a 1979, Mario
Henrique Simonsen enunciou uma lei segundo a qual, em certos casos, é preferível
pagar a comissão para que se esqueça o projeto. Sem julgar o que houve na
compra dos tablets, o cretino propõe o seguinte: reservam-se 10% dos R$ 115
milhões para despesas imprevistas. Sobram R$ 103,5 milhões, e gasta-se esse
dinheiro comprando 647 mil tabuletas de US$ 80, em vez de 380 mil a US$ 150.
Mesmo sem saber o que fará com elas, a Viúva ganha mais 267 mil tabuletas,
e, como sobraram os 10%, ficará todo mundo feliz.
Fonte: O Globo
Nenhum comentário:
Postar um comentário