Valor Econômico
Direita bolsonarista mira maioria no Senado para ter impeachment como arma a partir de 2027
Com mais de 6.500 ingressos vendidos, as
cadeiras do auditório não comportaram a multidão, que se acumulou em pé nas
laterais e no fundo do salão. Dois telões imensos ao lado do palco reproduziam
em close a principal estrela do dia. Com frases de efeito que combinavam a
irresponsável irreverência dos jovens e as apuradas técnicas de comunicação de
pastores experientes, o deputado mais votado do Brasil era interrompido por
aplausos entusiasmados. Ao final, foi aclamado de pé e levou vários minutos
para se desvencilhar de milhares de fãs ávidos por uma selfie.
A participação de Nikolas Ferreira (PL-MG) no Fórum da Liberdade, tradicional evento criado por empresários gaúchos há 38 anos, contou com mensagens de exortação à livre iniciativa, principal agenda da organização anfitriã. O que sobressaiu, porém, foi seu discurso político contra a esquerda e, sobretudo, as ações do Supremo Tribunal Federal.
Nikolas explorou à exaustão a tese de que ele
próprio, Jair Bolsonaro e os bolsonaristas sofrem uma injusta perseguição dos
ministros do STF. Mas o parlamentar mineiro acredita que a situação vai virar:
“Com a ajuda de Deus, vamos eleger um senador em cada Estado brasileiro em
2026, e no próximo mandato vamos dominar 2/3 do Senado Federal. E contamos com
o povo gaúcho para isso. De preferência elegendo dois [senadores
bolsonaristas]”. Aplausos efusivos da plateia se seguiram por mais de um
minuto.
A matemática de Nikolas traduz a estratégia
para aquela que será, na visão do bolsonarismo, a eleição mais importante de
2026 - mais até do que a disputa presidencial, principalmente se o Congresso e
a Justiça mantiverem Bolsonaro inelegível.
A lógica se assenta no dispositivo da
Constituição que estabelece que a perda do cargo de ministro do STF e de
Presidente da República depende do voto de 54 dos 81 senadores (2/3 do total).
Em 2022, o bolsonarismo conquistou 15 das 27
cadeiras em jogo. Além dos 8 integrantes do PL, o ex-presidente emplacou fiéis
aliados em outros partidos, como Damares Alves, Hamilton Mourão e Cleitinho
(Republicanos), Tereza Cristina, Dr. Hiran e Laércio Oliveira (PP), além de
Sergio Moro (União Brasil).
Na atual configuração do Senado, o PSD
lidera, com 15 senadores, seguido por PL (14), MDB (11) e PT (9). Apesar de não
deter a maior bancada, contudo, o PL de Bolsonaro larga na frente na corrida,
porque a maioria dos seus afiliados foi eleita em 2022. Como o mandato de
senador é de oito anos, seus concorrentes terão mais trabalho para renovar os
mandatos de grande parte de seus representantes atuais.
O caso mais extremo é o do MDB: 10 de seus 11
senadores ficarão sem cargo a partir de 2027. Mas o PSD não fica muito atrás:
como só 3 membros da sua bancada obtiveram o cargo em 2022, outros 12 terão que
ir à luta para continuar em Brasília. Mesmo o PT terá dificuldades para
preservar 6 dos 9 assentos que mantém no plenário.
No pelotão intermediário do Senado, os
partidos do Centrão mais identificados com o bolsonarismo estão mais
tranquilos. O União terá 5 de seus 7 senadores assegurados em 2027, enquanto o
Republicanos manterá 3 de seus 4 integrantes. O PP fica no exato meio termo: 3
senadores continuarão e outros 3 precisarão disputar nova eleição.
Já entre os partidos menores, o PDT teria que
reeleger um de seus três representantes, enquanto Podemos (4), PSB (4), PSDB
(3) e Novo (1) terão o imenso desafio de renovar o cargo de todos os seus
senadores atuais no final da legislatura.
Na tentativa de dominação do Senado, a
extrema direita conta com o fato de que no ano que vem serão duas vagas abertas
em cada Estado. Isso torna muito mais fácil a eleição de bolsonaristas.
Nos seus cálculos entram familiares do
ex-presidente (Flávio, Eduardo e Michelle, caso não estejam presentes na chapa
para o Planalto) e prováveis vitórias de governadores que não podem continuar
no posto, como Romeu Zema (MG), Ratinho Jr. (PR), Cláudio Castro (RJ), Mauro
Mendes (MT), Antônio Denarium (RR), Wanderlei Barbosa (TO), Gladson Cameli
(AC), Wilson Lima (AM) e Ibaneis Rocha (DF). Há ainda em torno de 10 a 15
senadores eleitos em 2022 que buscarão novo mandato, como Eduardo Girão (CE),
Efraim Filho (PB), Eduardo Gomes (TO), Márcio Bittar (AC), Mecias de Jesus (RR)
e Nelsinho Trad (MS).
Deputados fortemente identificados ao
bolsonarismo e que integraram o seleto grupo dos 50 mais votados em 2022 também
podem ser promovidos a disputar uma vaga no Senado com chances razoáveis, como
Carol de Toni e Júlia Zanatta (SC), Guilherme Derrite (atual Secretário de
Segurança de São Paulo), André Fernandes (CE), Bia Kicis (DF), Delegado Éder
Mauro (PA), Gustavo Gayer (GO), Coronel Zucco (RS), entre outros.
Por fim, há ainda um plano dos bolsonaristas
em alterar o domicílio eleitoral de algumas personalidades do seu campo para
disputar o pleito em outros Estados, e nessa jogada até o ex-ministro Paulo
Guedes e o leal deputado Hélio Lopes são vistos como peças importantes a serem
movimentadas.
Para a extrema direita, 2026 está logo ali -
só não vê quem não quer.
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