quarta-feira, 13 de agosto de 2025

O casamento chinês - Fábio Alves

O Estado de S. Paulo

A China já se aproxima da fronteira tecnológica da produtividade. Resta estimular o amor

Em meio a uma corrida demográfica contra a Índia, as autoridades da China devem ter achado que está faltando amor aos casais chineses ao decidir dar um empurrãozinho para elevar a taxa de natalidade: oferecer dinheiro para os gastos com cada filho que nascer. Isso porque não bastou revogar, em 2016, a lei que limitava as famílias chinesas a um único filho – em vigor a partir do fim da década de 1970 – para evitar a queda e o envelhecimento da população.

O subsídio – equivalente a US$ 500 ao ano por criança até três anos de idade – foi anunciado no fim de julho, na esteira da notícia de que, em 2024, o número de casamentos na China atingiu o menor patamar desde que essa estatística começou seu registro. No ano passado, a queda nos casamentos foi de 20%. Ao contrário do que acontece no Brasil, é extremamente raro para chineses ter filhos fora do casamento.

Muitos analistas chegam a falar em “crise demográfica” para descrever o que está acontecendo na China. Em 2024, a população do país registrou queda pelo terceiro ano consecutivo: menos 1,39 milhão de habitantes para um total de 1,408 bilhão. O êxodo rural, em curso nas últimas décadas, contribuiu para a queda da taxa de natalidade, dado o custo mais elevado para se viver nas cidades chinesas.

A Índia ultrapassou a China como o país mais populoso do mundo em 2023, quando a ONU estimou em 1,429 bilhão o número de habitantes naquele país do sudeste asiático. Isso agravou a tensão geopolítica entre os dois países, uma vez que os chineses temem que o crescimento populacional da Índia possa, no futuro, levar o PIB indiano a também ultrapassar o tamanho da economia chinesa, hoje a segunda maior do mundo.

Com uma população bem mais jovem do que a média de idade chinesa, a economia da Índia ainda deve se beneficiar do chamado bônus demográfico. A China, por outro lado, enfrenta um ônus demográfico (22% da população está acima de 60 anos), com impacto negativo, inclusive, para o seu sistema previdenciário.

“O Brasil também enfrenta um ônus demográfico, embora menos grave que o da China”, diz Bráulio Borges, economista da LCA 4intelligence. Para compensar o efeito negativo sobre a oferta de mão de obra e a taxa de poupança para financiar o crescimento, Borges recomenda ao Brasil elevar a produtividade da economia, aprovando reformas estruturais, além de incentivar a maior participação da mulher na força de trabalho. Como em economias desenvolvidas, a China já se aproxima da fronteira tecnológica da produtividade. Resta, agora, estimular o amor.

 

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