O Globo
Não há indícios de que possa haver
movimentação militar hoje, 7 de setembro, ou depois do resultado do julgamento,
pois a tropa está aceitando como normal a condenação dos envolvidos na
tentativa de golpe
Ao reunir os Comandantes militares atuais e
alguns mais antigos em uma reunião de confraternização, o presidente Lula quis
dar uma demonstração de que os militares estão ao seu lado neste momento em que
caminha para o desfecho o mais importante julgamento da história do país, o
primeiro que vai condenar um ex-presidente da República e outros militares de
primeiro escalão por tentativa de golpe de Estado.
Temos uma história de golpes e contragolpes que parecia estar encerrada com a redemocratização, mas tivemos o infortúnio de nos depararmos com uma figura anacrônica como Bolsonaro, que despertou os mais abjetos instintos golpistas em um grupo militar que trouxe de volta ao cenário político a ambição de poder através das armas, e não do voto popular.
Mesmo os processos de impeachment que tiraram
do poder presidentes como Collor de Mello e Dilma Rousseff foram liderados pelo
Congresso e pelo Supremo Tribunal Federal dentro das estreitas quatro linhas da
Constituição, não tão largas quanto o campo em que se movia Bolsonaro. O
ex-presidente permaneceu no poder até o último instante, mesmo tendo tentado
desmontar o aparato institucional brasileiro desde o início de seu governo,
escrevendo diante de um país atônito o roteiro do golpe que terminaria em 8 de
janeiro de 2023, com a frustrada insurreição na Praça dos Três Poderes.
Desde o golpe civil-militar de 1964 - o qual
Bolsonaro admirava publicamente - não houvera um movimento armado para tomar o
poder da República, e o de 2023 só não foi exitoso porque os militares não o
apoiaram, como está demonstrado na acusação do Procurador-Geral da República
Paulo Gonet. Os comandantes que se reuniram com o presidente Lula estão
convencidos de que não houve adesão dos militares da alta cúpula porque o
espírito democrático está incrustado no grupo, mesmo que sejam em sua grande
maioria conservadores e o que chamam de “família militar” tenha votado em peso
em Bolsonaro, como aliás foi explicitado ao próprio Lula em momento apropriado,
quando a nova cúpula foi escolhida.
Ser conservador não quer dizer, no entanto,
golpista, e o julgamento dos militares que se desviaram na conduta é vista como
uma atitude de militares que já haviam deixado a carreira militar para
bandear-se para a política, cooptados pelo então presidente Bolsonaro. Os
“pensamentos digitalizados” ou as “anotações pessoais” não sensibilizaram os
militares, e voltam às conversas hoje as agressões que o filósofo oficial já
falecido Olavo de Carvalho fez aos militares, chamando-os de covardes por não
aderirem às manobras bolsonaristas ainda no início do governo.
Não há indícios de que possa haver
movimentação militar hoje, 7 de setembro, ou depois do resultado do julgamento,
pois a tropa está aceitando como normal a condenação dos envolvidos na
tentativa de golpe. Mesmo havendo quem torça para que o General Augusto Heleno,
ou o então comandante do Exército Paulo Sérgio sejam livrados de penas mais
pesadas, por considerarem que não se envolveram profundamente no golpe, nada
indica que suas eventuais condenações sejam contestadas a nível militar.
Algum movimento na reserva pode ser
registrado, mas o meio militar sabe que a influência do Clube Militar nunca foi
tão pequena quanto agora, no mínimo porque de anos para cá, a maioria dos
militares que foram para a reserva não ficou no Rio de Janeiro, espalhando-se
pelo país, principalmente em Brasília e São Paulo. A noção de que a carreira
militar termina no Comando das Forças pelos militares de quatro estrelas, sendo
o ministério da Defesa um cargo político, está bastante disseminada entre eles,
e por isso, quando Paulo Sérgio aceitou ir para a Defesa, foi alertado por
muitos de que estava abrindo mão da carreira para se intrometer na política. A
separação formal, aliás, entre a carreira militar e a política pode ser um
próximo passo para a impedir que fatos como os que hoje estão sendo julgados
não se repitam.
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