Correio Braziliense
A inflexão no cenário
eleitoral não está apenas no escândalo do INSS ou na disputa sobre segurança
pública. Inflação, deficit fiscal e juros altos se tornaram munição da oposição
A oposição conseguiu abalar a popularidade do
presidente Luiz Inácio Lula da Silva mais uma vez, com uma agenda negativa
focada nas bandeiras da ética e da ordem. O resultado está explícito nas
intenções de voto dos brasileiros: em todos os cenários para a corrida
eleitoral de 2026, a vantagem de Lula sobre os adversários voltou a diminuir, e
a rejeição aumentou, conforme levantamento da Genial/Quaest divulgado nesta
quinta-feira. Fazem parte dessa agenda, entre outros temas, a questão da
segurança pública e o escândalo do INSS.
A crise com os Estados Unidos, depois do encontro da Malásia, entre Lula e o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, desescalou, mas isso não tem impacto no cotidiano da população. O êxito da realização da COP30 em Belém, no Pará, sem embargo das eventuais críticas à organização do evento, também não teve grande repercussão na avaliação do governo por parte dos que não vivem na Amazônia.
Em contrapartida, a oposição já se mobiliza para
derrubar os 63 vetos de Lula à nova Lei de Licenciamento Ambiental, logo após a
conferência, na linha do quanto pior, melhor. Além de inviabilizar a realização
das metas ambientais estabelecidas a partir do Acordo de Paris, a eventual
derrubada dos vetos será uma desmoralização internacional para o país, que
presidirá a COP até a próxima conferência, prevista para 2026. Austrália e
Turquia disputam a sede do evento.
A agenda negativa da oposição ganhou alta
combustão pública, com temas como segurança, ética e corrupção, e o fator
estrutural que afeta diretamente o humor do eleitor: a economia. O escândalo
envolvendo desvios bilionários no INSS e a explosão de operações policiais nos
estados reforçam a sensação de descontrole, enquanto governadores como Cláudio
Castro e Tarcísio de Freitas vocalizam um discurso de “ordem” que contrasta com
a narrativa federal. A consequência é visível: a rejeição de Lula subiu de 51%
para 53%, e sua vantagem sobre quase todos os adversários testados diminuiu de
maneira consistente.
A inflexão no cenário eleitoral, porém, está
principalmente na economia do dia a dia, em que deficit fiscal e juros elevados
se tornaram munição diária da oposição e fonte permanente de desgaste para o
governo. Embora o IPCA esteja sob controle técnico, a inflação percebida —
alimentos, mensalidades, combustíveis, serviços — encarece a vida e gera
frustração. É essa inflação real, sentida no supermercado e no transporte, que
reduz o apoio difuso ao governo por parte da população.
Peso do cotidiano
Ao mesmo tempo, o deficit fiscal tornou-se um
símbolo político. A mudança da meta, a dificuldade de conter despesas
obrigatórias e a hesitação em comunicar uma âncora sólida fragilizaram a
credibilidade fiscal junto aos agentes econômicos, que operam na direção de uma
candidatura de oposição competitiva, comprometida com um duro ajuste fiscal e
um programa de privatizações e extinção de órgãos públicos. A oposição, de
forma monocórdica, associa gastos sociais à inflação e à falta de investimentos
privados.
O resultado é a consolidação da narrativa de
que Lula “não controla as contas”, mesmo quando parte do desequilíbrio decorre
de pressões judiciais. Esse discurso tem ainda mais credibilidade porque o
atual presidente do Banco Central (BC), Gabriel Galípolo, indicado pelo
presidente Lula, faz o seu dever de casa monetárista e mantém os juros altos.
A agenda negativa se completa com a taxa de
juros. Apesar de a oposição defender a autonomia do Banco Central, o desgaste
político da Selic — crédito caro, endividamento recorde e retração do consumo —
recai sobre o Planalto. O eleitor médio não distingue nuances: vê o preço do
carro subir, a fatura do cartão de crédito explodir, e conclui que a economia
não anda. Assim, a oposição transfere para o governo a responsabilidade pelo
custo do dinheiro, reforçando a sensação de paralisia.
Nesta quinta-feira, a Genial/Quaest mostrou
nova queda da aprovação de Lula nas pesquisas. Ele segue competitivo e venceria
todos os cenários de segundo turno, mas sua vantagem é menor: apenas três
pontos sobre Jair Bolsonaro, por exemplo, e recuos expressivos diante de
Tarcísio, Ciro e Ratinho Jr. Ainda mais revelador é o movimento da opinião
pública: 59% não querem que Lula seja candidato à reeleição, enquanto um quarto
dos eleitores passou a defender um nome fora da bipolaridade Lula-Bolsonaro.
Esse desgaste favorece governadores que
exploram a segurança pública como capital eleitoral. A megaoperação no Rio de
Janeiro produziu dividendos imediatos para Cláudio Castro (PL), cuja
popularidade cresceu nacionalmente por contraste com a imagem de hesitação
atribuída ao governo federal. Trata-se da mesma lógica observada nas Filipinas,
sob Duterte, ou em El Salvador, sob Bukele: operações de alto impacto geram
ganhos rápidos de aprovação, mesmo quando sua eficácia estrutural é duvidosa e
seus custos institucionais são elevados.
O risco para o governo é que esse ciclo —
economia travada, operações espetaculosas dos governadores de oposição,
escândalo do INSS, derrotas legislativas — engrosse a narrativa da estagnação
do país. O governo, para recuperar terreno, precisa de resultados concretos:
inflação menor, recomposição de renda, juros mais baixos e menos violência. O
cotidiano definirá a eleição de 2026.

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