Como
na Itália e nos EUA, aqui também a democracia tem resistido às reiteradas
agressões
O
presidente trapaceia a todo instante e sobre qualquer coisa. Para ficar no caso
extremo, mente em face da pandemia, como se quisesse levar ao paroxismo a
tragédia que já custou mais de 350 mil vidas. Ainda assim, é impossível
acusá-lo de ter ocultado, para se eleger, o seu intento último: destruir as
instituições em que se arrima a democracia brasileira.
Tampouco
se diga que, no poder, alguma vez tenha lhe faltado coerência e empenho para
tanto. Isso explica o aluvião de
provocações que marcam o seu desgoverno —a que fazem coro seus
áulicos, a tropa das redes e sua familícia. Ele investe contra ministros do
Supremo, lideranças do Congresso e dos partidos que não lhe são vassalos,
governadores, órgãos de mídia, entidades da sociedade civil, povos indígenas e
minorias.
Aos palavrões e esquartejando a sintaxe, contribui para a degradação do idioma e da convivência política civilizada. Em que nação que se dê ao respeito passaria pela cabeça de um assessor palaciano fazer um gesto obsceno e ainda por cima racista enquanto o presidente do Senado discursa? Difícil imaginar onde seria aceitável que o chefe do governo fizesse grosseria comparável àquela com que o ocupante do Planalto se referiu ao senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP).
A
fala rombuda e a disposição para criar conflitos não são idiossincrasias do
ex-capitão, mas um estilo político com propósito claro e que o assemelha a
outros populistas, como Trump ou Berlusconi, para ficar nos mais memoráveis
desse naipe internacional.
Mas,
como na Itália e nos Estados Unidos, aqui também a democracia tem resistido às
reiteradas agressões, provando-se apta a conter os seus piores efeitos políticos.
Eis por que o ocupante do Planalto tem colhido reveses importantes. Não ganhou
carta-branca das Armas para suas investidas autoritárias; teve que se desfazer
de alguns dos ministros mais sabujos e afinados com a sua —vá lá— visão de
mundo. É de lembrar que Weintraub, Araújo e Pazuello caíram por pressão dos
aliados. Agora, a irresponsável conduta bolsonariana diante da pandemia poderá
ser debulhada em público, na CPI da Covid-19, recém-criada no Senado, caso ela
consiga trabalhar.
Isso,
decerto, não o impedirá de continuar criando crises e de atentar contra as
regras elementares da democracia e da civilidade —envenenando, enfim, a
atmosfera política. E assim será até que os eleitores tenham oportunidade de
julgá-lo ou, o que parece improvável, uma crise mais séria ampute o seu
mandato. Mas, hoje como hoje, ele acusa mais golpes do que desfere. Uma notícia
boa, em tempos tão lúgubres.
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