- O Globo
Quando se cita o mote, os mais jovens — e
nem tão jovens assim — lembram Paulo Maluf.
Mas até isso Maluf pegou, digamos, de
maneira indevida. O verdadeiro dono do “rouba mas faz” é Ademar de Barros,
político dos anos 40 a 60, prefeito e governador de São Paulo, senador,
candidato a presidente.
Ele mesmo espalhava as piadas a seu
respeito. Nos comícios, dizia: “Neste bolso nunca entrou dinheiro roubado”. E a
plateia, divertida: “Calça nova, governador”. Ele ria.
Também lançou o que poderia ser o lema da
atual velha política: amigo meu não fica na estrada.
Era verdade. Ademar no governo, não tinha
um ademarista que ficasse sem cargo público.
O folclore ficou para Ademar de Barros, mas
a coisa se espalhava por todo o espectro político. O consenso tácito era o
seguinte: todo mundo levava o seu, o importante é que abrisse estradas (ou
construísse Brasília), oferecesse bons negócios públicos aos correligionários e
nomeasse a turma.
O capitalismo de amigos sempre esteve na
raiz da política brasileira. Até que foram apanhados o mensalão e o petrolão —
mas que, vistos de hoje, parecem mesmo dois pontos fora da curva. Todo mundo
está sendo perdoado nas instâncias judiciárias e políticas.
O STF vem cancelando condenações e devolvendo ao cenário político personagens que curtiram cana em anos recentes. Na política, não há melhor exemplo de anistia plena, geral e irrestrita do que o encontro entre Fernando Henrique Cardoso e Lula.
Lula saiu de lá com o voto de FH e o
passado limpo. Não precisou pedir desculpas pelos eternos ataques ao tucano
(herança maldita, entreguista, neoliberal), pelos seguidos pedidos de
impeachment que o PT entrava contra o governo FH, muito menos pelo mensalão e
pelo petrolão.
Em resumo, Lula levou tudo e não entregou
nada.
Digamos que FH tenha feito algumas
ressalvas em privado. Mas isso não conta em política. Na sua única manifestação
pública, Lula disse que, se fosse FH contra Bolsonaro, ele votaria no tucano.
Estão de gozação.
FH disse que ainda continua preferindo uma
terceira via, mas tornou-a ainda mais difícil — se não a enterrou — ao anistiar
Lula sem levar nada em troca.
Reparem no cenário político —
ex-presidiários voltando ao comando, o Centrão nomeando e gastando, Bolsonaro
ameaçando golpes e vendendo pedaços do Orçamento, os correligionários ocupando
os cargos, a Lava-Jato destruída, os negócios de amigos só não voltam com tudo
porque a economia ainda patina. Mas já se nota a ocupação de estatais e fundos
de pensão pela turma do governo.
Eis o quadro: amigo meu não fica na
estrada; ganhar 200 mil por mês do governo não tem nada demais; para os amigos,
tudo, para os adversários, o rigor da lei. (Dizem que esta última era do
Getúlio!) E Bolsonaro quer colocar os militares na roda.
Boa parte do mundo desenvolvido está saindo
da pandemia e voltando a crescer. Há riscos pela frente, como a temida volta da
inflação elevada, provocada pelo excesso de dinheiro que os governos gastaram e
continuam gastando. Sim, era preciso apoiar pessoas e empresas na pandemia,
mas, como já dizem alguns economistas, talvez tenham colocado água demais na
bacia.
De todo modo, por aqui estamos longe de
superar a pandemia. O nível de investimenbto público e privado está em torno de
15% do PIB, insuficiente para sustentar o crescimento. A reforma tributária foi
cortada em fatias tão finas que nem se veem. É possível que o sistema piore com
vários impostos e contribuições sobre as mesmas mercadorias e serviços.
Neste momento, a recuperação dos
desenvolvidos está nos ajudando, via commodities e juros zerados pelo mundo
afora. Mas, se lá subirem inflação e juros, teremos outra conta a pagar — num
mau momento.
Capaz de piorar. Ficar no rouba e nem faz.
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