- O Globo
Jair Bolsonaro resolveu jogar gasolina na
fogueira. Na primeira fala após os protestos de sábado, o presidente adotou tom
de enfrentamento. Debochou dos atos, disse que as ruas ficaram vazias, chamou
os manifestantes de maconheiros. “Faltou erva para o movimento aí”, provocou.
O capitão acusou o golpe. Foi a primeira
vez que a oposição ocupou as ruas desde o início da pandemia. As marchas
ocorreram em todas as capitais brasileiras, com destaque para Rio e São Paulo.
Os participantes homenagearam as vítimas do coronavírus e gritaram “Fora
Bolsonaro”. Uma mensagem simples, que deve embalar novos protestos nos próximos
meses.
O presidente vive seu pior momento. Com a
popularidade em queda, vê a CPI avançar sobre o “gabinete das trevas” que
deixou os brasileiros sem vacina. Ontem a médica Nise Yamaguchi ilustrou o
funcionamento dessa engrenagem. Seu depoimento resumiu o misto de negacionismo
e ignorância que transformou o país num inferno da Covid.
Além de lidar com seus próprios problemas,
Bolsonaro passou a conviver com o fantasma de um rival forte. O ex-presidente
Lula recuperou os direitos políticos e passou a liderar as pesquisas para 2022.
Seu retorno desvalorizou a principal moeda de qualquer candidato à reeleição: a
perspectiva de poder.
Acuado, o presidente reage como sempre: aposta na radicalização e tenta criar cortinas de fumaça. A decisão de sediar a Copa América no Brasil segue o manual bolsonarista. Diante de uma crise, fabrica-se outra polêmica para desviar o foco do debate. O risco é oferecer uma nova bandeira aos insatisfeitos. Em 2013, numa conjuntura bem diferente, a pregação contra a Copa das Confederações ajudou a entornar o caldo contra Dilma Rousseff.
Ao atacar os manifestantes do sábado, o
capitão tinha um objetivo claro: ressuscitar o antipetismo e mobilizar a
direita em sua defesa. É uma estratégia arriscada. No momento, o
antibolsonarismo parece ter virado a força dominante na sociedade. Ao brincar
com o fogo, o capitão pode inflamar mais gente a ir às ruas contra o governo.
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