O Globo
O economista Persio Arida acha que o Brasil
precisa agora de uma agenda de reparação e recuperação do Estado. “Nosso Estado
foi destruído e mal tratado, olha o que aconteceu com o Ibama, o que está
acontecendo com a Ciência e Tecnologia.” Alerta para o risco de se deixar a
inflação aumentar e chama a atenção para o avanço da pobreza. “Paulo Guedes
devia andar na rua e não precisa ser em bairros pobres”. Sua grande preocupação
no momento é com a defesa da democracia.
Persio Arida integrou o grupo do Plano
Real. É liberal, mas nunca se viu representado pela agenda de Paulo Guedes e
Jair Bolsonaro. Assinou um manifesto de economistas e empresários contra o
governo, mas suas críticas a Bolsonaro e Paulo Guedes começaram antes das
eleições. Eu o entrevistei na Globonews sobre os riscos econômicos e
institucionais:
— Muitos, para evitar um suposto mal maior,
ou seja, a volta do PT, votaram em Bolsonaro. Agora há um movimento de rejeição
às ameaças de golpe, de ruptura da ordem democrática, rejeição a este processo
de intimidação e erosão das instituições democráticas.
O economista acha que entre os que votaram
em Bolsonaro, na elite empresarial e financeira brasileira, há arrependimento e
decepção. Sobre a frustrada agenda liberal, ele também sempre alertou que era
um engodo:
— Havia quem acreditasse que Bolsonaro encontrou Paulo Guedes na estrada de Damasco e se converteu. Foi um engano extraordinário. Bolsonaro votou contra o Plano Real, defendeu a tortura, disse que Fernando Henrique tinha que ser fuzilado porque privatizou a Vale, por que de repente acreditaram que ele defenderia o liberalismo? Paulo Guedes tem uma parte nisso. Ele criou uma narrativa e acreditou nela, a de que todos os problemas anteriores derivavam de ele não estar no governo. Foram dois erros: as pessoas não se perguntaram quem era Bolsonaro, nem quem era Paulo Guedes. Quiseram acreditar numa miragem. Uma miragem perigosa.
Ele critica também a surpresa demonstrada
com o volume dos precatórios:
— A ideia de que o Orçamento brasileiro foi
atingido por um meteoro. Que meteoro? Houve uma falha na condução do processo.
Outra falha é no teto de gastos. Ele deveria levar a uma redução das despesas
obrigatórias. E não houve esse esforço, apenas o congelamento de salário do
funcionalismo que vai gerar uma pressão enorme de recomposição. Outro exemplo
de má condução é a crise hídrica. Está tendo aquecimento global. O erro foi
interpretar os vários períodos de seca como temporários. Os problemas não
vieram do nada. É falta de planejamento.
Persio acha que o governo também erra
drasticamente na questão ambiental:
— Estamos traindo o futuro de duas formas.
Uma é que temos que fazer parte do esforço do mundo para conter o aquecimento
global. Outra é do ponto de vista econômico. O que a gente poderia atrair de
capitais hoje e não está atraindo é uma barbaridade. Estamos pagando um preço
alto pela agenda errada na área ambiental.
Persio diz que esse capital estrangeiro que
o governo afugenta com seu erro ambiental faz falta ao desenvolvimento do país:
— Estamos com crescimento baixo, com
aumento da pobreza e 14 milhões de desempregados. Paulo Guedes deveria andar na
rua. Andar e olhar. Não estou falando de bairros pobres, mas de bairros
abastados. Você vê a pobreza aumentar. Tem um potencial de crescimento que o
Brasil está perdendo por causa de uma agenda retrógrada, na contramão do mundo.
O economista que ajudou o Brasil a vencer a
hiperinflação alerta que “a inflação tem que ser combatida logo”, até porque há
risco de estagflação no ano que vem. Um dos efeitos será o aumento em 2022 das
despesas públicas indexadas. Para Persio, a melhora dos indicadores fiscais é
ilusória:
— É o velho imposto inflacionário atuando
em favor das contas públicas. Um truque que funciona quando a inflação está
crescendo. Isso tem um custo.
O que mais o preocupa neste momento,
contudo, é o risco que a democracia brasileira corre no governo Bolsonaro:
— Nós estamos em um processo com uma
tentativa de morte da democracia por erosão por dentro. É contra isso que a
sociedade brasileira está reagindo, ela já viu isso acontecer.
Persio faz um paralelo entre a democracia e
uma planta que temos que regar e proteger do vento forte. “É nosso bem maior.”
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