domingo, 7 de setembro de 2025

Diante da encruzilhada. Por Bernardo Mello Franco

O Globo

País chega ao 7 de Setembro diante de encruzilhada histórica; democracia precisa responsabilizar quem tentou destruí-la

Num 7 de Setembro como hoje, o presidente da República chamou as eleições de “farsa”, anunciou que não cumpriria mais ordens da Justiça e disse que só sairia do poder “preso ou morto”. Aconteceu em 2021, quando Jair Bolsonaro usou a data cívica para atacar a democracia e o Supremo Tribunal Federal.

Quatro anos depois, o país se vê diante de uma encruzilhada histórica. Ou aplica a lei e pune os extremistas, em julgamento que será retomado na terça-feira, ou aceita ficar preso a um passado de golpes, autoritarismo e tutela militar.

Em 2021, Bolsonaro amargava uma queda na popularidade, agravada pela gestão caótica da pandemia e pelo aumento da inflação e do desemprego. Em vez de enfrentar os problemas, o chefe do governo escolheu afrontar a Constituição.

No primeiro discurso do dia, em Brasília, anunciou um “ultimato para todos que estão na Praça dos Três Poderes”. Seu alvo era o ministro Alexandre de Moraes, que havia decretado a prisão de radicais de direita por ameaças ao Judiciário.

“Esse ministro do Supremo perdeu as condições mínimas de continuar dentro daquele tribunal”, vociferou o então presidente. “Ou o chefe desse Poder enquadra o seu ou esse Poder pode sofrer aquilo que nós não queremos”, acrescentou.

Ele ainda anunciou que convocaria o Conselho da República, colegiado que pode recomendar a decretação de estado de sítio, suspendendo liberdades e garantias individuais.

À tarde, em São Paulo, Bolsonaro chamou Moraes de “canalha” e exigiu o arquivamento de investigações sobre aliados. “Dizer a esse ministro que ele tem tempo ainda para se redimir. Tem tempo ainda de arquivar seus inquéritos. Ou melhor, acabou o tempo dele”, sentenciou.

O capitão também atacou o ministro Luís Roberto Barroso, que comandava o Tribunal Superior Eleitoral. Após incitar os seguidores contra as urnas eletrônicas, deu a entender que boicotaria as eleições do ano seguinte. “Não posso participar de uma farsa como essa patrocinada pelo presidente do TSE”, justificou.

No comício da Avenida Paulista, Bolsonaro deixou claro que não pretendia sair da cadeira presidencial em caso de derrota nas urnas. “Só Deus me tira de lá”, avisou, a um ano e quatro meses do fim do mandato. “Nós temos três alternativas, em especial para mim: preso, morto ou com vitória. Dizer aos canalhas que nunca serei preso”, arrematou.

Na denúncia que mandou o ex-presidente para o banco dos réus, a Procuradoria-Geral da República mostra que as declarações de setembro de 2021 eram apenas a parte mais visível de uma trama golpista em curso. “As investigações da Polícia Federal revelaram que o pronunciamento não era mero arroubo impensado e inconsequente”, afirma.

Naquela época, Bolsonaro já tinha um plano de fuga do país a ser usado “se porventura lhe faltasse o apoio armado com que contava”. A escalada autoritária ainda se agravaria até a tentativa de golpe e a invasão das sedes dos três Poderes em 8 de janeiro de 2023. Agora a democracia tem a chance de responsabilizar quem tentou destruí-la.

 

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