- O Estado de S. Paulo
A polêmica não é só no Brasil. Junto com o Partido Trabalhista, as pesquisas de intenção de voto foram as grandes derrotadas nas eleições gerais britânicas. Na véspera, dez em dez institutos previram resultado apertado, um virtual empate de trabalhistas e conservadores. O Partido Conservador, porém, obteve maioria folgada de votos e 99 cadeiras a mais do que os trabalhistas. O que deu errado nas pesquisas lá? E o que esse erro implica aqui?
Estatísticos e especialistas em modelos matemáticos aplicados às ciências políticas estão buscando uma resposta para a incômoda questão, mas ainda estão longe de uma conclusão. As causas podem estar em lugares tão diferentes quanto o comportamento do eleitor ou os sistemas de amostragem e abordagem do eleitorado.
Seja o que for, deu errado para todo mundo. Tanto institutos multinacionais, como Ipsos Mori, quanto estrelas locais, como Lorde Ashcroft, ficaram além da margem de erro. Na média, os institutos previram 34% dos votos tanto para conservadores quanto para trabalhistas. Na urna, foi 36% a 31%. Pode parecer pouco, mas quando se traduz isso em cadeiras, o erro aumenta. Muito.
O Partido Conservador conquistou 331 vagas no Parlamento, enquanto as projeções não falavam nem em 300. Já o Partido Trabalhista teve que se contentar com 232 assentos, muito menos do que os mais de 270 que eram projetados. Cogitava-se que nenhum partido alcançaria a maioria de 326 cadeiras e que os trabalhistas poderiam chegar ao poder por causa de uma coalizão com o emergente Partido Nacional Escocês (SNP, na sigla em inglês).
Pois os conservadores tiveram um desempenho eleitoral bem melhor do que em 2010 e atingiram a maioria absoluta sem precisar dos votos do Partido Liberal-Democrata. O erro não parou aí, porém. Nenhum instituto previu que os liberais-democratas seriam dizimados e perderiam 49 de suas 57 cadeiras. A única previsão correta dos institutos foi o crescimento – confirmado – do SNP.
Tampouco os modelos tipo fivethirtyeight.com – que acertou tudo nas últimas duas eleições presidenciais nos EUA, misturando pesquisas de intenção de voto e inferências estatísticas – foram capazes de prever que o partido de David Cameron comandaria por mais cinco anos o governo britânico. A combinação de variáveis que esses modelos agregam aos resultados das pesquisas não foi suficiente para antecipar o que ocorreu.
As pesquisas de boca de urna, feitas após o eleitor votar, foram as únicas a chegar bem perto do resultado final da apuração. O problema, portanto, não é com a pesquisa em si, mas com a capacidade das sondagens e dos modelos de anteverem o que o eleitor fará quando estiver na solidão da urna.
Uma das hipóteses em estudo é que uma parcela cada vez maior do eleitorado deixa para decidir em quem vai votar no último minuto da última hora. Esse eleitor retardatário não é captado pelas pesquisas de véspera, simplesmente porque ele ainda não decidiu seu voto. Por mais precisas que sejam, as pesquisas não conseguem adivinhar em quem o retardatário vai votar.
A volatilidade do eleitor também aumentou porque a influência das redes interpessoais foi potencializada pelas redes virtuais. As pessoas tendem a votar como seus pares – familiares, amigos e colegas. Com Twitter, Facebook e WhatsApp, a rede se ampliou e se intensificou, aumentando a troca de informação (e de boatos).
“Vai ser cada vez mais difícil, aqui e no resto do mundo, prever o resultado da eleição. Por causa das novas tecnologias, a circulação da informação entre pessoas de grupos sociais específicos ficou mais rápida. Isso provoca mudanças súbitas de comportamento de parcelas do eleitorado.
Pode virar resultados”, diz Marcia Cavallari, CEO do Ibope Inteligência.
A diferença do Reino Unido é que lá se discute o erro para tentar melhorar as pesquisas. No Brasil, para proibi-las ou limitar sua divulgação.
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