A reforma sanitária de 1988 representou mudança radical de paradigma na organização do sistema público de saúde. O próprio nome carrega a ousadia da proposta arquitetada por nossos constituintes: Sistema ÚNICO de Saúde. A distância entre intenção e realidade, no entanto, é flagrante. O claro subfinanciamento do SUS, com um investimento em torno de US$ 350 anuais por habitante, resulta em enormes gargalos e desafios.
Neste sentido, a realidade trai o sentido original pretendido pelas palavras. Nem o sistema é único. Nem a saúde suplementar é propriamente suplementar. Na verdade temos três subsistemas de saúde convivendo paralelos e, às vezes, superpostos no país: o SUS, a Saúde Suplementar e o regime de desembolso direto dos cidadãos – o pagamento pelas pessoas na compra de remédios no balcão das farmácias ou da consulta do dentista, por exemplo.
O SUS obteve muitos avanços e vitórias. Melhorou a saúde pública nos últimos 29 anos. Mas vive hoje um momento de graves restrições, registrando inclusive recuos importantes. As limitações do SUS empurram uma importante fatia da população de maior renda para os planos e seguros privados de saúde. São mais de 50 milhões de brasileiros beneficiários de planos de saúde, ou seja, 25% da população brasileira.
A natureza da relação entre o cidadão e o SUS é constitucional. É um direito de cidadania. Já a relação dos planos privados com os beneficiários é de natureza contratual. Apesar de serem subsistemas diferentes há interesses comuns. Quanto menos pessoas têm cobertura privada maior é a sobrecarga no SUS. Os hospitais filantrópicos servem de base para a produção de serviços tanto para o SUS quanto para os planos. Há temas recorrentes comuns, tais como judicialização e incorporação tecnológica. Enfim, os dois segmentos dialogam e devem cooperar.
Encontra-se instalada na Câmara dos Deputados a Comissão Especial, da qual sou membro, destinada a proferir parecer ao Projeto de Lei 7419/2006 e outros 139 projetos apensados, que versam sobre mudanças na regulação dos planos e seguros privados de saúde. Mesmo dispondo de muito mais dinheiro per capita do que o SUS, os planos enfrentam seus próprios desafios e problemas.
Na discussão estarão na mesa o rol de cobertura, as regras de acesso e negativa, a rescisão unilateral por inadimplência, o processo de credenciamento de prestadores de serviço, os aumentos e as faixas de idade, a carência e as condições preexistentes, os tratamentos e medicamentos de alto custo, o ressarcimento de despesas ao SUS, os planos coletivos e a defesa do consumidor.
Ouviremos entidades representativas de todos os setores envolvidos: planos e seguros, hospitais, usuários, profissionais de saúde, instituições de defesa do consumidor, judiciário, ministério público, especialistas.
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Marcus Pestana é deputado federal (PSDB-MG).
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