As manifestações e os protestos que se espalham pela Europa "contra os
sacrifícios excessivos" expõem a enorme fragilidade das esquerdas.
Esta é a maior crise do sistema capitalista desde os anos 30 e, no entanto,
socialistas e social-democratas seguem paralisados, incapazes de formular uma
crítica mais abrangente e de fornecer propostas consistentes para uma saída.
A maioria dos governos da área do euro ou é liderada por socialistas (caso
do presidente da França, François Hollande) ou por social-democratas (como a
chanceler da Alemanha, Angela Merkel).
Às vezes, as lideranças insistem em discursos em defesa do crescimento
(capitalista), como o do presidente Hollande, mas não conseguem mais do que
alguma variação de austeridade e elevação de impostos.
Pior, o aumento do desemprego, especialmente na França e na Espanha, vai
empurrando antigos internacionalistas, os mesmos socialistas e
social-democratas, para um discurso nacionalista, de defesa da indústria local
e a favor do controle mais feroz da imigração.
As propostas defendidas pelos governos social-democratas da área do euro,
por exemplo, são mais ortodoxas e mais diluidoras de salários, de
aposentadorias e de renda dos trabalhadores do que o ajuste colocado em marcha
pelo governo dos Estados Unidos. Quando defendem o avanço econômico e o aumento
do emprego, essas propostas vêm acompanhadas de recomendações que desembocam na
austeridade: não há crescimento econômico sustentável sem equilíbrio das contas
públicas – martelam essas lideranças.
O aprofundamento do colapso consolida a percepção de que as políticas de
bem-estar social (welfare state) – consubstanciadas no seguro-desemprego e no
financiamento estatal de programas básicos de saúde e ensino, todas elas
conquistas da social-democracia – agravam a fragilidade das contas públicas.
São políticas que sangram ainda mais os tesouros nacionais, numa conjuntura de
quebra de arrecadação.
Por vezes, as esquerdas ensaiam críticas às práticas predatórias dos bancos.
Mas logo são desencorajadas pelo entendimento de que enfraquecer os bancos
implicaria contribuir para o enfraquecimento do próprio trabalhador e das
classes médias. São eles grandes fornecedores de capitais para as instituições
financeiras, os volumes crescentes canalizados por depósitos em conta corrente
e por aplicações em fundos de pensão e em fundos de investimento.
Paradoxalmente, as causas mais profundas dessa crise econômica têm a ver com
enormes transformações no proletariado global. São fruto da incorporação da mão
de obra asiática e latino-americana ao mercado global de trabalho em detrimento
do emprego nos países ricos. E, no entanto, a primeira reação das lideranças
socialistas e social-democratas é evitar a todo o custo a "exportação de empregos".
Enfim, as esquerdas não têm respostas consistentes nem contra os abusos
neoliberais para a progressiva globalização do trabalho. Tampouco não sabem o
que propor para enfrentar o rápido e inexorável envelhecimento da população, os
novos movimentos de migração dos povos e as mudanças culturais que sobrevêm com
a disseminação do islamismo.
Fonte: o Estado de S. Paulo
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