Agenda
do clima pode criar oportunidades de negócios que passariam dos US$ 70 trilhões
até 2030 e muitos empregos
A
pandemia da covid-19 nos alertou para a relevância da cooperação para o enfrentamento
de grandes desafios comuns. Essa advertência também é oportuna para outro
grande desafio coletivo: as mudanças climáticas. As previsões científicas do
aquecimento do clima são bastante preocupantes e apontam para consequências
sociais e econômicas devastadoras, o que vai requerer transformações
estruturais para o seu enfrentamento e mobilização de recursos e esforços
próprios de períodos de guerra.
Dentro do espírito surgido durante a pandemia para aproveitar a ocasião e reconstruir um mundo melhor, estão avançando esforços políticos e econômicos para fortalecer acordos e instituições e encorajar o desenvolvimento de inovações, tecnologias, mercados e modelos de negócios para acelerar a transição para a economia de baixo carbono e oferecer soluções para a prevenção, adaptação e mitigação dos riscos das mudanças climáticas.
A
despeito das resistências que o tema ainda enfrenta, há razões para otimismo.
Animada pelo crescente apoio popular, por esforços de cooperação internacional
e pelas perspectivas de novos negócios, a agenda de sustentabilidade deverá
avançar com vigor. Estima-se que parte significativa do crescimento econômico
global dos próximos anos virá da agenda do clima, com oportunidades de negócios
que passariam dos US$ 70 trilhões até 2030 e com a criação de muitas dezenas de
milhões de novos empregos.
De
fato, as oportunidades são sem precedentes. Afinal, envolvem negócios transformacionais
e simultâneos em setores críticos como energia e transportes, e mudanças
profundas nos padrões e hábitos de consumo, nas tecnologias de produção,
consumo e descarte de bens e serviços, na produção e consumo de alimentos e no
uso e gestão dos recursos naturais. As perspectivas econômicas são tão
atrativas que estariam provocando uma “corrida do ouro” entre empresas e entre
países para ocupar mercados em formação e pela primazia nos padrões técnicos e
regulatórios que governarão a economia de baixo carbono. Ali, chegar primeiro
poderá fazer toda a diferença.
Governos
de países avançados e da China têm desenvolvido estratégias ambiciosas para
estimular a ocupação daqueles espaços pelas suas empresas e bancos. No plano
interno, são incentivos, recursos e mudanças regulatórias para impulsionar
negócios, financiar pesquisa e desenvolvimento, apoiar startups, treinar e
capacitar recursos humanos e formar alianças. No plano externo, buscam abrir
mercados internacionais com acordos comerciais, investimentos, patentes e
financiamentos, e influenciar organismos, fundos e bancos multilaterais.
Trata-se da grande agenda de política industrial do século XXI. Para além de
preservar o planeta, a política mira a sustentabilidade como um grande negócio.
Embora
promova o bem comum, é provável que os benefícios econômicos diretos daquela
agenda sejam diferentemente distribuídos em razão das distintas funções que
terão as empresas e países. De um lado estarão os desenvolvedores,
distribuidores e gestores das tecnologias e soluções que, provavelmente, se
beneficiarão de significativos aumentos de renda, emprego, competitividade e
produtividade. De outro lado estarão os consumidores daquelas tecnologias e
soluções que, provavelmente, observarão benefícios mais modestos. As
desigualdades internacionais poderão, desta forma, aumentar.
E
a América Latina? A economia da região, que vinha em ritmo lento já desde antes
da pandemia, sofreu contração recorde no ano passado e, neste ano, deverá
crescer menos que outras regiões. As perspectivas para os próximos anos não são
muito melhores e uma das causas pode ser atribuída às dificuldades para
promover um padrão de crescimento menos volátil e mais inclusivo e que tenha
como base o conhecimento, a diversificação produtiva, a agregação de valor, a
participação em cadeias globais de valor e o aumento da produtividade e da
competitividade em bases amplas.
Mas
não tem que ser assim. Afinal, a região oferece enormes oportunidades de
crescimento e negócios que podem se beneficiar da difusão de tecnologias e
soluções para a prevenção, adaptação e mitigação dos riscos climáticos. Ainda
mais importante, a região tem condições naturais e vantagens comparativas
únicas para se beneficiar da economia de baixo carbono na condição de
protagonista. De fato, em razão das imensas florestas tropicais e outros biomas
e dos recursos naturais que tem, a região poderá contribuir de forma decisiva
para a transição para a economia de baixo carbono.
Para
otimizar e potencializar os efeitos daqueles benefícios para o crescimento,
será preciso lançar mão do poder de barganha subjacente àquelas condições para
reivindicar participação ativa no desenvolvimento dos mercados de carbono e de
inovações financeiras verdes, ampliar acesso a financiamentos e investimentos,
influenciar acordos comerciais e participar de forma ativa da governança de
mercados, fundos e instituições internacionais pertinentes. Também será
fundamental reivindicar participação no desenvolvimento científico e
tecnológico e nas plataformas de negócios verdes.
Por
fim, será importante explorar as imensas oportunidades de novos negócios
associados à agricultura e mineração sustentáveis, biodiversidade, projetos de
conservação, novas energias, infraestruturas, turismo e outras atividades da
região que poderão se beneficiar da integração, sinergias e complementariedades
com a agenda de sustentabilidade.
A
América Latina tem diante de si a sua mais potente agenda de política
industrial. Não seria exagero considerar que esta agenda pode ser a sua grande
oportunidade para se transformar numa região mais próspera e com
desenvolvimento mais sustentado e sustentável. Mas, para avançar, será preciso
combinar ambição e audácia com visão de longo prazo, estratégia, mudança de
prioridades e coordenação de políticas públicas e privadas.
*Jorge Arbache é vice-presidente de setor privado do Banco de Desenvolvimento da América Latina - CAF
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