O Estado de S. Paulo
Por que o ‘PIB nacional’ desistiu de pedir serenidade, diálogo, paz e estabilidade? Por covardia?
Não foi preciso nem um cabo e um soldado
para cancelar um manifesto cheio de obviedades, articulado pela poderosa
Febraban, encampado pela igualmente poderosa Fiesp e com mais de 200
assinaturas. Realmente, o Brasil não é para amadores. E está se tornando
ridículo diante dos brasileiros e do mundo com um presidente da República que
ameaça a democracia por palavras e atos e com um “PIB nacional” covarde.
O que há de tão grave e assustador em cinco
parágrafos defendendo a “aproximação e a coordenação” entre Executivo,
Legislativo e Judiciário? Pedindo “serenidade, diálogo, pacificação política,
estabilidade institucional”? Só num país conflagrado, nervoso, apavorado com a
ideia de golpes e guerras, isso pode mobilizar tantos e desaguar no adiamento
do manifesto.
Isso, aliás, é parte do ridículo. A publicação oficial, que seria paga pela Fiesp, foi adiada “para depois do 7 de Setembro”. Mas a publicação extraoficial, de graça, foi feita ontem mesmo, com um dia de antecedência, por toda a mídia. Logo, o texto foi suspenso, mas não foi, todo mundo leu.
E mais: se Fiesp e Febraban miaram, o
agronegócio rugiu. O texto anódino foi “adiado”, mas o setor rural lançou um
outro, por conta própria, defendendo a Constituição, três décadas de democracia,
liberdade, pluralismo e – atenção! – “alternância de poder”. Aplausos!
Já no caso de bancos e empresas, bastou um
telefonema do presidente da Câmara, Arthur Lira, para Paulo Skaf abortar
“monocraticamente” – no jargão do Supremo – a publicação oficial e deixar
Fiesp, Febraban e 200 signatários passando vergonha. Já imaginou se fosse com
cabo, soldado, general e tanque fumacento?
Presidente da Fiesp só até dezembro, Skaf
foi derrotado duas ou três vezes para o governo de São Paulo e é aliado de
qualquer governo, do PSDB, PT, MDB ou de Jair Bolsonaro, sem partido. Em e-mail
na quinta-feira aos envolvidos no manifesto, ele pediu a confirmação de adesão
até o dia seguinte e avisou que a Fiesp assumiria os custos da publicação.
Bastou um telefonema para jogar tudo para o alto.
O grande debate nacional, agora, não é mais
democracia, instituições, Federação, eleições, impeachment de ministro do
Supremo, pandemia, morte, fome, inflação, juros, desemprego e iminência de
crise hídrica e elétrica. Que nada! O País discute é se Skaf se saiu bem ou mal
desse episódio envolvendo o “PIB nacional”. Ah! E se Arthur Lira tem esse poder
todo.
Skaf, porém, é só um detalhe, num ambiente
político, econômico e social contaminado e absurdo, que levou o ministro do STF
Luís Roberto Barroso, presidente do TSE, a ironizar: “Tem risco de golpe? Eu
gostava de dizer que não, gosto de dizer que não e acho que não. Mas o número
de vezes que me perguntam isso começa a me preocupar”.
Como ele, todos nós, todos os dias, toda
hora, ouvimos isso de todo mundo: vai ter golpe? É a banalização das ameaças à
democracia, às instituições e às eleições que partem do presidente da
República, viciado em armas, com delírios de guerra e de inimigos, incutindo na
cabeça dos brasileiros que há risco iminente de comunismo no País. Seria
cômico, não fosse trágico.
Queiram ou não os banqueiros e empresários,
continua necessária a defesa de “um foco em ações e medidas urgentes para que o
Brasil supere a pandemia, volte a crescer, a gerar empregos e reduzir as carências
sociais que atingem amplos segmentos da população”.
Se a CEF, o Banco do Brasil e o ministro
Paulo Guedes veem nisso um ataque comunista, esquerdista ou sei lá o quê contra
Bolsonaro, o problema é deles. O que realmente choca é o tal “PIB nacional” não
ter coragem nem de defender algo tão óbvio e tão normal quanto deveriam ser a
democracia e as eleições no Brasil. Uma vergonha!
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