O Globo
O governador Tarcísio de Freitas tem se
jogado com tanto prazer nos braços de Bolsonaro que não deixa claro para os
eleitores se é irmão siamês ou simplesmente faz um jogo de aproximação
A disputa pela presidência da República no ano que vem será uma repetição da de 2022, em que esquerda e direita bateram-se centímetro a centímetro para ganhar espaço na vontade do eleitor? Creio que sim, mas de uma maneira que favorece mais Lula do que o candidato de direita, seja ele quem for, mesmo que fosse Bolsonaro. A diferença mínima a favor de Lula deveu-se a uma boa campanha propagandística em torno de um governo de coalizão nacional, que acabou não acontecendo, mas que facilitou aos eleitores de centro tomar uma decisão que sempre lhes foi difícil, votar no PT.
Muitos votaram pela primeira vez no partido, para derrotar Bolsonaro e sua clara tendência a um golpe antidemocrático. Mesmo os que viam no PT o perigo de um governo autoritário de esquerda encontraram na proposta de um governo de união, com Geraldo Alckmin na vice-presidência e Simone Tebet no ministério uma razão para aceitar o risco de ter o PT de volta ao poder. Muitos, provavelmente a maioria, está arrependida agora, não pela derrota de Bolsonaro, que era o objetivo prioritário, mas pelo governo de coalizão nacional que não deu as caras.
Com o Congresso pendendo largamente para a
direita, porém, não houve risco de golpe de estado, como ficou claro que
houvera no governo anterior. É preciso levar em conta, porém, que Bolsonaro
usou os poderes que tinha à mão como incumbente, e mais outros, ilegais, para
forjar uma disputa acirrada na reta final, e perdeu por muito pouco. O problema
é que também o PT sabe usar as vantagens presidenciais a seu favor e, como já
disse a ex-presidente Dilma Rousseff, “faz o diabo” para ganhar a eleição,
assim como Bolsonaro fez quando pôde, saindo até das quatro linhas da
Constituição.
Estão todos condenados ou a caminho de ser,
tanto que abusaram de seus poderes para se manter no governo. Se imaginarmos
que o bolsonarismo, com um Congresso a favor, provavelmente reforçado nas
eleições, terá espaço para tentar novamente um golpe de Estado, é preciso ter
muita confiança no candidato da direita que se apresentar para disputar com
Lula para não temer um desastre maior.
É verdade que a maioria do Congresso, formada
pelo Centrão e partidos de centro-direita e outros moderados, não é compatível
com uma ditadura, no mínimo porque não terá papel relevante num governo desse tipo.
Para piorar, o ambiente político internacional, com Trump nos Estados Unidos,
favorece governos autoritários, ao contrário do que acontecia no tempo de Joe
Biden, que foi fundamental para a mensagem de que a maior democracia ocidental
não aceitaria um golpe de Estado. Hoje, nem mesmo seria considerado um golpe,
pois foi o mesmo que Trump tentou fazer em seu país, alegando, como aqui, que a
eleição fora forjada.
No frigir dos ovos, como dizia minha mãe, ou
“at the end of the day”, como dizem os economistas hoje, temos nós, eleitores,
diante de nós a mesma decisão que tivemos em 2022, com algumas diferenças
contra o bolsonarismo. Não terá um representante liberal como foi Paulo Guedes
como superministro, nem Sérgio Moro, quando ainda se acreditava que o governo
combateria a corrupção. Terá, ao que tudo indica, um Bolsonaro na vice, com
Flávio Bolsonaro, abrindo vaga para Guedes disputar uma das vagas para o
Senado.
Entre os governadores de direita candidatos à
presidência, não há golpistas, mas há simpatizantes do bolsonarismo que tendem
a usar o poder para beneficiar os golpistas, inclusive o próprio Bolsonaro. O
governador de São Paulo Tarcísio de Freitas, o favorito entre eles simplesmente
por ser o bom gestor do maior estado brasileiro, tem se jogado com tanto prazer
nos braços de Bolsonaro que não deixa claro para os eleitores se é irmão siamês
ou simplesmente faz um jogo de aproximação para ser o escolhido. Temos um ano
para desvendar esse enigma, à direita e à esquerda, ou seremos devorados.
Nenhum comentário:
Postar um comentário