- O Globo
O surpreendente desempenho do PIB no 1º trimestre (+1,2% ante o anterior) produz um significativo carrego estatístico de 4,9% para o crescimento em 2021. Explico: se a economia andar de lado até o final do ano, oscilando apenas conforme o padrão sazonal, essa magnitude de expansão do PIB está garantida. A cifra elevada decorre da base de comparação baixa (2020) e do início de ano favorável.
Não convém, porém, tomá-la como piso para o
ano, pois poderá haver leituras negativas adiante. Não só por contas de
elevadas incertezas, mas porque o dado do 1º trimestre beneficiou-se de alguns
fatores pontuais.
O principal ponto negativo foi a elevação
de estoques. Uma conta aproximada – a diferença entre a variação da demanda
total (-0,8%) e a oferta (+1,2%) – indica algo correspondente a 2pp do PIB,
cifra poucas vezes vista.
O problema é que o excesso de oferta de bens e serviços que evitou a queda do PIB não deve se repetir, aumentando a chance de uma leitura negativa no 2º trimestre, ainda mais porque parte do acúmulo de estoques foi possivelmente involuntário.
De qualquer forma, o recuo de 0,8% da
demanda agregada foi modesto, em boa medida por conta da baixa adesão às novas
medidas de isolamento social, conforme mostram indicadores de movimentação de
pessoas. Claro que, com a lenta vacinação, a contrapartida foi a enorme segunda
onda de óbitos e a perspectiva de terceira, segundo especialistas.
Outro aspecto positivo foi a adaptação de
indivíduos e empresas ao isolamento, contribuindo para conter suas consequências.
O que mais se ouviu de CEO´s no ano passado é que planos de investimento em
tecnologia da informação (TI) estavam sendo antecipados. Nessa linha, a
produção de equipamentos de informática cresceu 22% no 1º trimestre na
comparação anual.
Esse fato, associado à robusta aquisição de
máquinas pela agropecuária, contribuiu para a resiliência do investimento
produtivo. Uma observação: o aumento de investimento divulgado (+4,6%) está
inflado pela importação de plataformas de petróleo que só existiu contabilmente,
em função de regime tributário especial. Feita a correção, o quadro seria de
certa estabilidade do indicador.
Se o isolamento já machuca bem menos, o
corolário disso é que o avanço na vacinação não deverá trazer grande alívio na
dinâmica da economia adiante.
O mix da atividade, no entanto, tende a
mudar. A indústria de transformação, que foi beneficiada pela mudança de
hábitos dos consumidores em busca de conforto no lar e pelo auxílio
emergencial, agora perde fôlego. Há também o aumento da participação das
importações, por conta do restabelecimento de cadeias de valor no mundo. O
cenário mais provável é de volta do setor à estagnação.
Por outro lado, os serviços associados à
movimentação de pessoas tendem a ganhar tração, mas provavelmente não recuperando
as perdas do passado.
A mudança de mix, na verdade, poderá
prejudicar o desempenho agregado da economia. O impacto da indústria no sistema
econômico - por exemplo, pelas encomendas de serviços - é importante, e poderá
perder força; enquanto os serviços associados ao consumo das famílias, que
devem reagir, beneficiam bem menos outros setores.
Se a leitura do PIB não é grandes coisas, a
sensação térmica de importante parcela da população é pior ainda. O PIB
aumenta, mas não o bem-estar de muitos, pois as atividades econômicas que mais
sofrem com a crise são justamente aquelas que empregam mão de obra menos
qualificada e informais. Para piorar, as exigências tecnológicas impostas pela
pandemia destroem empregos.
Assim como os empregos de chão de fábrica
são menos abundantes hoje, atividades de baixa qualificação no setor de
serviços tendem a encolher, pressionando o desemprego.
As clivagens na economia tendem a se
aprofundar neste país que cresce pouco. Ocorre consolidação ou concentração nos
setores. Cada pequena empresa que fecha as portas implica ganho de mercado das
maiores, mais formalizadas e eficientes.
Certamente, esse é um fator a beneficiar,
não só o cálculo do PIB, mas a arrecadação tributária, que surpreende. Quem vai
mal é justamente quem paga menos imposto ou nem está no PIB, por estar em menor
ou maior grau na informalidade.
O governo celebra os números do PIB, mas Paulo Guedes compreendeu bem que nem todos participam dessa festa. Não à toa promete mais políticas de transferência de renda até a eleição.
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