- Folha de S. Paulo
Com o que obteve, CPI já tem elementos para
identificar responsabilidades
Em geral, CPIs começam com indícios,
pistas, suspeitas. A CPI da Covid começou
um passo à frente, favorecida por um roteiro traçado pelas declarações de
Bolsonaro desde o começo da pandemia, amplamente documentadas. Basta mencionar
sua campanha permanente a favor da cloroquina e contra o confinamento, o uso de
máscaras e as vacinas.
É de se notar o despreparo de muitos senadores para inquirir os depoentes. Alguns até abrem mão de perguntar porque estão mais preocupados em fazer discurso para suas redes sociais. A condução das sessões também não tem sido capaz de impedir longas e nocivas perorações negacionistas. Apesar disso, o saldo de um mês de trabalho é bastante positivo.
Os depoimentos de Dimas Covas,
do Butantan, e do executivo Carlos
Murillo, da Pfizer, quando cotejados com as afirmações de Bolsonaro
e Pazuello e decisões e omissões do Ministério da Saúde, permitem traçar uma
linha do tempo dos obstáculos criados pelo governo federal para a aquisição de
vacinas.
Personagens subterrâneos, como Mayra Pinheiro e Fabio Wajngarten, além do já
citado Pazuello, contaram tantas mentiras que deixaram flancos abertos para que
a CPI explore contradições importantes. Ficou evidente que os três se
esforçaram para evitar a caracterização da cadeia de comando do genocídio.
Tal estratégia não surpreende. Durante a
ditadura, o funcionamento clandestino da máquina de tortura e assassinato de
opositores também dificultou o estabelecimento do vínculo hierárquico entre os
"porões" e os generais no Palácio do Planalto, elo já esclarecido por
historiadores.
Com o que obteve até agora, a CPI já tem elementos para identificar responsabilidades. Como ainda restam 60 dias de prazo, se mantiver o foco, poderá conectar pontas soltas, como o tal "gabinete paralelo". Entre o começo da CPI e o momento em que escrevo, 62 mil brasileiros morreram de Covid-19. O genocídio segue em curso. O tempo urge, senhores senadores.
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