Folha de S. Paulo
A grande música é grande música em qualquer
época, e a melhor é aquela que fica para sempre
No domingo (31/8), a respeito de uma lista que me pediram das 20 maiores canções brasileiras, escrevi que a grandeza de uma música popular não se faz de hit parades. É obra de gerações de compositores, letristas e intérpretes que, mesmo produzindo grande material, amam o que se fez antes deles. Foi assim no Brasil, durante boa parte do século 20, com músicos e cantores cujos discos alternavam as últimas novidades com os clássicos do passado, fixando o nosso sólido patrimônio musical.
Sólido? A partir de certo momento, talvez
meados dos anos 1980, esse patrimônio foi abandonado, em troca de material
feito para durar pouco mais que o tempo de rotação de um CD. E assim continua.
Um dos motivos é que ninguém mais quer ser apenas intérprete. Todos se julgam
autores —mesmo que seu trabalho "autoral" não se compare a tanta
coisa já produzida e de uma riqueza que eles deveriam encarar como um desafio.
Por sorte há exceções e, não por acaso,
vindas da música instrumental. O saxofonista Mauro Senise contribui há anos
para a canonização de um cancioneiro nacional com seus álbuns dedicados a
grandes nomes —songbooks de Chiquinha
Gonzaga, Johnny Alf, Edu Lobo, Gilberto Gil,
Paulinho da Viola, Dolores Duran, Sueli Costa, Tom e
Vinicius e o recém-lançado "Lembrando Garoto", com o
repertório do violonista Garoto (1915-55), pai espiritual da bossa nova.
E o pianista Antonio Adolfo, a quem devemos a
façanha de, em 1977, ter quebrado a ditadura das multinacionais com seus discos
independentes, não para de abrir arcas do tesouro perdidas. Depois de songbooks
de Chiquinha Gonzaga, Ernesto Nazareth, Tom Jobim, Carlos Lyra e Roberto
Menescal, e discos temáticos sobre o choro, o baião e o samba-jazz,
nos brinda agora com o álbum "Carnaval", de clássicos da folia com
uma inflexão jazzística. Nunca se ouviu "As Pastorinhas", "Oba!
(O Bafo da Onça)", "Agora É Cinza" e "A Lua É dos
Namorados" como aqui.
Grande música é grande música em qualquer
época. A melhor é para sempre.
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