Folha de S. Paulo
Fim da prisão especial para diplomados não
elimina privilégios
O corporativismo no Brasil é tão arraigado
que se manifesta até nas raras ocasiões em que o país abraça uma medida
republicana.
Refiro-me à decisão do Supremo Tribunal
Federal que põe
fim à prisão especial para detentores de diplomas universitários. O
dispositivo a ser revogado, que consta do inciso VII do artigo 295 do Código de
Processo Penal, assegura aos titulados o direito de ficarem separados dos
outros presos enquanto não houver condenação definitiva.
A lógica que presidiu aos votos da
totalidade dos ministros é irretorquível. A prisão especial para os diplomados,
isto é, em função de uma distinção educacional que se explica principalmente
pela classe social, é um privilégio incompatível com o princípio constitucional
da igualdade de todos diante da lei.
Segue intacta a obrigação do Estado, nem sempre observada, de separar os presos por sexo, idade e tipo de delito, bem como a de assegurar a integridade física e psicológica de todos os cidadãos que ficam sob sua custódia.
O que causa espanto, para não dizer
repulsa, é que o STF tenha restringido
seu pendor republicano à questão dos diplomados, sem estendê-lo às várias
classes que permanecem com seus privilégios intocados. O próprio artigo 295 tem
mais dez incisos, que protegem, entre outros, políticos, oficiais militares e
ministros religiosos. Outras legislações dão a regalia, por vezes acrescida de
mais benesses, a advogados, membros dos MPs e, é claro, juízes. Não teria sido
difícil para o Supremo montar uma pauta mais alentada, que discutisse os
privilégios corporativistas em sua totalidade e não apenas uma de suas
manifestações.
No melhor espírito do "instaure-se a
moralidade ou locupletemo-nos todos", vou reativar minha igreja, a Igreja
Heliocêntrica do Sagrado EvangÉlio,
e passar a distribuir ordenações sacerdotais. Com a exclusão dos universitários
do rol de beneficiados, o preço do título de ministro religioso deve subir.
Nenhum comentário:
Postar um comentário