domingo, 3 de agosto de 2025

O tarifaço e a turbulência global - Celso Ming

O Estado de S. Paulo

Nesta sexta-feira começaram a aparecer na economia dos Estados Unidos os primeiros sinais da infecção produzida pelo tarifaço global decretado pelo presidente Donald Trump.

O indicador Payroll, que sonda o mercado de trabalho dos Estados Unidos, mostrou que, em julho, foram abertos por lá apenas 73 mil empregos. É resultado decepcionante, na medida em que a expectativa apontava para 101 mil. Trump não gostou do que viu e demitiu a encarregada das estatísticas. Ou seja, matou o mensageiro.

A partir daí – e na esteira de outros dados –, os analistas foram quase unânimes em prever a continuação da queda do emprego, como em diagnosticar o início de um período de desaceleração da atividade econômica, com aumento da inflação. Não é ainda o que os economistas chamam de estagflação (estagnação mais inflação), mas pode ser o início disso.

As principais bolsas dos Estados Unidos despencaram (Dow Jones 1,23% e Nasdaq 2,24%), o dólar mergulhou em relação às outras moedas fortes, inclusive em relação ao real (0,9%). Por farejar a desaceleração e, portanto, o menor consumo de energia, os preços do barril de 159 litros tipo Brent caíram 2,8%.

Por trás desses sinais de deterioração está a ação do tarifaço. A tarifa alfandegária média dos Estados Unidos saltou de 2,3%, em 2024, para 15,2%. A decisão foi anunciada em abril, mas a nova síndrome começou a aparecer apenas agora, porque, já esperando pelo que veio, os importadores dos Estados Unidos haviam reforçado seus estoques. E também porque ainda faltava avaliar melhor o impacto do tsunami.

Se for confirmado aumento relevante da inflação nos Estados Unidos, ficará inevitável o início de um período de redução dos juros básicos (Fed funds) pelo Fed (banco central dos EUA).

Por toda parte, tende a se espalhar pelo mundo um sentimento de “malaise” que, no caso, é mistura de desânimo, de impotência e de perda de confiança. O Índice Vix ( Volatility Index),considerado termômetro do medo nos Estados Unidos, chegou a quase 30% na sexta-feira.

Além de ter de tratar sua anemia crônica produzida pelo rombo fiscal, a economia brasileira passou a enfrentar mais duas adversidades: essa mistura de desaceleração da atividade econômica e inflação, que começa a tomar a economia mundial; e o impacto do tarifaço sobre setores importantes da economia. É incerteza sobre incerteza, mesmo com o avanço do PIB do Brasil perto dos 2%, neste ano.

Não dá para separar economia da política. A tentativa declarada de interferência de Trump nas instituições brasileiras e no jogo político interno pode semear mais confusão no processo eleitoral interno.

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