O Estado de S. Paulo
O presidente Trump está botando os Estados Unidos e o mundo de ponta cabeça. Está fazendo pouco caso da ONU. Pulverizou a política neoliberal e, em seu lugar, instaurou o protecionismo tosco. Destruiu o regime de livre comércio e, em seu lugar, implantou o tarifaço. A partir daí, vai escanteando a Organização Mundial do Comércio (OMC), a instituição xerife do comércio global. Não tem o menor escrúpulo em intervir nos países cujos governos não se ajustam a seus interesses. Avisou que pretende incorporar o Canadá e a Groenlândia. Despeja, sem dó nem piedade, imigrantes que não contam com a documentação em dia. Pressiona o quanto pode o Federal Reserve (Fed, banco central) para enquadrar sua política de juros a seus próprios desígnios. Força o uso de leis para cumprimento dos seus interesses, como é o caso da lei Magnitsky. E vai manobrando para controlar o poder Judiciário local.
Seu objetivo declarado é restabelecer a
antiga hegemonia dos Estados Unidos e refortalecer a indústria, que vinha sendo
desidratada. Para isso, manobra para obter uma desvalorização controlada do
dólar e, assim, ajudar a indústria a restabelecer a competitividade perdida.
Enfim, é uma política em flagrante
contradição com a história econômica e política dos últimos 100 anos, que leva
o risco
Trump: política sem oposição de produzir trombadas. O tarifaço parece não levar em conta que cerca de 80% do PIB dos Estados Unidos, ocupado pelo setor de serviços, tem pouca reação à imposição de taxas alfandegárias. Além disso, a desvalorização do dólar solapa sua condição de reserva de valor.
A questão mais importante não são os efeitos
dessa reviravolta na condução da política.
Está em que não há reação consistente a ela
pelas instituições democráticas de Estado, nem pela ação dos políticos, nem
pela opinião pública. Tudo se passa como se a sociedade dos Estados Unidos
esteja satisfeita com o novo rumo de Trump.
O norte-americano médio se sente vítima de um
longo processo perdedor e sabotador do consagrado sonho americano. E agora
entende que, finalmente, seu governo está atendendo a suas expectativas.
Na Alemanha dos anos 20 e 30, não foram
apenas as imposições humilhantes do Tratado de Versailles que criaram as
condições para a incubação do ovo da serpente. Foi, principalmente o sentimento
do alemão médio de que suas expectativas haviam sido arruinadas.
Por enquanto, não há substituto para o dólar
nem para o título de dívida de alta liquidez como o do Tesouro dos Estados
Unidos. No entanto a dívida dos Estados Unidos vai atingindo níveis
preocupantes, tanto que sua qualidade já foi objeto de rebaixamento pelas
agências de avaliação de risco.
A insatisfação geral do cidadão dos Estados Unidos é o atual caldo de cultura que sabota o atual sistema de pesos e contrapesos, a garantia da solidez do sistema democrático, e propicia a propagação do jogo autoritário ao redor do mundo.
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