Folha de S. Paulo
Assinada por Bolsonaro, mas com digitais de
Temer, carta de recuo é enganação
Depois dos atos antidemocráticos no Dia da
Independência, caminhoneiros bolsonaristas, muitos dos quais a soldo de
empresários do agronegócio, resolveram bloquear as estradas do país. Até
quinta-feira (9), mais de cem caminhões continuavam a ocupar a Esplanada dos
Ministérios, tentando a derrubada da proteção ao STF, maior alvo dos
“protestos”. Para eles, o preço do litro de gasolina ou do tomate na feira não
importa. Querem o que o presidente sempre quis: um país fora de controle e uma
justificativa para o uso da força.
Em estilo delirante, dopados por mensagens de celular, os caminhoneiros curtiram sua frustração —o número de manifestantes no Sete de Setembro ficou aquém da expectativa— fazendo terrorismo e preparando o cenário para os próximos capítulos da farsa.
No fundo não sabiam a quem obedecer: se ao
líder Zé Trovão, foragido no
México, ou se ao próprio Bolsonaro, cuja voz num áudio de Whatsapp
eles desconfiavam ser uma imitação barata, uma traição da causa, uma gozação do
humorista Marcelo Adnet. Agiram para explicar na prática a teoria de Conrado
Hübner Mendes, segundo a qual “o golpe está sendo”. A carta de arrego com
digitais de Michel Temer? Enganação.
Nada como ter dinheiro sobrando para
viagem, hospedagem, alimentação e baderna. Um grupo enrolado em bandeiras do
Brasil e vestindo o uniforme amarelo da CBF quase conseguiu invadir o Ministério
da Saúde. Não estavam bêbados. Perseguiam uma repórter da TV Record que
identificaram como da TV Globo. Há um significado latente no episódio: a sede
da saúde vandalizada pelos seguidores do homem que negou a gravidade da
pandemia, não usou máscara, estimulou aglomerações, recomendou invasões de UTI,
promoveu um remédio que mata e boicotou a contagem de mortos.
Arthur Lira, o presidente da Câmara, defende a picaretagem. Não fala em impeachment e elogia os fanáticos bem pagos do feriado nacional.
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