sexta-feira, 2 de julho de 2021

Carlos Melo* - Debate tem difícil tarefa de aglutinar candidatos dispersos

O Estado de S. Paulo

Falta ao centro um melhor diagnóstico da crise, condição para que possa avançar em propostas para sair dela.

Em geometria, centro é o ponto equidistante da circunferência. Em política, lugar impreciso. No Brasil, ainda mais incerto. Define-se por assinalar o que não é, antes de dizer aquilo que pretende ser. Há pouca clareza ideológica ou definição programática. Falta-lhe um melhor diagnóstico da crise, condição para que possa avançar em propostas para sair dela.

Nesse clima, três candidatos a candidato à Presidência da República estiveram presentes à primeira edição de Primárias. Não se trata de partido, legenda formal, com dinâmica e disputas internas. Antes, é tentativa de aglutinação de candidatos dispersos. Difícil tarefa. Daí, talvez, o tom morno e cuidadoso do encontro.

Nas ideias descortinadas, à exceção do impreciso “programa nacional de desenvolvimento”, de Ciro Gomes, pouco se destoou das questões clássicas do discutível liberalismo à brasileira das últimas décadas: equilíbrio fiscal e reformas estruturais, propostas genéricas para o desenvolvimento. Com a inclusão, agora, do SUS – resultado óbvio da pandemia.

Equilíbrio e responsabilidade fiscal não são fins em si. Por isso, sentiu-se falta de um diagnóstico amplo e estrutural, global: as grandes transformações tecnológicas e econômicas, das últimas décadas, seus desdobramentos e desafios. E, assim, discutir o papel e o desenho do Estado, necessários para a superação da crise. Qual, afinal, a natureza da crise? O que gerou Jair Bolsonaro?

Somente com o claro entendimento desses problemas se pode olhar para o futuro. E, com isso, discutir o rol de reformas e medidas necessárias no campo fiscal, na Educação, na Saúde e na inevitável Assistência Social. Mas, a ansiedade parece ter atropelado a lógica. Tudo ainda incipiente, afinal é uma “primária”.

Verdade que tampouco se encontra esse tipo de refinamento nos candidatos das largas margens que oprimem e deprimem o centro. Lula parece crer que os bons tempos – influenciados pelo grande choque de commodities – possam voltar por mágica. Já de Jair Bolsonaro é ocioso esperar esse tipo de lucidez.

*Cientista Político e professor do Insper

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