Folha de S. Paulo
Chefes das Forças Armadas foram à polícia e
contaram que ex-presidente lhes propôs um golpe
Na semana passada, a defesa
de Bolsonaro argumentou que a acusação contra seu cliente se baseava
apenas na delação
de Mauro Cid (o que é falso) e na reunião em que Jair propôs um golpe
para os chefes das Forças Armadas (que a defesa diz que não foi bem assim).
O advogado e meu xará Celso Vilardi,
claramente um sujeito talentoso, também afirmou que o que aconteceu além disso,
da tentativa de assassinar Lula até o 8 de Janeiro, não teve nada a ver com
Bolsonaro.
Desculpe aí, xará, mas não é isso não.
A delação de Mauro Cid é muito ruim para Braga Netto, mas não tem nenhuma relevância para a acusação contra Jair. Os chefes das Forças Armadas foram na polícia e contaram que Jair lhes propôs um golpe.
Mesmo se não tivessem contado, a história da
reunião pode ser reconstruída pelas mensagens nos celulares de Cid e Braga
Netto. A minuta de declaração de golpe apresentada por Jair
Bolsonaro aos comandantes foi encontrada na casa do ex-ministro da
Justiça de Bolsonaro.
Ele era secretário da Segurança do Distrito
Federal durante o 8 de Janeiro, quando a polícia deixou os golpistas saquearem
a praça dos Três Poderes impunemente.
Nas mensagens e documentos apreendidos há uma
montanha de provas que confirmam e detalham esse encadeamento dos fatos, sem
que seja necessário apelar à delação de Cid sequer para confirmá-los.
Como não dava para negar a reunião com os
comandantes, a defesa argumenta que a coisa pode ter sido inapropriada, mas não
deu em nada e não gerou a violência necessária para caracterizar a tentativa de
golpe.
Como mostrou o procurador-geral Paulo Gonet,
Jair usou ostensivamente a violência do Estado (então sob seu controle) quando
tentou impedir eleitores de Lula de votar com seus bloqueios rodoviários ou
quando operou a Abin paralela.
Mas a maior ameaça de violência foi propor o
golpe aos comandantes. Quando lhes apresentou a minuta, Jair lhes propôs melar
a eleição, roubar o voto dos brasileiros pobres e matar quem se opusesse a
isso.
Se o comandante do Exército tivesse
concordado, a questão não seria mais "quem vai arriscar aderir ao golpe?",
mas sim "quem vai arriscar resistir ao golpe?".
Talvez o golpe ainda assim falhasse, mas é
indiscutível que, ao propor aos comandantes uma onda de violência contra seus
opositores, Jair apertou o botão que acionava a violência golpista. O botão não
funcionou por razões alheias à sua vontade.
Finalmente, a ligação entre Jair e o resto da
ofensiva golpista –o Punhal
Verde Amarelo, o atentado ao aeroporto de Brasília, o 8 de Janeiro– é
evidente.
Tudo isso foi feito por um exército de
militantes bolsonaristas que queriam um golpe para instaurar Bolsonaro no
poder, porque o próprio Bolsonaro lhes dizia que a eleição havia sido roubada.
A eles Jair disse,
em 9 de dezembro de 2022, com a ofensiva golpista em pleno curso:
"Nada está perdido (...) Quem decide para onde vão as Forças Armadas são
vocês. "Não é 'eu autorizo', é o que eu posso fazer pela minha
pátria."
O "eu autorizo" era o apelo dos
manifestantes para que Jair desse um golpe. O "quem decide para onde vão
as Forças Armadas são vocês" foi o apelo do ex-presidente para que os
manifestantes dessem o golpe por ele. Daí em diante, a massa seguiu seu líder.
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