Pegue-se
de qualquer ponto o depoimento que o ex-secretário Fabio Wajngarten deu à CPI e
é possível encontrar uma inconsistência. Foi tanta mentira e contradição que,
durante a tarde, instalou-se uma discussão entre o presidente Omar Aziz e o
relator Renan Calheiros. O relator queria prender. O presidente, não. Renan
temia a desmoralização, Aziz disse que estava salvando a CPI. A prisão faria a
Comissão Parlamentar escalar o grau de conflito. A não prisão daria a qualquer
um o direito de mentir ali. Cada um dos dois tinha um ponto, não era fácil
decidir. Senadores que a coluna ouviu acham que era caso de prisão. O senador
Alessandro Vieira, que é suplente, quando acabou de interrogá-lo e pegar novas
contradições, concluiu:
—
Eu apenas reforço, e pode ser uma tendência desta comissão. Não há nisso
ameaça. Há um justo alerta à testemunha. Cabe ao senhor presidente determinar
se é o caso de prisão em flagrante por mentir à CPI. Essa decisão será
constante. É impressionante vir aqui e agir com essa desfaçatez.
Wajngarten negou que tivesse dito à “Veja” que foi incompetência do Ministério da Saúde. A “Veja” postou o áudio em que ele dizia “incompetência, incompetência”. A senadora Leila o colocou para ser ouvido. Ele disse que fez 11 campanhas vinculadas à pandemia. O senador Humberto Costa mostrou que algumas eram para estimular as pessoas a saírem para as ruas. O senador Tasso Jereissati perguntou sobre a campanha “O Brasil não pode parar”. Ele alegou desconhecimento, dizendo que em março do ano passado estava em casa com covid. Na época, deu entrevista a Eduardo Bolsonaro dizendo que de casa continuava trabalhando e aprovando campanhas.
“Eu
sou uma prova viva de que mesmo testado positivo, a vida segue normal, tenho
feito calls com ministros, com a Secom, tenho aprovado campanha, tenho
conversado com os criativos das agências. Então a vida segue”, disse ele ao
filho do presidente. Terminou dizendo que a pandemia não era essa “agonia que
uma parte da mídia anda veiculando”.
Wajngarten
entrou em contradição até com o que disse durante o depoimento. Afirmou que não
negociara com a Pfizer. Repetiu várias vezes para o senador Renan Calheiros que
apenas fizera três contatos, para ajudar o Brasil a ter “a melhor vacina do
mundo”. Depois, relatou diálogos próprios de negociação. Disse, por exemplo,
que em determinado momento eles ofereceram apenas 500 mil doses:
—
Eu disse a eles que isso é menos do que um bloco da Avenida Paulista e que a
conversa não continuaria se eles não mudassem de postura. Vi que havia um
espaço para negociação.
Ao
falar das cláusulas “leoninas” do contrato da Pfizer que justificariam o que
ele mesmo denunciara como incompetência, ou seja, o atraso no acordo com a
farmacêutica, ele disse que consultara o jurista Ives Gandra, pai, para saber o
que era o contrato de adesão. E que Gandra dissera que isso jogaria toda a
responsabilidade sobre o governo brasileiro, por eventuais efeitos adversos. Ao
senador Alessandro Vieira, ele contou que falou sim com Ives Gandra, mas apenas
“ontem” (terça-feira).
—
Então, o senhor apontou que esse foi o motivo para não comprar a vacina, mas só
ontem o senhor ficou sabendo disso com o Gandra? — perguntou Vieira.
—
Eu não o conhecia.
O que houve foi o seguinte. Numa briga interna do governo, Wajngarte desentendeu-se com o marqueteiro do general Pazuello, conhecido como Markinhos Show. Pazuello, ao sair, insinuou que houve gente querendo “pixulé” na compra de vacinas. Wajngarten então deu a entrevista à “Veja” atacando o Ministério da Saúde. Chamado à CPI, foi com a missão de blindar o presidente e sem compromisso de dizer a verdade, apesar da obrigação legal de fazê-lo. Que ele mentiria ficou claro logo no início, quando o senador Renan Calheiros perguntou que impacto tinha, na opinião pública, aquela sucessão de falas “estapafúrdias” do presidente contra a vacina e a favor de aglomeração. Wajngarten, que se apresentara como especialista em análise de dados na área da comunicação, soltou a frase: “Não sei qual o alcance de uma fala presidencial.” Era mentira, evidentemente. O que seria um dia a favor do governo acabou virando contra pelo volume das falsidades. Por isso o senador Flávio Bolsonaro desembarcou na comissão. Para criar conflito. Foi quando chamou Renan de “vagabundo”. O depoimento foi enviado ao Ministério Público.
Nenhum comentário:
Postar um comentário