‘Participação ativa’ no crime
• MPF diz que Lula e os petistas formavam uma só organização para desviar recursos na Petrobras
Cleide Carvalho e Renato Onofre - O Globo
-SÃO PAULO- O Ministério Público Federal (MPF) informou ontem ter elementos suficientes para provar que o ex-presidente Lula “participou ativamente” do esquema criminoso na Petrobras, e também recebeu, direta e indiretamente, vantagens indevidas. Em documento no qual defendeu a competência da 13ª Vara Federal de Curitiba, sob o comando do juiz Sérgio Moro, para julgar os processos envolvendo o ex-presidente, os procuradores da Lava-Jato disseram que Lula “tinha ciência do estratagema criminoso e dele se beneficiou”, e afastaram a hipóteses de que “ele desconhecesse a existência dos ilícitos”.
“Considerando os dados colhidos no âmbito da Operação Lava-Jato, há elementos de prova de que Lula participou ativamente do esquema criminoso engendrado em desfavor da Petrobras, e também de que recebeu, direta e indiretamente, vantagens indevidas decorrentes dessa estrutura delituosa”, escreveram os procuradores, em ofício encaminhado ao juiz.
O parecer do MPF foi incluído em processo de “exceção de incompetência” movido pelos advogados de Lula na Justiça Federal, em Curitiba, contra Moro. A defesa do ex-presidente afirma que o juiz demonstrou em três momentos perda de imparcialidade para conduzir os processos contra o líder do PT. O primeiro deles ao autorizar as ações do dia 4 de março, como a condução coercitiva do ex-presidente e as buscas e apreensões em imóveis a ele relacionados. O segundo, quando levantou o sigilo das interceptações telefônicas. O terceiro, quando o juiz supostamente acusou Lula — 12 vezes, segundo a defesa — em petição encaminhada ao Supremo Tribunal Federal, em abril.
“Enriquecimento ilícito”
No documento encaminhado à Justiça, os procuradores afirmam que o esquema envolveu pessoas importantes e próximas a Lula, como o ex-ministro José Dirceu; os ex-tesoureiros do PT João Vaccari Neto e José di Filippi Júnior, e o publicitário João Santana. Dizem ainda que os envolvidos formavam uma só organização, com o mesmo modus operandi, integrada pelos mesmos agentes, ainda que os contextos sejam “parcialmente diferentes”. O fim, ressaltam, era o mesmo em todos os casos: “Enriquecimento ilícito dos seus integrantes e manutenção do poder político”.
O MPF frisa que, em 2005, o ex-presidente admitiu ter conhecimento sobre a prática de caixa dois no financiamento de campanhas políticas e, em recente depoimento prestado à Polícia Federal, reconheceu que, no caso da Petrobras, “recebia os nomes dos diretores a partir de acordos políticos firmados”.
“Ou seja, Lula sabia que empresas realizavam doações eleitorais ‘por fora’ e que havia um ávido loteamento de cargos públicos. Não é crível, assim, que Lula desconhecesse a motivação dos pagamentos de caixa 2 nas campanhas eleitorais, o porquê da voracidade em assumir elevados postos na administração pública federal”, escreveram os procuradores.
Os investigadores não trazem novas provas da participação do ex-presidente no esquema criminoso que atuou na Petrobras. Na petição, o MPF lembra que, embora não exista ainda denúncia ou ação penal contra o ex-presidente na 13ª Vara Federal de Curitiba, as evidências colhidas até agora indicam que ele foi beneficiado com o tríplex do Guarujá, que era mantido no nome da OAS. “Evidências colhidas até o momento indicam que o imóvel é utilizado por Lula e sua família”, diz o texto.
Na avaliação do MPF, a manutenção do tríplex em nome da construtora no Cartório de Registro de Imóveis é somente uma “dissimulação”.
Os procuradores argumentam ainda que, mesmo depois de ter deixado a Presidência da República, Lula foi beneficiado por repasses de empreiteiras, responsáveis por 47% dos pagamentos feitos à sua empresa de palestras, e que é inegável que ele manteve influência política sobre o governo federal. Os procuradores lembraram que foi Lula quem indicou Paulo Roberto Costa e Renato Duque para a diretoria da Petrobras.
“Diversos fatos vinculados ao esquema que fraudou licitações da Petrobras apontam que o ex-presidente da República tinha ciência do estratagema criminoso e dele se beneficiou”, diz o texto.
“Apenas ilações”, diz Instituto Lula
A peça jurídica traz ainda um histórico da Operação Lava-Jato, do esquema de corrupção e de como os indícios contra Lula surgiram na investigação. O argumento da Procuradoria é que, por se tratar de uma mesma organização criminosa que atuou, segundo os investigadores, desde 2004 na Petrobras, a competência do caso pertence à Justiça Federal do Paraná, que iniciou a apuração com a descoberta da ligação entre o doleiro Alberto Youssef e o ex-diretor da estatal Paulo Roberto Costa.
Em nota, a defesa do ex-presidente afirma que a posição do MPF foi elaborada “para servir de manchete para a imprensa” e não discute a exceção de competência do juiz no caso. Os advogados Cristiano Martins e Roberto Teixeira afirmam que as acusações ao expresidente têm por objetivo “encobrir a falta de argumentos do MPF” sobre o caso: “Desde março, membros do MPF fazem afirmações difamatórias contra o ex-presidente Lula”.
“A verdade é que o Ministério Público Federal submeteu Lula e seus familiares a uma indevida devassa e verificou que o ex-presidente não cometeu qualquer crime. Mas, ao invés de seus membros reconhecerem inocência de Lula, querem condená-lo por meio de manchetes dos jornais e revistas”, afirma a nota.
O Instituto Lula, em nota, afirmou que os procuradores da Lava-Jato “iludem” ao afirmar que têm provas:
“Uma afirmação dessa gravidade só poderia ser feita com base em provas concretas. Como não há fatos, apenas ilações, pois Lula sempre agiu dentro da lei, os procuradores da Lava-Jato mantiveram hoje sua campanha de difamação e perseguição ao maior líder político do país”. Segundo o instituto, a ação “configura uma caçada judicial, com apelo à propaganda ofensiva para sustentar um julgamento pela mídia”: “O que se deseja fazer com ele é um linchamento”. A nota diz ainda que Lula “reafirma sempre ter agido dentro da lei antes, durante e depois da presidência da República”.
Nenhum comentário:
Postar um comentário