- O Estado de S. Paulo
Alguma coisa sugere que o Banco Central não tem clareza nem sobre as condições da economia nem sobre o comportamento futuro da inflação. Quando coisas assim acontecem, quem espera condução firme das expectativas em meio das atuais incertezas que cercam a economia, fica um tanto confuso.
Para não ir muito atrás, a falta de coerência começou com o comunicado divulgado logo após a última reunião do Copom, realizada dia 4. Foi quando passou o recado de que os juros haveriam de subir nos meses seguintes não mais na dose de 0,5 ponto porcentual ao ano, como aconteceu então, mas "com parcimônia". Todo o mundo entendeu que nova alta (assim, no singular) não levaria mais do que 0,25 ponto porcentual.
Essa expressão foi repetida na Ata do Copom, emitida dia 11, passando a impressão de que o Banco Central não estava especialmente preocupado com a força da inflação. Logo no dia seguinte, no entanto, o presidente Alexandre Tombini abandonou a plumagem de pombo e assumiu a de falcão. Já não repetiu o discurso da parcimônia, mas passou a dizer que o Banco Central "fará o que for necessário para viabilizar um cenário de inflação mais benigno no período 2015-2016".
O Relatório de Inflação ontem divulgado ignora a partitura da parcimônia, como se ela tivesse perdido importância. E a substituiu pela nova: "O Comitê irá fazer o que for necessário para que no próximo ano a inflação entre em longo período de declínio, que levará à meta de 4,5% em 2016". Mas ficou por aí. Não explicou por que mudança tão rápida, sem que nada de novo a justificasse.
Outra incoerência tem a ver com o nível esperado dos investimentos nos próximos meses, componente importante da demanda e, portanto, da formação de preços. A Ata do Copom do dia 8 avisa no parágrafo 23 que "os investimentos tendem a ganhar impulso". Duas semanas depois, o Relatório de Inflação diz o contrário. Lá está dito que a Formação Bruta de Capital Fixo (FBCF), que é o nome técnico do investimento, deverá cair 1,8% nos próximos quatro trimestres (até setembro de 2015).
O Banco Central parece ter desistido de fazer a cabeça dos formadores de preços de maneira voluntarista, como tantas vezes tentou. Assumiu que o crescimento econômico (evolução do PIB) dos quatro trimestres terminados em setembro de 2015 não passará de 0,7%, franqueza que, em outros tempos, deixaria aborrecido o ministro Mantega, sempre mais propenso a dourar a pílula.
A mesma disposição a mais realismo deve ter acontecido também com as projeções do investimento. Mas esses solavancos na comunicação, sem maior preocupação com a confusão que podem semear, mostra que o Banco Central não conseguiu até agora quebrar a bolha em que parece inserido.
São inconsistências assim que prejudicam a capacidade do Banco Central de conduzir expectativas. Se errou e se foi confuso em questão de semanas, como pode garantir - e fazer-se acreditado - que em 2016 a inflação convergirá para o centro da meta?
O Banco Central cita três fatores que agirão nessa direção: as restrições monetárias (alta dos juros), a política fiscal (manejo das contas públicas) mais apertada e a redução aos subsídios dos juros. Mas não está claro se bastará esse coquetel supostamente light para enfrentar a forte recomposição dos preços administrados (especialmente da energia elétrica) e a disparada do dólar no câmbio interno que começará por provocar o inchaço dos preços dos importados.
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