Folha de S. Paulo
Quando menos se espera, as instituições vão
lá e dão uma funcionada
O governo Lula conseguiu aprovar
a reforma do Imposto de Renda que isenta quem ganha até R$ 5.000,
reduz o imposto de quem ganha entre R$ 5.000 e R$ 7.350 e exige que os muito
ricos paguem ao menos 10% de Imposto de
Renda. A proposta foi aprovada por unanimidade, mostrando que o que pode
unir o Brasil são as boas ideias, não os acordões picaretas de sempre.
Se a reforma for aprovada pelo Senado, como se espera que seja, Fernando Haddad deve entrar para a história como um ministro da Fazenda importante.
Aprovou a reforma
tributária de 2023, que deve fazer o Brasil crescer mais e favorecer
nossa indústria. E aprovou a reforma do Imposto de Renda de 2025, que deve
garantir que os frutos do crescimento serão divididos de maneira mais decente.
Nada disso deve ter o menor impacto no
discurso político. Mesmo depois de zerar o Imposto de Renda de 10 milhões de
brasileiros, Haddad vai continuar sendo chamado
de "Taxad" pela direita. Mesmo depois de ter sido o primeiro
ministro da Fazenda a taxar os muito ricos, vai continuar tendo gente na
esquerda dizendo que ele é neoliberal.
É sempre bom lembrar: o imposto que Haddad
vai cobrar dos muito ricos é só o mínimo exigido pela decência. Os milionários
vão ser forçados a pagar, no mínimo, a mesma alíquota de Imposto de Renda paga
por professoras e policiais militares. Não, atualmente não pagam.
Se você vê essa vitória pequena, lembre-se:
nenhum governo até hoje tinha chegado perto de obtê-la. O Brasil já foi
governado várias vezes pelo PT, um dos maiores
partidos de esquerda do mundo, e nunca tinha conseguido nada disso.
E até a última hora tinha gente grande
querendo melar o imposto mínimo para milionários.
Os bolsonaristas do PL, por exemplo, tentaram
derrubar a taxação dos milionários enquanto, para disfarçar, defendiam que a
isenção de Imposto de Renda valesse para quem ganhasse até R$ 10 mil.
Essa proposta era ilegal: a Lei de
Responsabilidade Fiscal exige que se diga de onde vai sair o dinheiro para
compensar a perda de arrecadação. Sem taxar os ricos não dá para isentar nem os
que ganham menos que R$ 10 mil nem os que ganham menos que R$ 5.000 nem
ninguém.
A proposta do PL, portanto, faria com que
tudo continuasse como estava, sem isenção para ninguém e sem imposto para os
milionários.
Deu errado.
Lula, Haddad e os brasileiros foram ajudados
pelas manobras desastradas dos congressistas de direita nas últimas semanas.
Depois de duas semanas em que o Congresso foi dominado pelos picaretas da
anistia e da blindagem, a imagem do Congresso ficou muito desgastada.
A esquerda conseguiu fazer suas primeiras
grandes manifestações de rua em muitos anos, inclusive invocando a pauta
anticorrupção, que vinha sendo monopolizada pela direita.
O Congresso precisava fazer alguma coisa para
limpar sua barra, e a reforma do Imposto de Renda veio a calhar.
A reforma difere da PEC da
blindagem porque coloca dinheiro no bolso dos trabalhadores, não dos
políticos corruptos. E difere da anistia aos golpistas porque é um sinal de
democracia funcionando, do Estado ajustando seu financiamento segundo os
interesses da maioria.
Quando menos se espera, as instituições vão
lá e dão uma funcionada.
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