Precipitadamente,
esperava-se que o depoimento de Fabio Wajngarten trouxesse revelações
bombásticas e viesse a entregar ex-colegas de governo. Afinal, o ex-secretário
viveu os bastidores da presidência de Jair Bolsonaro, foi integrante do núcleo
dirigente e, sobretudo, por meio da Revista Veja havia dirigido artilharia
pesada contra o Ministério da Saúde.
No
entanto, sendo evasivo, Wajngarten buscou se caracterizar como um burocrata
distante do centro do poder. Defendeu-se e optou pela fidelidade ao presidente
e à sua alma mater, o bolsonarismo. E era mesmo essa a perspectiva mais
realista a respeito do depoimento.
Contudo, ele não combinou com a maioria da CPI. Determinados em revelar erros do governo e do presidente da República, os membros não governistas da comissão resolveram apertar o ex-secretário. E assim explicitaram inúmeras contradições em suas declarações. Sobretudo, em relação ao que disse à revista Veja.
Saiu
dali a primeira protagonista do dia: as acusações de falso testemunho — Wajngarten
mentiu à CPI ou à Veja? A revista liberou o áudio da entrevista e uma acareação
entre o ex-secretário e seus repórteres foi posta sobre a mesa. Ficou ali
patente o erro estratégico de Wajngarten, o que poderia ter-lhe levado da CPI
diretamente à prisão. Não chegou a tanto, mas ficou o recado aos próximos
depoentes.
A
segunda personagem do depoimento emergiu com a exposição da Carta da Pfizer
dirigida aos principais membros do governo. Emitida em setembro de 2020, ela
alertava para a urgência da negociação em torno da compra de vacinas. Como se o
assunto fosse irrelevante, após dois meses parecia ignorada — medidas efetivas
se deram apenas quatro meses mortais mais tarde. Inadvertidamente, Wajngarten
explicitou “a linha do tempo de absurdos” que giram em torno da pandemia no
Brasil.
A
mentira e o desmazelo gritaram alto na CPI. Despreparada, a tropa governista
não conseguiu deter a linha do tempo. Nem a história, de onde todos os absurdos
transbordam.
*Carlos Melo, cientista político. Professor do Insper.
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