O Estado de S. Paulo
Assim como o sapo de Guimarães Rosa, o
recuo do presidente Jair Bolsonaro não foi “por boniteza, mas por precisão”.
Dito isso, o recuo merece mais atenção e ponderação a respeito. Não é um recuo
como tantos outros. As circunstâncias do presidente e do País mudaram nas
últimas semanas. Desta vez, Bolsonaro não depende apenas de si ou da
condescendência conveniente dos líderes do Centrão. Depende também de seus
maiores adversários: as instituições e as leis.
Antes, é preciso limpar essa área. A sempre repetida locução de que, “apesar de tudo, as instituições estão funcionando”, carece de lógica, razão e base conceitual. Asseverou o Nobel Douglass North que instituições garantem a segurança e a previsibilidade, são a base do desenvolvimento econômico e social e, para isso, se antecipam a problemas previsíveis. Tudo o que tem faltado. Funcionassem, a situação do País seria outra. Muitas instituições no Brasil – não todas – parecem divididas: em parte, ocupadas pelo bolsonarismo; em parte como trincheira de resistência aos avanços do primeiro.
Ao recuo de Bolsonaro: nos muitos casos
anteriores, após avançar duas casas, o presidente apenas aparentemente cedia,
recuando uma casa. Assim avançou muitas vezes se impondo ou constrangeu o
tolerante ambiente institucional. Desta vez, Bolsonaro se aventurou a um salto
de longa distância: quebrou a cara e, obrigado, empreendeu acelerada marcha à
ré, colocando-se atrás de suas linhas.
Para ele, o saldo é bastante negativo. O 7
de Setembro não lhe garantiu um único apoio dos que o rejeitavam e fez com que
perdesse o tipo de reputação que acalenta na própria base. Nas redes
bolsonaristas – o verdadeiro quartel general do presidente – a humilhação
partiu de desafetos e aliados. Sobrou-lhe a esfarrapada versão de “um acordo
por trás”.
Já o saldo institucional foi positivo,
deu-se um salto na mesma proporção dos erros de Bolsonaro. Sendo assim, por que
e como as instituições “também” recuariam?
Toda a defesa institucional que se fez
argumentava que não eram ações pessoais, mas “império das leis” que agiam
contra o presidente e sua base. Não se tratava do ímpeto de Alexandre de Moraes
ou Luís Roberto Barroso, mas de posições firmes na aplicação de leis e na
crença do papel das instituições, na suprema autoridade da Constituição. Preferências
políticas e pessoais estariam fora de questão.
O lamentável episódio de 7 de Setembro pode se conformar como excelente oportunidade para aposentar a imagem do automóvel velho. Pode-se retirar dali a força e o desempenho de uma máquina moderna. Não convém ficar à espera do recuo do recuo de Bolsonaro.
*Cientista Político. Professor do Insper
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